domingo, novembro 20, 2005

PROUDHON: GREVES E CONFLITOS DE CLASSES

Mais uma vez, Proudhon espanta-nos e, para alguns, faz mesmo escândalo. O combatente de todas as lutas sociais, o solitário que queria “reconstituir o partido da revolução” e não hesitou em aceitar “o direito da força”, é também aquele que tinha as greves como forma de “chantagem” (ele escreve a palavra). Generalizadamente, muito depois das flutuações do assunto do valor dos conflitos de classe, ele acabará por prognosticar a formação de uma vasta classe média no seio da qual se inscreverão as oposições entre poderosos e proletários, como o conjunto dos antagonismos inerentes a toda a sociedade.
Não é ele este “pequeno burguês” estigmatizado por Marx e os seus seguidores? Cabe a cada um julgar. Ainda convêm fazê-lo sobre um puzzle, depois de ter substituído as posições que nós vimos evocar no seu contexto histórico. É o que eu me proponho fazer aqui, mantendo-me bem entendido pelas grandes linhas de um pensamento complexo e que talvez nunca tenha encontrado a sua expressão definitiva.
Comecemos pelos julgamentos de Proudhon sobre o princípio e a prática das greves. Muito isoladas, com efeito, ao longo da sua obra – já que ele não evocou o assunto mais que duas vezes, com vinte anos de distância – as suas condenações não terão uma grande repercussão no seio do futuro movimento operário. Elas exigem alguma atenção, para apanhar a argumentação do autor e evitar cair no anacronismo.
Isto não vem antes das Contradições Económicas (1846), já que o tema é abordado de forma significativa. Uma primeira vez acidentalmente, na página 184 do I volume (1), ao longo do desenvolvimento sobre os efeitos do machismo que ameaça a seguinte afirmação: “Hoje, a aliança e as greves dos operários parecem ter acabado sobre todos os pontos da Inglaterra e os economistas reúnem-se com razão à volta da ordem, dizendo mesmo pelo bom-senso”. Deixemos de lado o que pode ter de litigioso a constatação, para sustentar somente o acordo naquilo que ele tem de peremptório. Encontra-se a justificação – senão mesmo a demonstração – nas páginas 323 e seguintes da mesma obra, a propósito desta vez da repercussão da fiscalidade sobre o jogo da concorrência. Tentemos resumi-la.
Acabado de descobrir os economistas clássicos, Proudhon aponta os apostolados da teoria liberal para fazer aparecer as “contradições”. É nesta perspectiva que lhe convêm interpretar a sua explicação da passividade complacente do poder político no grave conflito que tinha tido lugar, em 1844, aos mineiros da Rive-de-Gier. Terminando o trabalho para obter um aumento de salário num sistema de concorrência livre garantida pela lei, argumenta ele, os mineiros tendem a falsear o mecanismo da formação dos preços. Desde logo, não seria de espantar que as autoridades tinham estado do lado dos empreendedores. Se, com efeito, estes cedessem diante da aliança operária, eles encontrar-se-iam em posição de inferioridade em relação aos seus concorrentes e todo o equilíbrio do sistema seria destruído. Por vezes o aumento das mercadorias anularia certamente as vantagens arrancadas. O direito social não sendo reconhecido, só o incómodo dos feitos estava disposta a regular o mercado: “Já que o trabalho não é reconhecido, ele deve ser a escravidão: a sociedade não subsiste a este preço” (página 323).
Certamente, pode-se estar chocado com uma tal atitude, não sendo como uma opinião estritamente proudhoniana. Mas como não ver que ele se agita num raciocínio pelo absurdo, deliberadamente provocante segundo a maneira do autor? Colocando no extremo as consequências do liberalismo, Proudhon quer demonstrar o absurdo. E, consequentemente, justificar a sua substituição por um regime contratual que, sem conhecer as leis da economia, seria conforme a Justiça. Isso chama-se plagiar o falso para chegar ao verdadeiro.
Admitimos frequentemente que, esta última interpretação lógica, dissimula outros inconstantes mais ou menos conscientes. Intimamente, Proudhon é um “homem da ordem”, como o diz o título do seu ambicioso tratado dos anos precedentes (não terá deixado de salientar também a expressão “regresso à ordem” na citação mais eloquente ). É por amor à ordem que ele se afirma revolucionário. Mais, o seu profundo respeito pelo trabalho possui-o instintivamente a ter como anti-social o facto de interromper a produção pela violência. Ele supõe que as rebeliões isoladas não são só vaidosas, mas geradoras do mal.
