sábado, junho 20, 2015

A Grécia e as lições da austeridade

Prossegue o braço de ferro entre o governo grego do Syriza e a troika de topo do capitalismo mundial. Bruxelas, o FMI e Berlim não querem reconhecer o direito a mudar de política a um governo democraticamente eleito depois de derrotar os anteriores interlocutores da troika, responsáveis por uma política económica que levou a Grécia à catástrofe.
Para Lagarde, Merkel e Juncker (ou o pobre Passos, fazendo-se passar por credor rico), os gregos podem votar o que quiser desde que os seus governantes os continuem a esmifrar para pagar uma dívida que não contraíram e que só se agravou desde o primeiro dos resgates. Bem pode o insuspeito Financial Times garantir que as propostas do FMI agravarão a recessão e aumentarão para 200% do PIB a dívida grega, que a ameaça agora é: se não aceita, sai do euro, e se sai do euro, sai da UE (Martin Schulz, entrevista ao Guardian, 17.6.2015) — tese curiosa, já que 9 dos 28 países da UE não estão no euro... A chantagem continua, ainda que não tenha conseguido, até agora, esboroar o apoio popular maioritário de que o governo Tsipras dispõe. Mas é esse o objetivo: desacreditar o governo grego, barrar a possibilidade de contágio a outros países, impedir que se rompa com o euroausteritarismo liberal!
Há anos que esta discussão das dívidas (que forçaram a transformar em) públicas se tem feito como se fosse natural, e desejável, que ficasse restrita aos técnicos, aos especialistas, coisas para funcionário europeu ou do FMI, de que só entendem uns poucos economistas. Ou seja, o que sempre acontece com as políticas europeias. Ao cidadão comum solta-se umas tiradas moralistas (“os gregos mentiram!”, “os gregos vivem acima das suas possibilidades: um país corrupto do 3.º Mundo não pode ter uma segurança social à alemã!”), com um toque pseudo-antropológico (“as relações sociais na Grécia estão fundadas sobre o favor, a cunha, a fraude fiscal”) cuja base não é outra que a generalização de preconceitos dignos da conversa de turista rico com toques coloniais. É muito curiosa esta mescla de discurso tecnocrático e de moralismo rançoso, que descreve os gregos como uma família gastadora e desorganizada, habituada a viver à custa da generosidade alheia. Na Grécia, como em Portugal (e em Espanha e na Irlanda), tentou-se “esconder a verdade do público representando uma situação na qual o resgate se apresentou como benéfico para a Grécia, enquanto se promoveu um relato que retratava a população como culpada das suas próprias malfeitorias.”


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