domingo, novembro 20, 2005

PROUDHON: O REGICÍDIO OU A INUTILIDADE DA VIOLÊNCIA NA HISTÓRIA

A 24 de Setembro de 1855, Proudhon anota no seu caderno: “Asseguraram-me que uma tentativa de assassinato sobre a pessoa do Imperador foi realmente feita por um dos seus guardas. Este homem, naquele dia de serviço, tinha entrado no quarto do Imperador, e depois de ter falhado, teria estabelecido uma luta com ele. O Imperador que não reapareceu em público, teria sido ferido; o culpado fuzilado no campo”.1 Depois a 28: “Eu compareci diante do juíz de Instrução pelo atentado de 24. Eu devia desde logo fazer uma declaração diante do comissário da polícia. Diante estas duas autoridades, pareceu-me que uma certa benevolência cercava o assassínio. Rejeita-se a sua origem nas más doutrinas”.2
A leitura dos cadernos de Proudhon mostra-nos o homem muito preocupado com a questão dos regicídios, particularmente quando, como é este o caso, as autoridades não querem nos seus escritos uma incitação ao assassínio. Também cada atentado inspira-lhe novas reflexões, - reflexões antes de mais lançadas “à pressa” nos seus Cadernos,3 depois finalmente reunidas e organizadas na Justiça na Revolução e na Igreja.4 Perante este olhar, é a similitude impressionante observada entre o conteúdo dos cadernos (particularmente a 29 Julho de 1846)5 e os desenvolvimentos da Justiça… (redigidos depois do atentado de Orsini, a 14 Janeiro de 1858),6 que decidiu o tema da nossa contribuição nos Arquivos proudhonianos. Entre estas duas datas, nós assistimos ao nascimento e à evolução de um pensamento, de um raciocínio que se estrutura; mas ele permanece sobretudo surpreendido ao constatar quantos, desde Julho de 1846, o eixo da sua análise está desde logo presente – não deixando finalmente mais tempo para fazer a sua obra, e em alimentar a substância.
É no XII estudo da Justiça… que Proudhon tem naturalmente inserido os seus desenvolvimentos sobre o regicídio, vendo neste acto a última do opressor. Se a definição que ele dá não tem nada de inédito, o autor reivindica em contrapartida a novidade, a “ousadia” do seu julgamento. Ele opta efectivamente por uma via mediana, a meio caminho entre um suporte absoluto e uma condenação à priori do regicídio7, defendendo-se sobretudo ao apresentar uma teoria de valor universal. Com efeito, se o seu método é feito de análise histórica e de observação dos factos, não é essencialmente para libertar uma lei invariável, mas bem mais para substituir os actos no seu contextos, ora do qual eles não podem explicar-se. esta percepção da história não era um fim mas um meio: “outra coisa é fazer do passado um objecto de estudo, outra coisa é fazer do conhecimento do passado, a mesma ciência da humanidade”8
Contudo, se a matéria é efectivamente abundante – Proudhon ilustrando o seu propósito de uma loucura de exemplos tirados da história – parece-lhe tirar um julgamento finalmente invariável: “O regicídio é por vezes desculpável; o regicídio é razoável, nunca”. 9
Retomamos os motivos desta sentença, para determinar a capacidade, e eventualmente destacar as insuficiências.
A análise do regicídio articula-se à volta dos eixos. Num primeiro tempo, Proudhon prende-se a remontar até à primeira causa do assassinato político – o que reconduz à constituição da sociedade. Posto isto, ele passa então a uma explicação mais pragmática que, demonstrando a mesma estrutura do regicídio, vai colocar em destaque as responsabilidades que ele engana.
A primeira etapa do raciocínio apresenta-nos o regicídio como sendo o efeito de uma causa na qual o ampliador é tal, que ela acusa, ela própria, toda a incapacidade deste gesto.
Esta causa não se encontra numa “perversidade” inata do homem, Proudhon recusando a análise angustiante da natureza pecadora do homem depois da queda. Mas o regicídio não se explica mais por um “risco” constitutivo da essência do poder.
