sexta-feira, março 06, 2015

Da sensualidade das Finanças

Após análise longa e cuidada do seu pensamento económico, a imprensa internacional concluiu que o ministro das Finanças grego é sensual. O estilo de Varoufakis tem sido examinado em detalhe. Houve intenso debate sobre as fraldas da camisa, reflexão sobre determinado cachecol, e discutiu-se uma eventual parecença física com um herói interpretado no cinema por Bruce Willis. Na Alemanha reconheceram-lhe "indubitável carisma" e chamaram-lhe "ícone sexual". Creio, por isso, que a má vontade do Governo português em relação à Grécia não é apenas (ou não é de todo) motivada por razões económicas.
O nosso executivo também já teve um ministro das Finanças recém-eleito, que também visitou a Alemanha para negociar. Nessa altura, a imprensa internacional não disse uma única palavra sobre a sensualidade de Vítor Gaspar, a sua masculinidade clássica, o seu magnetismo animal. Portugal não rejeita que a Grécia tenha um tratamento diferente no que diz respeito ao pagamento da dívida; Portugal leva a mal que a Grécia tenha um tratamento diferente quanto à avaliação da sensualidade dos seus ministros das Finanças.
Nós gostamos muito de reconhecimento internacional. Anotamos com alegria a opinião de qualquer borra-botas nascido do lado de lá da fronteira que elogie um português. Às vezes, nem precisa de elogiar. Aceitamos uma mera referência ao nome, ainda que mal pronunciado. E por isso é difícil compreender este protagonismo do ministro das Finanças de um país tão pelintra como o nosso, quando a sensualidade de Vítor Gaspar passou despercebida na Europa. Vítor Gaspar, à sua maneira, também era sensual. Tinha a tez esverdeada, o que lhe conferia algum exotismo, duas bolsas proeminentes sob os olhos (é sabido que as mulheres adoram bolsas), e uma voz suave. Os dirigentes alemães pareciam acreditar que ele era sensual, uma vez que lhe davam as mesmas ordens que as dançarinas exóticas costumam receber: "Ti-ra!, ti-ra!, ti-ra!" E Vítor Gaspar tirou mesmo. Tirou empregos, tirou salários, tirou reformas. E recebeu uma recompensa, não sob a forma tradicional de nota dobrada ao meio entalada na liga, mas sob a forma de um cargo de director de departamento no FMI. Por que razão não foi então referido internacionalmente o sex-appeal de Vítor Gaspar?

Quem nos impediu de ler notícias acerca do facto de o corpo pouco tonificado de Vítor Gaspar ser cobiçado internacionalmente, notícias essas que apareceriam lado a lado com outros títulos do género, tais como "Praia portuguesa considerada uma das 250 melhores do mundo por revista da qual nunca ouvimos falar mas que em todo o caso é estrangeira"? O desemprego e a pobreza ainda toleramos, mas privarem-nos do gozo de ver gente estrangeira a louvar-nos é simplesmente desumano. Para onde vais, Europa?