Não se saberia conhecer que as condições da época corrompiam terrivelmente esta forma de ver. No estado de desorganização onde se encontrava a classe operária, as greves só podiam ser pontuais com as reivindicações limitadas para o aumento dos salários ou a quebra das subsistências. A ameaça do desemprego e a certeza da repressão sendo quase sempre a contrapartida. Evitar estas misérias suplementares aos que oprimiam desde logo o peso da fatalidade podia portanto, compreender-se. um dia viria no qual a educação permitia-lhe associar-se para enfim uma mudança durável da sua condição.
Sem dúvida estes argumentos não deixaram de ser contraditórios, no mesmo meio histórico, por aqueles para que toda a revolta é fonte de progresso, mesmo quando ela se consolidava por um insucesso. Constatamos que isso não era o ponto de vista de Proudhon, nas condições da Monarquia de Julho. Muitos só esperavam então uma mudança de regime. Outros viam mais longe e procuravam os meios de uma transformação completa da sociedade. O debate está, para certos olhares, sempre aberto.
Ainda mais curioso segundo os critérios de hoje, é a obstinação de Proudhon a comandar a greve até a toda a sua última e célebre obra, intitulada por um acréscimo de paradoxo: Da Capacidade política das Classes operárias (1865, póstumo ). Todo o IX capítulo está lá consagrado, explicitamente intitulado: “As alianças operárias, questão indissolúvel no regime económico - político actual” ( página 372 e seguintes ). Antes de expor as teses, que permanecem rigorosamente na linha dos precedentes, são necessárias algumas palavras sobre as circunstâncias que ameaçaram a redacção destas páginas. Atraindo o período “liberal” do seu reino, Napoleão III tinha sugerido no seu discurso de abertura da sessão do Corpo legislativo de 1864, uma modificação de artigo do Código Penal proibindo as alianças – quer elas sejam patronais ou operárias – como é de natureza falsear as condições do trabalho. Este texto era, sabe-se, saída da lei Le Chapelier de 1791 que, não querendo conhecer os indivíduos, tinha abolido as corporações do Antigo Regime. O desejo de imperador equivalia bem entendido a uma ordem.
Uma primeira redacção, bastante prudente, dos novos artigos foi modificada com a exigência de Morny por uma comissão na qual Emille Ollivier era o repórter. Ela foi de seguida adoptada por um voto de 2 de Maio de1864. O novo texto não iria até legalizar as alianças, mas fazia uma simples contravenção em vez do delito punido de penas pesadas que elas eram primeiramente. É portanto contra o que podia ser tido como um sucesso de oposição de esquerda, que Proudhon desencadeia.
De entrada ele ataca, denunciando o risco de “colocar questões ardentes onde, algum partido que se toma, os inconvenientes balancem sempre as vantagens” ( página 372 ). E deixar entender que os autores do projecto – entre os quais figurava o seu colaborador Alfred Darimon! – estão contentes em fazer um assalto de demagogia com o poder. Os trabalhadores, que se pretende ridicularizar, foram “nesta circunstância estranhamente mistificados pelos demagogos” (ibid). E Proudhon explica porquê, referindo-se directamente às suas demonstrações de 1846.
O ponto de vista não mudou sobre “a concorrência anárquica, que desde 89 é a base do nosso sistema económico”. Mas, já que “o direito económico, então como hoje, era a mesma __ do direito”, (página 375), Proudhon recusa-se não menos obstinadamente que antigamente a esta contradição inerente ao sistema resolvido pelos paliativos, que segundo ele não são definitivamente os astutos. A greve deve portanto ficar ilegal para que o sistema possa funcionar e que os trabalhadores, deixando de ser nascidos de ilusões, compreendam que é ele que é preciso mudar. Tolerando mais ou menos as greves, alargava-se ainda o domínio da selva. E a Capacidade de retomar quase palavra por palavra a fórmula das Contradições segundo a qual: “Como o trabalho não será dado a conhecer como soberano, ele deve ser tratado como servo”. Na “caverna dos ladrões”, que é a sociedade actual, “… não há mais direito de aliança como não há direito de chantagem, de burla e de roubo (…); foi isto que o Corpo legislativo reconheceu implicitamente, reservando certos casos onde este pretendido direito de aliança seria considerado como abusivo, ou seja, onde a coligação reapareceria tal como era primeiramente, mal - feita e culpada” ( pp. 382-386).
