A França, por ser um país altamente politizado, transforma em conflitos de rua o que até então era uma discussão apenas entre teóricos: A inserção de uma nação aos padrões da globalização estaria necessariamente condicionada a eliminação das suas leis e garantias trabalhistas?
Uma questão essencial na discussão sobre os rumos do processo de globalização da economia mundial é determinar: Para que uma nação se torne “competitiva” e “inserida” nos mercados globais, terá necessariamente de destruir seus direitos e garantias trabalhistas e precarizar seu mercado de trabalho?
Creio que uma segunda questão, derivada directamente desta, é determinar se essas decisões são políticas, e portanto opcionais ou, pelo contrário, simplesmente não existe outra alternativa. Em outras palavras, o Estado de bem-estar social é simplesmente incompatível com o novo paradigma tecnológico?
As manifestações na França têm o mérito de colocar essa questão finalmente em foco. Pela primeira vez, as questões envolvendo o chamado “desemprego tecnológico”, deixa os debates teóricos entre académicos de instituições como o “Clube de Roma”, por exemplo, para se tornarem temas de debates populares.
Tem também o crédito de levar a discussão sobre os impactos das novas tecnologias de informação e telecomunicações – sempre combinadas com as novas técnicas gerenciais - sobre os mercado de trabalho e as sociedades humanas em geral. Talvez consiga até que esses assuntos cheguem aos folclóricos “Fóruns Sociais” espalhados pelo mundo, dando-lhes finalmente uma utilidade prática além do “turismo político”.
Para tentarmos entender o problema, devemos primeiro nos concentrar em definir o que vem a ser “globalização” na prática. Todos os especialistas nesses assuntos gostam de lembrar que o comércio e o intercâmbio mundial sempre existiram e que era até mais intenso do que agora, antes da primeira guerra mundial. Apenas na “era da informação” esse processo se acelerou enormemente.
Mas o que a maioria não explica, ou o faz de forma muito vaga, é porque esse processo se acelerou de forma tão prodigiosa a partir dos anos 1980? Para muitos, a explicação estaria na “implosão” totalmente pacífica do sistema “rival” do capitalismo, ou seja da URSS.
O problema é que muito antes disso já existia um “clima” francamente favorável ao comércio internacional. As ameaças de uma guerra real já estavam a muito afastadas. Além do mais, tanto a URSS como sua “parceira” ideológica, a China, vinham desenvolvendo políticas desesperadas com vistas a aumentar sua participação no comércio internacional, ao mesmo tempo em que mantinham seus sistemas políticos totalitários.
Como sabemos, a China consegui esse feito e se encaminha já para o segundo posto na economia mundial, com direito aos maiores louvores dos entusiastas da globalização. A URSS não passou no “dever de casa” e acabou por se desintegrar, mas seus antigos componentes adoptaram a religião do “fundamentalismo de mercado”, representada por Milton Friedman e seus seguidores, com o mesmo fervor com que tinham abraçado o marxismo-leninismo.
Então a única explicação para a “aceleração” súbita da globalização está na difusão das novas tecnologias. Por um lado, os computadores e robôs criaram facilidades nunca vistas antes para a “racionalização” do trabalho em qualquer tipo de actividade. De outro, os novos sistemas de telecomunicações, baseados em satélites, puderam “passar por cima” de regiões sem nenhuma infra-estrutura anterior.
A popularização do transporte aéreo também permitiu que países “indigentes” -em ter de infra-estrutura ferroviária e rodoviárias pudessem ser “conectados” ao mercado global. Em resumo, vimos em muitos países, os telefones celulares proliferarem onde não há redes de telefonia fixa e os helicópteros e aviões alcançarem áreas praticamente inacessíveis por automóvel e trem.
A combinação desses factores, aliados as iniciativas de empresários privados, simplesmente “atropelou” os governos nacionais, forçando-os a se “plugar” no mercado global segundo as suas regras, e simplesmente ignorando as leis e costumes locais.
Em outras palavras, o novo paradigma tecnológico, e não conquistas de natureza política, deram imensa vantagem aos empresários capitalistas, que não hesitaram em usar (e abusar) desse novo poder. Por outro lado, todos ficaram expostos a um nível de concorrência e competição antes jamais enfrentado por nenhum deles.
