sábado, abril 11, 2015

Fazer o pino à beira do abismo

Cala-te e vai mas é trabalhar
E a malta obedece, que isto de ganhar a vida é função que só não onera herdeiros, iluminados, eleitos, ladrões e vá, um ou outro sortudo que ganhe o euromilhões.
Mas para ganhar a vida é preciso, desde logo, não ter perdido… a vida! Aquela cena biológica que nos foi dada de mão beijada pelos nossos paizinhos. É preciso, portanto, ter uma vida para ganhar a vida, o que não deixa de ser paradoxal, mas parece que não é bem compreendido por alguns “poderosos, ricos e influentes” da nossa praça.
Ora, termos sido paridos não basta para ter uma vida. Ela exige também uma casinha onde se viva, alimentos para que o corpo possa ter a energia produtiva desejada por quem dá trabalho, o necessário para as deslocações até ao local onde se desempenham as funções, água, luz, gás, uma roupinha que nos aqueça e nos deixe apresentáveis, que isto de ir trabalhar em pelota não pode ser…
Se temos prole, tudo o que está acima é multiplicado pelo factor equivalente às vezes em que perdemos a cabeça e nos multiplicámos e acrescido da educação dos mimados rebentos.
Bom, a seguir podem vir ainda os luxos extravagantes: uns livros para ler, uma ou outra ida ao cinema, quiçá o desplante de uma viagenzinha para ganhar mundo, um computador e internet em casa para não sermos info-excluídos, cuidados de saúde, um ou outro seguro, assistir, por bizarria, a um concerto, peça de teatro ou jogo de futebol…
Viver, mesmo nos limites da sobrevivência, é caro. Mas somos teimosos, insistimos em ir vivendo. Fazemos o que podemos para ganhar a vida. Para sobreviver.
A questão é que, se pensamos e, sobretudo, se expressamos que sobreviver não chega e que, com o seu trabalho, todos deviam, pelo menos, ter garantidas as condições mínimas de vida aludidas e o acesso a alguns – pelo menos alguns, que isto de sonhar alto é mal visto – dos luxos extravagantes referidos, o mais provável é ouvirmos dos herdeiros, iluminados, eleitos, ladrões e vá, um ou outro sortudo que ganhe o euromilhões, o costumeiro “cala-te, não reclames, vai mas é trabalhar, pah.”
Talvez um dia se consiga ouvir a resposta: os que têm de ganhar a vida, os que não foram bafejados pela fortuna de serem herdeiros, iluminados, eleitos, ladrões e vá, um ou outro sortudo que ganhe o euromilhões, trabalham, pah.
Muitos, se não a maioria, trabalham que nem uns doidos.
E não é por isso que deixam de estar, mês após mês, a fazer o pino à beira do abismo. O que é muito pouco recomendável para quem precisa de ganhar a vida e não de a perder


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