domingo, maio 03, 2015

Celeuma da abstinência

Os homossexuais podem dar sangue, desde que declarem não ter relações com outros homens. É este o princípio que vigora em Portugal. Não está mal. Há países em que os homossexuais não podem ser homossexuais. Por cá podem, não podem é exercer a homossexualidade. Ou melhor, até podem, mas depois têm de ficar em quarentena.
São um grupo de risco, diz o instituto do sangue, que tem números. E como são um grupo de risco, é melhor perguntar-lhes se andam a namorar, pois em caso afirmativo é melhor metermos uma máscara.
Curioso, uma entidade que não tem oficialmente confiança num grupo de pessoas, fazer-lhes apenas uma pergunta. Sim, porque com certeza não se pede aos homossexuais provas de que não têm andado na brincadeira. É portanto apenas uma pergunta burocrática.
Mas a questão nem é tanto a avaliação do risco ou do grupo de risco. O problema aqui é outro. É um organismo que diz à sociedade “há ali um grupo de pessoas mais complicado, mas nao há problema porque a gente pergunta-lhes se andam no forró”. O que é que se ganha com isto?
Se o sangue é testado antes – como penso que li algures – então é sempre testado. Claro que eliminar grupos de risco é sempre uma boa prevenção, mas julgo que essa triagem jamais pode ser feita perguntando à pessoa se anda a fazer o amor. E quantas vezes? E com quem? Um ou mais? Menos de cinco? Num mês ou num ano? «Ui, ui, isso foi demais, meu amigo, se quiser dar sangue vai ter de passar uma temporada a sarapitolas. Próximo!»
Para além disso, esta pergunta sem sentido faz ainda menos sentido se for feita apenas a homossexuais. Grupos de risco são todos. Um cavalheiro com alergia ao látex acabadinho de chegar de uma expedição sexual pela Ásia também parecer ser levemente ameaçador, mas graças à sua macheza não será necessário abrir o livro no guichet.
Grotesco. Se o sangue é testado, é testado. Se mesmo com testes existem riscos que a ciência ainda não pode eliminar, então claro que se tem de fazer uma selecção ou mais testes, não se pode é ir perguntar às pessoas o que andam a fazer, porque então depois é preciso perguntar também há quanto tempo não aldrabam uma resposta.