Na leitura destas páginas, nas quais a violência ultrapassa as nossas citações, pode acusar-se o autor da fúria dialéctica, do maximalismo ou outros excessos, mas certamente não tomar partido a favor dos exploradores contra os explorados. Ás vezes, sobre este assunto, Marx não a fez. Colocando-se num terreno exclusivamente económico, ele crítica na Miséria da Filosofia a argumentação do “tudo ou nada” de Proudhon. Segundo ele, os aumentos de salários obtidos no fim de um conflito vitorioso não arrebatam fatalmente uma subida dos preços. Pelo contrário, elas podem estimular, graças ao progresso técnico, o melhoramento da produtividade. O que à luz da experiência, está exactamente revelado. Como está também marcada segundo a qual, é falso que os incómodos do mercado não possam acomodar-se numa legalização da greve, já que esta foi autorizada em Inglaterra desde 1825 pela Acta do Parlamento sem que o sistema se arruíne igualmente. Na realidade, escreve Marx, “Quanto mais a indústria moderna e a concorrência se desenvolvem, mais elementos existem que provocam e auxiliam as alianças; e imediatamente as alianças tornaram-se um facto económico, tomando o dia-a-dia mais consistente, elas não podem demorar em tornarem-se num facto legal” ( página 132 ).
Sem nenhuma dúvida, esta forma de raciocínio aparece-nos hoje, conforme a evolução dos bens sociais que a condenação sem apelo à qual ela responde ( como, bem entendido, algum desprezo ). Para dizer a verdade, a diferença dos pontos de vista explica-se em grande parte pelas situações respectivas da época, do movimento operário relativamente ao capitalismo na França e na Grã-Bretanha. Mas não é isso também porque o pragmatismo britânico tinha desde logo optado por uma estratégia reformista, que as análises marxistas tivessem podido recusar tudo tanto quanto os proudhonianos ainda que por outras razões?
Portanto, se se examina mais perto, a atitude de Proudhon perante as greves não é – apesar de uma formulação que data – tão “reaccionária” que ela é geralmente afirmada, e menos ainda em ruptura com o conjunto do seu pensamento. É preciso dizer-lhe que o estado de desorganização da classe operária francesa era a natureza justificar as suas colocações ao olhar contra os trabalhadores. Agitando-se mais particularmente da lei de 1864, que provocou o último diatribe da Capacidade, ele não estava clarividente de a ter por um poder enfraquecido, procurando ameaçar a esquerda pelas concessões menores. Denunciando-as como uma cilada, Proudhon não tinha intenção de prejudicar.
Isso não conduz a nada, e é todo o sentido desta mesma Capacidade, que ele não chama de seus desejos o tempo onde a classe operária, constituída num poder autónomo, libertar-se-à da sujeição que a esmaga. Mas, à muito tempo que as condições não serão realizadas, as insurreições dispersas só podem agravar o mal. Esta rejeição circunstancial traduz também uma concepção, não maléfica mas progressiva, da revolução. Marcada pela trágica experiência de 48-49, aquele que nunca recusou um combate este também essencialmente exposto à violência puramente destruidora.” Aos meus olhos ele não cometeu um grande crime, escreveu ele, como a excitação da guerra civil “( Cor.VI-181 ). Eis o que pode surpreender, e portanto este foi a sua posição constante.
Nesta perspectiva, efectivamente, e apesar dos golpes de cólera que são ilusão, Proudhon não variou. O único adjectivo que lhe parece digno de ser perseguido é a realização da justiça pelos meios conforme as suas exigências intrínsecas. Toda a acção deve, tanto quanto possível, ser orientada segundo este critério. Longe de querer suprimir os antagonismos pela dominação de um campo sobre outro, ele tenta a sua tensão pelo motor do progresso. A “balança” dos opostos, segundo a sua expressão favorita, é a dinâmica das sociedades. Bem diferente de uma conciliação medíocre, ela está só e capaz de contra carregar os princípios de degradação sem deixar a obra, opondo-se-lhe uma violência criadora.