A verdadeira razão encontra-se no que Proudhon chama uma “patologia social” – antigamente dita como um estado ”desviante” da sociedade, provocada pela cisão vinda inesperada entre os seus elementos constitutivos. O regicídio é um dos sintomas desta patologia, ele não é o remédio; ele é “o acto de uma sociedade dividida, em revolta contra ela mesma, e que nega a pessoa do seu representante” .10
A sociedade é a reunião de indivíduos sob a bandeira de um mesmo espírito, o qual funda a autoridade das instituições que eles dão para as dirigir. Num bem frequente sob a sua pluma, Proudhon vê lá uma analogia com a família, a qual, além da autoridade do pai, caracteriza-se pelos laços que unem os seus membros. Num e noutro caso, este cimento moral é necessário, pois Proudhon nomeia, for a de toda a aceitação religiosa, o “espiritual”. Sem ele, a autoridade do chefe (“o temporal”) não está mais fundada, a obediência não lhe é mais assegurada, não lhe deixando mais outra escolha que o recurso à força. O grande reconforto de ilustrações históricas, Proudhon destaca este fastio do espiritual, no qual a consciência reside na alternância “fatal” de tiranias e de tiranos.
A passagem deste ciclo encontra-se desde logo numa reabilitação do espiritual na sua plenitude, a qual não pode ser o facto de algum “voluntarismo”. Numa óptica que se pode qualificar de “espontânea”, Proudhon anuncia que esta reabilitação só pode sair de um processo em acção na sociedade e na história, sem que ele tenha a necessidade de alguma impulsão determinada. Ele parece então que o propósito esteja bem próximo desta corrente iniciada por Montesquieu depois Burke, e no qual a escola do direito histórico de Savigny 11 apresenta-se no século XIX em França, e ele é verosímil que Proudhon tome conhecimento dos seus teóricos, em particular pelos seus tenentes franceses, Lerminier e Laboulaye. Esta corrente de pensamento insiste à partida sobre os fenómenos históricos colectivos, que escapam ao voluntarismo do homem (do legislador em particular). A concepção da sociedade é organizadora, na qual as diversas realidades apresentam-se como o fruto de uma actividade contínua do povo; a actividade arbitrária dos indivíduos é transcendente por esta espontaneidade criadora 12 do povo na história, que sozinho pode restaurar a sua unidade fundamental.
Esta análise da causa primeira dos regicídios, que explica a superveniência ao mesmo tempo que ela acusa toda a inutilidade, permite também observar a realidade. É sobre esta base que Proudhon vai em seguida atacar a julgar a “moralidade” dos regicídios. A análise vai ser mais pragmática, essencialmente concentrada sobre o regime de Napoleão III. mas o propósito parece principalmente o eixo sobre o casal “assassínio - assassino”, todo o último plano parece-nos pleno de uma só intenção: a de colocar em destaque a responsabilidade do povo. É aqui um novo episódio da relação apaixonada de Proudhon com os seus contemporâneos, esta multidão à qual ele confessa todo o seu trabalho, e no qual portanto, ele não deixa de estigmatizar as cobardias 13.
Para melhor colocar em evidência este jogo de responsabilidades, parece-nos indispensável individualizar bem cada um dos termos constitutivos do regicídio.
Proudhon anuncia que o regicídio não é desculpável, só se se provar a culpabilidade do príncipe. Ora, o que é a tirania? O autor ridiculariza os socialistas, para quem Napoleão III é uma tirano “porque ele não é nem vermelho, nem socialista, nem revolucionário! Não é uma boa definição! … 14. Mas ele próprio não é muito explícito. Nós não encontramos junto dele alguma teoria exaustiva, algum sinal completo do tirano, sobre a base da qual os sujeitos poderiam reclamar contra ele. Mais geral por vezes, Proudhon não se interroga sobre a “legitimidade” do príncipe não fazendo alguma diferença entre um príncipe legítimo que teria ultrapassado a sua função, e o indivíduo que teria usurpado o poder supremo (qualquer que seja em seguida a maneira na qual ele assume o exercício). Isto não se reencontra particularmente na análise que ele faz do assassinato de Napoleão III, que o golpe de Estado de 2 Dezembro não dá aos seus olhos mais usurpadores que os plebiscitas sucessivos não chegarão a dar-lhe a meia legitimidade. Em relação à primeira parte do seu desenvolvimento, parece finalmente que Proudhon não vê na tirania mais que um feito, definitivamente também necessário que o regicídio, e todo sintomático desta cisão da sociedade.
