No ano passado, emigraram cerca de 110 mil portugueses. O
número, retirado do relatório estatístico do Observatório da Emigração,
confirma as previsões mais pessimistas dos especialistas que têm analisado a
sangria demográfica do país. No ano anterior, em 2012, já tinham emigrado 95
mil. “O mais provável é que em 2014 este número volte a aumentar ligeiramente”,
admite o investigador José Carlos Marques, do Centro de Estudos Sociais da
Universidade de Coimbra.
Porque o
relatório mede as saídas dos portugueses com os dados sobre as entradas nos
países estrangeiros de destino, José Carlos Marques admite que a realidade seja
ainda mais dura: “Nem todos os portugueses que saem vão inscrever-se nos
consulados dos países de destino.” Na caracterização dos portugueses que
procuram trabalho lá fora, constata-se que 61% têm apenas a escolaridade
básica, o que contraria a tese da “fuga de cérebros”.
Na medição do impacto da crise sobre os fluxos migratórios, o
estudo constata que a emigração diminuiu no arranque da crise, mas voltou a
crescer a partir de 2011. Entre 2007 e 2012, saíram do país, em média, 82,5 mil
portugueses por ano, “mas em crescimento, oscilando entre 70 mil e 95 mil ao
longo do período”, conforme se lê no relatório coordenado pelo investigador do
ISCTE Rui Pena Pires, e encomendado pelo gabinete do secretário de Estado das
Comunidades. Em meados deste ano, José Cesário já alertava para o crescimento
do número de “situações graves de isolamento e pobreza” entre os que emigram de
Portugal.
Este relatório não faz esse tipo de avaliação. Mas mostra que a
crise acentuou o carácter europeu da emigração portuguesa. Entre 1960 e 2010,
“a percentagem de emigrantes portugueses a viver na Europa passou de 16% para
67%”, ou seja, “multiplicou-se por nove, passando de 165 mil para mais de
milhão e meio”.
Mais recentemente, entre 2008 e 2012, a Europa foi o destino
escolhido por 80% a 85% dos emigrantes portugueses. Para Angola e Moçambique
terão ido cerca de 10% a 12% e apenas 1% para o Brasil. “Apesar da crise, ainda
existem na Europa bolsas de emprego em alguns sectores específicos nos quais os
portugueses têm alguma facilidade em se inserir”, explica José Carlos Marques,
para apontar ainda o “factor proximidade” na escolha do destino. “É mais fácil
ir e experimentar procurar emprego na Europa do que ir à aventura para Angola
ou Brasil. E os custos envolvidos também são de natureza diferente.”
No mapa-mundo da emigração portuguesa, Reino Unido, Suíça e
Espanha perfazem o conjunto dos principais novos destinos. O conjunto da
população portuguesa emigrada nestes três países aumentou em cerca de 600%
(contra um aumento de 68% para a generalidade dos países europeus). Mas com
diferenças entre os países. O Reino Unido, que é hoje o principal destino da
emigração portuguesa, registou em 2013 um aumento de 50% no número de novas
chegadas, atraindo sobretudo os portugueses mais qualificados.
Já em Espanha a emigração portuguesa não diminuiu: entrou em
colapso. Após a crise financeira, a entrada de portugueses decresceu cerca de
80%. Em 2007, entraram 27.178 portugueses naquele país e, em 2013, apenas 5302.
O decréscimo da emigração para Espanha resultou sobretudo da crise na
construção. “O colapso de emigração portuguesa para Espanha foi, portanto, o
colapso da emigração portuguesa mais desqualificada e precária, eventualmente
com processos de reemigração.”
Já o Brasil, Canadá e Estados Unidos, assim como a Venezuela,
somam muitos emigrantes portugueses sim, mas envelhecidos e em declínio, pois
as novas chegadas àqueles destinos são insuficientes para compensar a
mortalidade e eventuais movimentos de retorno e reemigração. Os investigadores
distinguem ainda um terceiro conjunto de países com grandes populações
portuguesas emigradas envelhecidas mas em crescimento, devido à retoma dos
fluxos: é o caso da Alemanha, França e Luxemburgo.
No global, os portugueses a residir fora de fronteiras rondam os
2,3 milhões. “Contando com os descendentes directos destes emigrantes, a
população de origem portuguesa nos países de emigração ultrapassará os cinco
milhões”, contabiliza o relatório.Portugal é, no contexto europeu, o país com
maior emigração. Os portugueses emigrados representam mais de um quinto (21%)
da população residente. No reverso desta medalha, a imigração atira-nos para o
fundo da tabela: os imigrantes representam menos de 6% da população residente,
se excluirmos os retornados nascidos nas ex-colónias, e com tendência para
decrescer.