Tal é a ideia directora deste grande livro, tão mal cumprida, A Guerra e a Paz, que esclarece as presentes reflexões. Os conflitos e as fontes de conflitos existem por todo o lado, e de uma certa maneira eles são produtivos. Pretender suprimi-los pela força é em vão: é preciso resolvê-los, no pleno sentido, ou seja, submetê-los à Justiça. Assim a guerra, em vez de ser a negação do direito, pode tornar-se a parteira. Ruptura de equilíbrio, ela só será superada pela instauração de um equilíbrio superior, menos injusto que o precedente. Os antagonismos só deixarão de existir com a morte, mas não é essencialmente fatal que eles terminassem aos conflitos irresolúveis. O direito da força é o oposto do reino da força: é a regulação permanente da força pelo direito.
A mesma dialéctica da arbitragem aplica-se aos conflitos do trabalho e, mais globalmente, aos que resultam das contradições da economia. Produto de um desequilíbrio entre os interesses nos quais a legitimidade pode ser equivalente, eles não serão eliminados pela predominância de um grupo sobre outro, ou seja, só pela força. Isso seria vê-los renascer na primeira ocasião. Uma transacção é necessária entre as forças organizadas, segundo o direito existente ou o seu perfeccionismo para vir. Como a guerra, argumenta Proudhon, a greve onde o lock-out é os efeitos da ausência do direito, senão dito da lei do mais forte. É preciso romper esta fatalidade e não invertê-lo. Não se fará parar um incómodo uma injusta por um incómodo oposto, pois “Uma vez sobre a costa do arbitrário a Democracia operária, não mais que o despotismo, não saberia parar-se”. ( Capacidade, página 397 ). A pseudo-legalização de um golpe de força não faz parar a ditadura, mas consolida-a.
Visões utópicas, apologia do reformismo medíocre face às esperanças de uma irresistível vitória do proletariado? Que cada um decida. Delimitamo-nos em marcar que a tendência geral das nossas sociedades é sobretudo resolver os conflitos segundo o método proudhoniano, enquanto que só uma minoria falível pregue ainda uma “grande noite”, na qual ela parece acreditar cada vez menos. Nota-se igualmente que Proudhon admitia, no caso onde a opressão não oferecia nenhuma saída, o recurso à “resistência legal”: recusa do recrutamento, do pagamento de imposto, etc. Esta solução extrema não está bem próxima da “greve geral” que Sorel proporá como arma suprema ­­do sindicalismo revolucionário? Lá, bem como noutros domínios, duas tradições distintas podem reclamar o mesmo título do autor da Capacidade. A não violência, o que não quer dizer a mais moderada, poderia ser a mais fiel.
Sobre os bens entre as classes sociais, e mais precisamente a “luta das classes” no sentido marxista do termo, a obra proudhoniana oferece uma diversidade de apreciações susceptíveis de ser interpretadas nos sentidos opostos. Eles têm, efectivamente, variado segundo as épocas e as circunstâncias, o seu autor parecendo conter esta questão como muitos mais conjuntural do que doutrinal, e menos ainda sociológica. No conjunto, portanto, os saltos de humor colocados à parte, estes julgamentos sucessivos e por vezes quase simultâneos, inscrevem-se na perspectiva de uma confrontação aberta na qual nós temos visto a aplicação no caso particular da greve.
“Nascido e elevado no seio da classe operária, surgiam-lhe ainda no coração e nos afectos, e sobretudo pela comunidade dos sofrimentos e dos desejos”, como ele o proclama com convicção na sua carta de candidatura à Pensão Suard, o Proudhon dos debates é fortemente hostil aos detentores do poder no geral, e, mais particularmente aos poderosos. O que o leva a diagnosticar que “na multidão das causas secretas que agitam os povos, ele não gosta dos poderes, mais regulares, menos desconfiáveis, que as explosões periódicas do proletariado contra a propriedade” ( Primeira Memória, página 315 ).