As notas e esclarecimentos… são apenas mais precisos, não trazendo a distinção entre o soberano “coroado” (qualquer que seja portanto a sua legitimidade) e o soberano “caído” (não dispondo mais dos atributos do poder público ). Isto conota dois níveis de responsabilidade do príncipe: a responsabilidade”política”, que Proudhon recusa ver posta em causa, sob pena de viciar fundamentalmente o exercício de todo o poder. Em contrapartida, ele apoia uma responsabilidade “penal” e à posteriori do príncipe, que deve justificar as infracções do direito comum, comprometidas sob a sua autoridade.
Contudo, nem num nem noutro caso, o assassínio do príncipe não é aceite, e isso, mesmo se a sua atitude é tal que “a tirania pode parecer em príncipio legítima” 8 Mas, mesmo então, o regicídio é negado pelo recurso ao mesmo tempo argumento legal: é preciso poder justificar a culpabilidade pretendida do príncipe, sem “lei, crime”15 este argumento evoca a legalidade dos delitos e das penas que reivindicavam, sob a implusão de Beccaria e Voltaire, os homens de 89. Ao fazer eco, Proudhon reclama pois a inscrição ao código penal do crime da tirania, melhor forma de lutar contra “o arbitrário decapitações e a reciprocidade do assassinato”16. Ora parece-nos que uma tal reivindicação releva a simples declaração do príncipe, na qual Proudhon parece ter admitido a gratuidade, aprofundando outra medida à análise. Imagina-se mal efectivamente o princípio legislador sobre esta questão, admitindo num texto o direito positivo, tudo o que o seu poder encobre na possibilidade de arbitrário, fundando no direito da capacidade dos seus assuntos a prosseguir! Aqui, por vezes, implicaria que seja instituída, abaixo do soberano, uma instância diante da qual ele teria de prestar contas, o que é a mesma negação da soberania. Nós regressaremos ulteriormente a esta questão, que no nosso sentido tem em conta uma solução nas Declarações dos direitos de 1789 e 1793. Acrescentemos simplesmente que o feito de codificação, o crime de regicídio estava então inscrito no código penal e expõe o seu comentador na mesma pena que para o parricídio.
Como é que Proudhon considera o criminal convencido de regicídio? Na primeira edição de A Justiça…, ele só se interessa com a forma individual do regicídio, mas a sua obra enriquecerá pelo seguimento de reflexões dando forma colectiva a um tal acto.
No primeiro caso, a condição de exclusividade é que o autor seja “sem aproximação”17. Numa certa medida, este está bastante próximo da análise desenvolvida por Mariana 18, para que o regicídio deva ser heróico, animado por motivos virtuosos com quais os nomes ele vai riscara sua existência. Apesar de tudo, mesmo se o acto testemunha uma opressão realmente sofredora que pode desculpar o gesto, Proudhon recusa fazer alguma justificação do assassínio do opressor. O regicídio é confessado, e desde logo incapaz do recuo necessário a uma decisão razoável, e esta confissão torna-o no mais egoísta dos homens: “ele coloca o seu sentido privado no lugar da razão das coisas, causa o seu fanatismo abaixo da vontade geral” 19 – é assim que “Poltrot é uma das causas da Saint-Barthélémy” 20.
