sábado, janeiro 03, 2015

O epitáfio de um Cavaco sem ouvintes

Nada mais consentâneo com o ano novo do que um discurso fúnebre. Cavaco quer uma democracia "clara e mais esclarecedora". "Transparente", como ele.
Cavaco recusa o populismo, faz pedagogia através da "força do exemplo", como o dele, que preferiu a reforma ao salário de presidente.
Diz que há que ser cuidadoso com as promessas feitas. Rejeita facilidades. Recorda a disciplina orçamental. Não quer regredir a 2011 - imagina-se que está feliz com 2014 - e, sem demagogia, incita "o combate à corrupção".
Recorda coisas ótimas como a "diminuição do desemprego", existente na cabeça dele e, mais importante, quer "consenso". Interpela os agentes políticos a construírem apenas soluções estáveis.
Eis um democrata.
O homem que governou em minoria e com duas maiorias absolutas; o homem que foi presidente com um governo minoritário relativamente ao qual fomentou a instabilidade política rasca, com episódios inesquecíveis como a inventona de belém; e o homem que foi presidente de um governo maioritário pós-eleitoral, que apadrinhou, mesmo contra a Constituição.
A grande novidade de mais um discurso neutro foi precisamente apelar a um compromisso custe o que custar.
Pergunta-se então: por que raio, estão, não convocou eleições antecipadas? Porque Cavaco não é autêntico, nunca foi.
Cavaco está no seu último discurso em plenitude de funções. E com a fraqueza da sua legitimidade esmaga a vontade popular e atreve-se a indicar coligações pré-eleitorais ou pós-eleitorais.
O povo é que decide quem governa, coisa difícil de explicar a um Cavaco que acha por bem explicar como deve ser o próximo governo.
Cavaco, felizmente, não se substitui ao povo. Menos ainda quando depois das eleições terá a sua legitimidade formal e substancial restringida.
E não venha Cavaco rejeitar a discussão acerca das eleições antecipadas. Foi ele que introduziu o tema, e estamos recordados disso.
E o que é o consenso? Havendo um Partido com maioria absoluta que consenso quer Cavaco?
Havendo um Governo de minoria, qual é exatamente o drama?
Cavaco, no seu discurso, espelha a falta da sua própria exemplaridade.
Eu recordo-me de um prefácio de Cavaco em que os constrangimentos não eram suficientes para nos travar.
Aqui, Cavaco apresenta-se derrotado, um homem a dar um conselho: resignem-se.
Eis o PR com menos popularidade da nossa história.
Não o seguiremos.
DAQUI

P:S: Subscrevo! O grande problema é ter sido escrito por alguém do p.s. partido esse que em termos democráticos e funcionais vale tanto como os partidos do governo e da outra  oposição, já agora!