sábado, março 18, 2006

Se o Capitalismo é igual a competição como é que podemos falar em cooperação?

A crescente violência em todos os âmbitos do mundo e da sociedade deve fazer-nos pensar. Mas há um aspecto que é perturbador: a exaltação aberta da violência não poupando sequer o universo do entretenimento infantil.Chegamos a um ponto culminante com a construção do princípio da autodestruição. Por que é que chegamos a este ponto? Seguramente são múltiplas as causalidades estruturais e não podemos ser simplistas neste campo. Mas há uma estrutura, erigida em princípio, que explica em grande parte a atmosfera geral de violência: a competitividade ou a concorrência sem limites.Ela vigora primariamente no campo da economia capitalista de mercado. Comparece como o motor secreto de todo o sistema de produção e consumo. Quem for mais apto, leia-se mais forte, na concorrência quanto aos preços, às facilidades de pagamento, à variedade e à qualidade, vence. A competitividade opera implacável o darwinismo social: selecciona os mais fortes. Estes, diz-se, merecem sobreviver, pois dinamizam a economia. Os mais fracos são peso morto, por isso são incorporados ou eliminados. Essa é a lógica feroz. Essa é a lógica capitalista.A competitividade invadiu praticamente todos os espaços: as nações, as regiões, as escolas, os desportos, as igrejas e as famílias. Para ser eficaz, a competitividade deve ser agressiva. Quem consegue atrair mais e dar mais vantagens? Não é de admirar que tudo passa a ser oportunidade de ganho e se transformou em mercadoria, do electrodoméstico à religião. Os espaços pessoais e sociais que têm valor mas que não têm preço como a gratuidade, a cooperação, a amizade, o amor, a compaixão e a devoção, ficam cada vez mais acantonados. Mas estes são os lugares onde respiramos humanamente, longe do jogo dos interesses. O seu enfraquecimento torna-nos anémicos e nos desumaniza.Na medida em que prevalece sobre outros valores, a competitividade provoca mais e mais tensões, conflitos e violências. Ninguém aceita perder nem ser engolido pelo outro. Luta defendendo-se e atacando. Ocorre que após a derrocada do socialismo chamado de real, com a homogeneização do espaço económico de cunho capitalista, acompanhada pela cultura política neoliberal, privatizada de tudo e de todos, pragmatista e individualista, os dinamismos da concorrência foram levados ao extremo. Em consequência, os conflitos recrudesceram e a vontade de fazer guerra não foi refreada. A potência hegemónica, os Estados Unidos, são campeões em competitividade, usando todos os meios, inclusive armas para sempre triunfar sobre os outros.Como romper esta lógica férrea? Resgatando e dando centralidade àquilo que outrora nos fez dar o salto da animalidade à humanidade. O que nos fez deixar para trás a animalidade foi o princípio de cooperação e de cuidado. Os nossos ancestrais antropóides saíam em busca de alimento. Ao invés de cada qual comer sozinho como os animais, traziam ao grupo e repartiam solidariamente entre si. Daí nasceu a cooperação, a socialidadade e a linguagem. Por este gesto inauguramos a espécie humana. Face aos mais fracos, ao invés de entregá-los à selecção natural, inventamos o cuidado e a compaixão para mantê-los vivos entre nós. Torna-se fundamental a releitura da obra de Kropotkine “Apoio Mútuo” ou como outros preferem traduzir “Entreajuda”.Hoje como outrora são os valores ligados à cooperação, ao cuidado e à compaixão que limitarão a voracidade da concorrência, desarmarão os mecanismos do ódio e darão rosto humano e civilizado à fase planetária da humanidade. Importa começar já agora para que não seja tarde demais.
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=12935

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