Esta confissão do indivíduo, que denuncia todo o perigo do regicídio, existe ao nível do grupo, desta minoria na qual Proudhon exige o direito de julgar a maioria? Os seus desenvolvimentos sobre a forma colectiva do regicídio são então abertamente anti-democratas “há mais oportunidade da razão se reencontrar numa minoria de elite do que na multidão vulgar. Depois disso, pode-se dizer que a soberania contêm, do direito racional, sobretudo a minoria que a massa” 21. Mais marcante aqui das paixões nefastas que habitam o indivíduo e o ameaçam com impasses temíveis, mas uma opinião reflectida, engana da deliberação do grupo. Ora, sobre este fundamento, Proudhon imagina que o grupo faça secessão com o resto da população, afilando a sua diferença. Perfila-se aqui uma recolocação em causa do contrato fundador no qual a saída de toda a organização política e social, cercam à volta dos homens o estado que precede “a existência convencional da sociedade” 22. Desde logo, num raciocínio próximo daquele dos teóricos ingleses do contrato social (Hobbes, Locke), cada um reintegra os direitos nos quais ele jogaria ao estado pré-social, no qual o principal é o direito de se fazer justiça. Mas aqui acompanha-se desde logo a perda de toda a segurança jurídica, já que mais nenhuma autoridade 23 está instituída para arbitrar os conflitos jamais necessários entre os indivíduos procurando impor os seus direitos.
Proudhon não evoca aqui o caso do conflito entre minoria e maioria; mas esta primeira cisão consumada, não vê o que podia impedir outros e, num regresso infinito, pode-se prever uma atomização da comunidade, finalmente dissolvida numa ostentação de indivíduos. Parece bem que Proudhon tinha percebido este perigo, e a hipoteca na qual ele agrava a sociedade. Também, num movimento de vácuo, ele sugere que a minoria – mesmo no seu bom direito – dobrar-se ao fazer maioritária, e ao aceitar o incómodo atendendo à confissão da Justiça. Nós reencontramos de novo este processo histórico fatal, evocado precedentemente, e sobre o fundamento do qual Proudhon justifica este incómodo temporário.
O benefício minoria/maioria, sobre o qual Proudhon baseia a forma colectiva do regicídio, ameaça-nos a evocar o último termo da trilogia constitutiva do regicídio: o papel impróprio à população, esta maioria na qual nós tínhamos visto o autor prende-se ao preservar os direitos, mas face à qual ele se mostra intransigente.
Porque a tirania é a passagem certa da maioria. Evocando o 2 de Dezembro, Proudhon considera que “o povo foi desleixado, mais desleixado que o governo derrubado por ele em 1848; como uma manhã ele foi tomado de raiva feroz para a liberdade, de desprezo pela constituição e de adoração pela força! (…) Nada menos democrata, no fundo, que o povo. As suas ideias trazem sempre para a autoridade de um só” 24. Só, o tirano não teria podido chegar ao poder, e só, ele não saberia lá manter-se – a tal ponto que finalmente, “o tirano não existe por si só; ele é o produto, o gerente da situação, ele é último em todo o mundo” 25.
A Boétie no seu tratado de A Servidão voluntária (1548) não desenvolve uma ideia diferente, demonstrando a estrutura da tirania, ele mostra que se na cabeça do Estado ele não se encontra bem com uma só pessoa, a autoridade desta última descansa de facto sobre um vasto conjunto de suportes que apoiam e a sua vontade, formando uma pirâmide com uma base tão larga que ela acaba por recobrir a quase totalidade do Estado. De alto a baixo, isso não é mais que uma aceitação submissa das ambições pérfidas de um homem, sem que lhe seja necessário recobrir o incómodo exterior, nem mesmo justificar legalmente a sua autoridade. Tudo vai assegurar o suporte da população pela concessão de algumas arraias-miúdas compensações; em definitivo, é menos a inércia da população na qual ele se perfila, do que a sua “avidez”.