É por isso que as novas tecnologias passaram a ser empregadas com a finalidade obsessiva de “reduzir custos” o que significa, entre outras coisas, “enxugar” os quadros de pessoal e/ou transferir fábricas e escritórios para países com salários os mais baixos possíveis.
Essas são as verdadeiras raízes do “desemprego tecnológico”. E de seus “companheiros inseparáveis”: A prevaricação e a queda da renda dos trabalhadores. Para solucionar esses problemas, qualquer nação isolada é impotente, mesmo as maiores economias do primeiro mundo, como a da França.
Comparemos, por exemplo, duas citações de grandes jornais:
“Se a França quer inverter a tendência, de vinte anos (crescimento pequeno e desemprego elevado) ela deve derrubar as barreiras da legislação do trabalho em todos os sectores e não somente para os menores de 26 anos." (The Wall Street Journal, EUA)
"Quando os estudantes da Sorbonne olham para além [do canal] da Mancha, vêem que a França tem poucas razões de querer copiar nosso milagre económico. E o quanto há a ganhar combatendo nas ruas." (The Guardian, Grã-Bretanha).
Os dois jornais parecem falar de mundos diferentes, e na realidade estão mesmo. Essas duas visões divergentes, na verdade destacam uma contradição insolúvel. O jornal dos EUA fala da economia da França, enquanto o britânico se refere aos trabalhadores da França.
A economia da França está conectada a economia global e, portanto, tem necessidades competitivas que simplesmente não se ajustam às necessidades dos trabalhadores franceses. É por isso que os empresários do Medef (associação patronal), por exemplo, defendem ardilosamente a posição do The Wall Street Journal. Em resumo, para eles, os trabalhadores devem abrir mão de seus “privilégios” de modo a manter a França com uma economia “saudável” e “competitiva”.
Então o problema para os políticos é solucionar a seguinte contradição: Como exigir renúncias e sacrifícios da classe trabalhadora e ao mesmo tempo criar todo tipo de facilidades e atractivos para as classes patronais, exigência básica para uma economia globalizada?
Essa contradição existe no mundo todo, em maior ou menor grau, apenas na França ela esta mais exposta à superfície...
http://lauromonteclaro.sites.uol.com.br/
Uma questão essencial na discussão sobre os rumos do processo de globalização da economia mundial é determinar: Para que uma nação se torne “competitiva” e “inserida” nos mercados globais, terá necessariamente de destruir seus direitos e garantias trabalhistas e precarizar seu mercado de trabalho?
Creio que uma segunda questão, derivada directamente desta, é determinar se essas decisões são políticas, e portanto opcionais ou, pelo contrário, simplesmente não existe outra alternativa. Em outras palavras, o Estado de bem-estar social é simplesmente incompatível com o novo paradigma tecnológico?
As manifestações na França têm o mérito de colocar essa questão finalmente em foco. Pela primeira vez, as questões envolvendo o chamado “desemprego tecnológico”, deixa os debates teóricos entre académicos de instituições como o “Clube de Roma”, por exemplo, para se tornarem temas de debates populares.
Tem também o crédito de levar a discussão sobre os impactos das novas tecnologias de informação e telecomunicações – sempre combinadas com as novas técnicas gerenciais - sobre os mercado de trabalho e as sociedades humanas em geral. Talvez consiga até que esses assuntos cheguem aos folclóricos “Fóruns Sociais” espalhados pelo mundo, dando-lhes finalmente uma utilidade prática além do “turismo político”.
Para tentarmos entender o problema, devemos primeiro nos concentrar em definir o que vem a ser “globalização” na prática. Todos os especialistas nesses assuntos gostam de lembrar que o comércio e o intercâmbio mundial sempre existiram e que era até mais intenso do que agora, antes da primeira guerra mundial. Apenas na “era da informação” esse processo se acelerou enormemente.
Mas o que a maioria não explica, ou o faz de forma muito vaga, é porque esse processo se acelerou de forma tão prodigiosa a partir dos anos 1980? Para muitos, a explicação estaria na “implosão” totalmente pacífica do sistema “rival” do capitalismo, ou seja da URSS.