Constatação empírica, contudo, na teoria. Desde as Contradições ( nomeadamente I, página 286 ), vê-se atrair, a propósito do imposto para o qual todos devem contribuir conforme os seus meios, o projecto de uma “transacção” inscrita no contrato social. Se se compreende bem, ele agitar-se-ia para estabelecer entre as classes uma trave, e talvez uma cooperação, benéficas para todos. A simpatia do autor e as suas proposições têm, contudo, como principal objecto assegurar aos trabalhadores o lugar preponderante que sempre lhes foi recusado. A tomada de consciência dos seus interesses colectivos, confirmado pela ciência económica, deve ser o instrumento.
Vêem então as jornadas de 48 e as seguintes funestas. Proudhon, que tinha desde o início, julgado esta revolução improvisada como chegar ao insucesso, está consternada pela ausência da educação do povo, que o comanda a abandonar os demagogos. De onde o surpreendente “Elogio da burguesia” que abre a Ideia geral da Revolução, para alguns o mais subversivo dos seus escritos. A tese é que o elo da classe burguesa, que fez 89, deve prosseguir. É encabeçando a revolução social que ela confirmará o seu papel dirigente. Senão, um fim irremediável está-lhe destinado.
A mesma ideia, simplificada, reencontra-se na profissão da fé para as eleições da Assembleia nacional e de outros textos contemporâneos. Poder-se-ia lá ver uma um pouco ingénua, mas isso seria conhecer mal a inaptidão do nosso homem ao dissimular o seu pensamento. No estado depressivo onde se deixaram os insucessos dos anos precedentes, ele remete-se para um sobressalto das elites. Durante este curto período, como o justifica uma certa privada, Proudhon que não está desprovido de uma fórmula, coloca as suas esperanças na “conciliação das classes, símbolo da síntese das doutrinas” ( Langlois, de 18-5-50, Cor., III - 263 ). Este será o tema, dando o flanco a tantos ataques, da Revolução social demonstrada pelo golpe de Estado de 2 de Dezembro.
Bem entendido o cinismo e a corrupção do Império não deixarão de enganar estes cálculos ainda que não tenha feito o comportamento do povo, o qual pelo menos não é culpado de nada. Então, apoiar-se no quê? O vasto inventário da Justiça estabelecerá a urgente necessidade da Revolução e os meios irrisórios dos quais ela dispõe, ora aqueles da sua força interna. Nos últimos meses da sua vida, reconfortado pelas premissas da criação de uma grande associação operária, Proudhon anuncia à burguesia que o “seu papel chegou ao fim” (Capacidade, página 101). Contudo, a pena lança este anátema, ele prossegue: “A distinção actual entre as duas classes, operária e burguesa, é um simples acidente revolucionário. Os dois devem absorver-se reciprocamente numa consciência superior”. Curioso vai e vem!
É a mesma esta antecipação que parece reunir a última aspiração de Proudhon. Sem dúvida, é-lhe permitido utilizar incidentalmente a expressão de “luta das classes” (Princípio, página 296, por exemplo), mas no sentido muito geral e mesmo com uma espécie de repugnância. Então a noção de conflito encontra-se sobretudo na sua obra, na qual é como nós tínhamos sublinhado uma das passagens essenciais. Se a oposição das classes tinha tido para ele uma importância da mesma ordem, ele não teria deixado de se explicar.
A resposta às múltiplas questões que se colocam a propósito de Proudhon, acaba sempre na conclusão que o que ele rejeita mais a dominação do homem sobre o homem, de um grupo ou de uma classe sobre os outros, de uma verdade sobre a verdade contrária. Pode-se dizer sem razão de ser desmentido, que a sua vida foi consagrada a combater todas as formas de opressão quaisquer que elas sejam e de onde elas venham, compreendendo-se aí as da origem popular. “Eu só quero o Hércules plebeu do que o Hércules governamental”, declara ele na Guerra e a Paz ( página 28), que deve ler-se em relação estreita com as suas duas obras testamentárias: a Capacidade e o Princípio federativo.
Em definitivo, a única preocupação proudhoniana é a da Igualdade, condição da Liberdade e realização da Justiça. Se a Revolução devia acabar com a ditadura do proletariado ou com a supremacia de um qualquer partidário do diálogo social, ela seria incomparavelmente mais grave que a desordem anterior. Que se faça ou não reservas sobre tal ou tal posição, ela pelo menos, não deveria causar-nos problema.

1 - Todas as citações são feitas, salvo indicação contrária, depois da edição Rivière

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