Nestas condições, nunca o assassínio do tirano imporia a tirania, e Proudhon livre desta sentença de um grande poder: “vós não sereis livres pois vós sóis maus; vós adorais um mestre e vós o aborreceis, adorando-o, e vós o matais. Mas vós o matais em vão, porque este monstro, sois vós; e o que quer que ele tenha feito, vós não o matareis sem crime, porque o verdadeiro culpado, sois vós” 26. Tal afirmação desencadeia duas consequências: uma pela certeza que ele está em vão a bater no tirano; “é preciso, para ser consequentes e justos, eis o corolário da tirania” 27. Ora a massa de cúmplices é tão importante, que na tal proscrição equivaleria ao suicídio puro e simples da comunidade – situação que Proudhon não pode caucionar. Mas por outro lado, esta afirmação entende suscitar uma reacção. A massa deve tomar toda a medida da sua força e sair da sua servidão, recusando sustentar o príncipe. Esta esperança permanece contudo, carregada de uma grande lucidez histórica, a experiência indicando que a sociedade não colocará no movimento mas sim no seu próprio chefe, ninguém pode impor-lho. Perante este olhar, portanto, nunca o regicídio poderá provocar uma tal onda de choque que a população corta o seu caminhar em direcção à liberdade. Bem do lado oposto, a desordem sucedendo-lhe é tão grande que se vê a sociedade quase a atordoar-se de novo nos braços do primeiro homem “provinciano” capaz de lhe dar uma calma artificial. Só o efeito do regicídio não é portanto mais do que atrasar ainda o acontecimento da Justiça. A alternativa à tirania reside finalmente numa tentativa histórica na qual a saída longínqua não saberia ser vã: “a experiência completa do princípio de autoridade servirá de educação à humanidade. Desta plenitude de evolução política surgirá, no fim, a hipótese oposta; o governo usando tudo só, enfrentará, como o seu postulado histórico, o socialismo” 28.
No momento de conclusão deste estudo, uma última nota deve ser feita sobre a análise das Declarações dos direitos 29. Proudhon revelou, com justo título a dificuldade inerente ao trabalho dos constituintes: “ Para se garantir a insegurança popular, é-se obrigado, no sistema dos fundadores de 89, a aumentar a força do poder, no mesmo momento onde se toma uma outra posição das preocupações contra de (…). Estranho sistema onde o povo não pode exercer a soberania sem se expor a separar o governo, nem o governo usar da sua prerrogativa sem caminhar no absolutismo 30. Mas ele não colocou bem longe esta reflexão, não vendo em quê, precisamente, as Declarações permitiriam ultrapassar este aparente paradoxo. Assim, sobre a questão que nos ocupa, a que concepção está cheia de uma grande incerteza.
Primeiramente, ele parece não reter das Declarações que o artigo 35 do texto de 1793 (dever de insurreição) 31, submetendo sob este conceito a forma individual do regicídio que, a nosso ver, encontra-se antes de mais fundado no direito de resistência do artigo 2 do texto de 1789 e artigo 33 do texto de 1793.
Mas para além desta imprecisão terminológica, existe uma outra confusão de um outro ampliador: Proudhon denuncia a priori tais direitos de Constituição 32. Ora, precisamente, os constituintes são bem guardados de uma tal inscrição; pois foi-lhes negado, nós tínhamos visto, a organização política ao mesmo tempo que era fundada, e pretende o mesmo momento dirigir as tendências que a nega.
Parece, em definitivo, que Proudhon perde-se numa interpretação muito imediata e contingente, limitando-se a um nível de leitura muito pragmático para lhe permitir enganar o valor. Pois abaixo de um apelo ao assassínio e à revolta, ele parece-nos que os direitos de resistência e dever de insurreição devem analisar-se como um apelo à vigilância constante dos cidadãos, face a um poder no qual admite-se a possível fabilidade. Uma tal leitura, que conota uma responsabilidade dos cidadãos. Coloca-se como o suspenso “optimista” de tal engano por Proudhon. O erro do autor dói finalmente pensar que a presença destes direitos nas Declarações chamar necessariamente a sua efectividade. Tal não deve ser o caso. Nós partilhamos o que plenamente a análise em todos os pontos esclarecendo a Srª Simone Goyard-Fabre, a qual permite entrar os obstáculos nos quais Proudhon e tantos outros são perdidos:” Estes direitos não são um privilégio que cada um, ao seu grau, poderia usar e abusar. Eles designam os valores sem os quais a humanidade não pode ser reconhecida. Eles são inseparáveis da normatividade que inscreve sobre um horizonte de esperança. Eles impõem portanto ao homem uma tarefa infinita. A ilusão é crer que esta idea é objectivamente realizável na história e na política. Pelo contrário, a força da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão era situar os Direitos do homem na luz “nouménale” da ideia que é o principio regulador 33

