quarta-feira, novembro 23, 2005

A ECONOMIA NO PROJECTO PROUDHONIANO

Se o pensamento proudhoniano não negligencia os aspectos jurídicos e políticos necessários a uma compreensão do mundo, dispensa no entanto um lugar preponderante à análise económica. Proudhon, e é novo nos socialistas, pensa a ciência económica como instrumento central do seu trabalho teórico. É neste sentido, e somente neste sentido, que ele pode não ser percebido como revolucionário. (50) Proudhon, com efeito, coloca-se directamente como inimigo de toda a acção armada que não tivesse por base preliminar uma compreensão do que deveria ser a economia pós-revolucionária, a economia “natural” da sociedade real. (51)
Com efeito, segundo ele, toda a revolta, mesmo legítima, não pode ser considerada como uma finalidade em si. O teórico socialista não pode ser exclusivamente um teórico da tomada de armas (Blanqui), pois estas engendram inevitavelmente uma conservação do poder por uma ditadura inaceitável por natureza, mesmo sendo uma ditadura do proletariado. Da mesma maneira, não pode fazer repousar o seu sistema, o seu ideal, sobre uma ontologia, sobre um “ser natural” (como a quase totalidade do pensamento socialista do princípio do século XIX, Cabet à cabeça), que fragiliza a teoria, e que engendra sobretudo, um idealismo ligado a este humanismo, permitindo todas as negações do Homem em nome da Ciência e da compreensão restrita que impõe. Proudhon, instintivamente libertário, encontra assim na economia política novas armas para objectivar a sua luta contra a sociedade capitalista.
Este estudo socio-económico permite-lhe pôr em dia a impossibilidade da infraestrutura capitalista, e portanto, a necessidade duma superestrutura forte tanto sobre o plano legislativo, repressivo, como sobre o plano ideológico, religioso. (52)
Após ter atacado esta super estrutura com as suas próprias leis e a sua própria lógica, Proudhon prossegue (o que aparecia já de modo subtil na “Primeira Memória”) a sua denúncia da “injustiça” capitalista por uma crítica da economia política, em vez duma maneira “clássica”, teórica, visando pôr em evidência as “leis eternas” das relações económicas, e duma maneira mais “filosófica”, desembaraçando a lógica intrínseca do desenvolvimento desta economia em direcção à sua falência. (53)
O objectivo desse trabalho é o que encontramos por exemplo na “Filosofia da Miséria”. Daí os estragos que provocou.

NOTAS


50- É necessário notar a influência que jogou a descoberta da economia política na esperança que Proudhon investiu numa concepção não violenta da Revolução. Entretanto, esta posição só foi mantida por Proudhon durante um período restrito e o seu pensamento sobre o sujeito evolui sem cessar. Enfim, a sua prática, tanto jornalística como política, tende a mostrar um empenhamento constante que muitas vezes tende a ser esquecido.
51- P.Ansart -“Marx et l`Anarchisme:Essai sur les sociologies de Saint-Simon, Proudhon et Marx”, Paris, P.U.F., 1969.
52- Proudhon - “Système des contradictions économiques”, Paris, Ed. Rivière, 1923, t.I, p.389:
“Deus em religião, o Estado em política, a propriedade em economia, tal é a tripla forma sob a qual a humanidade, tornada estrangeira de si própria, não cessou de se atormentar das suas próprias mãos, e que deve hoje rejeitar.” (2ª parte, “L`aliénation du travailleur”)
P.Ansart, nomeadamente, estudou particularmente bem a definição proudhoniana destes três níveis de alienação (económico, jurídico e ideológico).
53- Proudhon- “Système des contradictions économiques”, Paris, Ed. Rivière, 1923:
“Os efeitos desta luta são conhecidos: as guerras de comércio e de exportação, as obstruções, as estagnações, as proibições os massacres da concurrência, o monopólio, a depreciação dos salários, as leis do maximum, a desigualdade esmagadora das fortunas, a miséria, derivam da antinomia do valor” t.I, p.100.
“Insensato! se os operários vos são dispendiosos, eles são os vossos compradores: que fareis dos vossos produtos, quando, despedidos por vós, eles não consumirão mais? (...) se a produção exclui o consumo, bem cedo ela própria é forçada a parar”, t.I, p.51.

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