O problema é que muito antes disso já existia um “clima” francamente favorável ao comércio internacional. As ameaças de uma guerra real já estavam a muito afastadas. Além do mais, tanto a URSS como sua “parceira” ideológica, a China, vinham desenvolvendo políticas desesperadas com vistas a aumentar sua participação no comércio internacional, ao mesmo tempo em que mantinham seus sistemas políticos totalitários.
Como sabemos, a China consegui esse feito e se encaminha já para o segundo posto na economia mundial, com direito aos maiores louvores dos entusiastas da globalização. A URSS não passou no “dever de casa” e acabou por se desintegrar, mas seus antigos componentes adoptaram a religião do “fundamentalismo de mercado”, representada por Milton Friedman e seus seguidores, com o mesmo fervor com que tinham abraçado o marxismo-leninismo.
Então a única explicação para a “aceleração” súbita da globalização está na difusão das novas tecnologias. Por um lado, os computadores e robôs criaram facilidades nunca vistas antes para a “racionalização” do trabalho em qualquer tipo de actividade. De outro, os novos sistemas de telecomunicações, baseados em satélites, puderam “passar por cima” de regiões sem nenhuma infra-estrutura anterior.
A popularização do transporte aéreo também permitiu que países “indigentes” -em ter de infra-estrutura ferroviária e rodoviárias pudessem ser “conectados” ao mercado global. Em resumo, vimos em muitos países, os telefones celulares proliferarem onde não há redes de telefonia fixa e os helicópteros e aviões alcançarem áreas praticamente inacessíveis por automóvel e trem.
A combinação desses factores, aliados as iniciativas de empresários privados, simplesmente “atropelou” os governos nacionais, forçando-os a se “plugar” no mercado global segundo as suas regras, e simplesmente ignorando as leis e costumes locais.
Em outras palavras, o novo paradigma tecnológico, e não conquistas de natureza política, deram imensa vantagem aos empresários capitalistas, que não hesitaram em usar (e abusar) desse novo poder. Por outro lado, todos ficaram expostos a um nível de concorrência e competição antes jamais enfrentado por nenhum deles.
É por isso que as novas tecnologias passaram a ser empregadas com a finalidade obsessiva de “reduzir custos” o que significa, entre outras coisas, “enxugar” os quadros de pessoal e/ou transferir fábricas e escritórios para países com salários os mais baixos possíveis.
Essas são as verdadeiras raízes do “desemprego tecnológico”. E de seus “companheiros inseparáveis”: A prevaricação e a queda da renda dos trabalhadores. Para solucionar esses problemas, qualquer nação isolada é impotente, mesmo as maiores economias do primeiro mundo, como a da França.
Comparemos, por exemplo, duas citações de grandes jornais:
“Se a França quer inverter a tendência, de vinte anos (crescimento pequeno e desemprego elevado) ela deve derrubar as barreiras da legislação do trabalho em todos os sectores e não somente para os menores de 26 anos." (The Wall Street Journal, EUA)
"Quando os estudantes da Sorbonne olham para além [do canal] da Mancha, vêem que a França tem poucas razões de querer copiar nosso milagre económico. E o quanto há a ganhar combatendo nas ruas." (The Guardian, Grã-Bretanha).
Os dois jornais parecem falar de mundos diferentes, e na realidade estão mesmo. Essas duas visões divergentes, na verdade destacam uma contradição insolúvel. O jornal dos EUA fala da economia da França, enquanto o britânico se refere aos trabalhadores da França.
A economia da França está conectada a economia global e, portanto, tem necessidades competitivas que simplesmente não se ajustam às necessidades dos trabalhadores franceses. É por isso que os empresários do Medef (associação patronal), por exemplo, defendem ardilosamente a posição do The Wall Street Journal. Em resumo, para eles, os trabalhadores devem abrir mão de seus “privilégios” de modo a manter a França com uma economia “saudável” e “competitiva”.
Então o problema para os políticos é solucionar a seguinte contradição: Como exigir renúncias e sacrifícios da classe trabalhadora e ao mesmo tempo criar todo tipo de facilidades e atractivos para as classes patronais, exigência básica para uma economia globalizada?
Essa contradição existe no mundo todo, em maior ou menor grau, apenas na França ela esta mais exposta à superfície...
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