1 Proudhon P.-J. Cadernos XI, p. 176. Biblioteca Nacional, departamento dos manuscritos.
2 Ibid.
3 Ibid. Ver sobretudo p. 230 ( 20 Março de 1856 ) e p. 404 ( 17 Janeiro de 1858 ) para o desconto dos regicídios.
4 Proudhon P.-J. A Justiça na Revolução e na Igreja, Paris, Garnier, 1858.
5 Proudhon P.-J. Cadernos, ed. M. Rivière, 1960, p. 273.
6 A Justiça… sairá a 22 Abril de 1858, o que prova que apesar da efevercência que precede a publicação, Proudhon procura ainda enriquecer a sua obra de reflexões suscitadas pela actualidade.
7 Proudhon faz aqui mentir Emile Bréchier que na sua História da filosofia considera que não é do homem que seja menos “justo meio”.
8 Lerminier E. Filosofia do direito (1831), p. 18.
9 Proudhon P.-J. Cadernos, op. cit., p. 273.
10 Proudhon P.-J., A Justiça… op. cit., p. 560.
11 Para um exame dos teóricos desenvolvidos por esta escola, nós não saberíamos recomendar bem a obra de Alfred Dufour, Direito do homem, direito natural e história, Paris, Puf, 1991.
12 Proudhon P.-J., A Jutiça… op. cit., p. 559 – Criação espontânea, que vêm não sei de onde, coloca-se não sei como, desenvolve-se sem que a vejamos, e de grau ou de força se faz seguir”.
13 Proudhon P.-J. A Justiça na Revolução e na Igreja, ed. M. Rivière, t. IV, 1935, notas e esclarecimentos do décimo-segundo estudo; p. 485: “Eu continuo à espera da maioria dos franceses, mas eu deconfio das suas oscilações”.
14 Proudhon P.-J. A Justiça… op. cit., p. 568.
15 A Justiça…, p. 565. Assim em Maio de 1855, seguido de um atentado no qual foi vitíma o imperador, Proudhon indignava-se pois a polícia secreta tinha brutalizado o autor do gesto: “Ele defende-se no tirano. Como os conselheiros de Napoleão III não lhe fazem remarcar este sistema de segurança justificada ou (…) os atentados” ( in Cadernos XI, p. 109 ).
16 Proudhon P.-J. A Justiça…, op. cit., p. 565.
17 Ibid.
18 Proudhon P.-J., Notas e esclarecimentos…, op. cit., p. 478.
19 Mariana, A instituição do reino e da rainha (1590).
20 Proudhon P.-J., A Justiça…, op. cit., p. 573.
21 Proudhon P.-J., Cadernos XI, p. 230.
22 Proudhon P.-J., Notas e esclarecimentos…, op. cit., p. 487.
23 Ibid.
24 Ibid. “Cada partido retirara-se sob a sua tentativa, o príncipe e o juíz perdem, pelo facto, de mandato que eles tinham recebido da minoria”.
25 ProudHon P.-J., Napoleão III, Paris, 1900; p. 246-247.
26 Proudhon P.-J., A Justiça, op. cit., p. 568.
27 Ibid., p. 571-572.
28 Ibid.
29 Proudhon P.-J., Napoleão III, 1900, p. 67.
30 Recordemos que a justiça está presente pelo seu autor como “um simples comentário da Declaração dos Direitos do homem e do cidadão, espécie de plano de uma filosofia da revolução “(T.I, p.43).
31 Proudhon P.J. , Napleão III; op. ct., p.25
32 Proudhon P.J., “A justiça …, op. ct., t.I, p. 515: Declaração Robespierre, ameaça de incapacidade”
33 Proudhon P.J. A justiça … t.I, p.516:”Semelhante/garantia nunca deu de pena de desmentido, figurada na constituição”.
34 Goyard-Fabre S. , “ uma filosofia de esperança “. in Revista Direitos (nº8), A declaração de 1789;p. 52 e seguintes.

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