terça-feira, junho 27, 2006

Os empresários e a inovação; evidências de um casamento não consumado

Foi, recentemente, efectuado o Estudo IBM Global CEO 2006 para a detecção de grandes tendências para a gestão das empresas de maior gabarito mundial. Para o efeito foram consultados 765 gestores de grandes empresas (incluindo 5 portuguesas) e dele se extraem as seguintes números (aproximados) de referências dos entrevistados às “fontes mais importantes de ideias inovadoras”

Empregados – 45%
Parceiros de negócio – 40%
Clientes – 38%
Consultores – 21%
Concorrentes – 20%
Associações, feiras e conferências – 19%
I&D interno – 19%
Academia – 15%

Uma análise daqueles dados evidencia o papel fulcral dos trabalhadores e dois mitos: o da inovação institucional nascida nas empresas e o papel da universidade na introdução da inovação nas empresas.

De acordo com o estudo, o principal agente inovador referido é o colectivo dos trabalhadores, quem, de facto, conhece os processos técnicos e os circuitos comerciais da empresa e cuja interacção realiza, naturalmente, uma avaliação contínua dos processos e das técnicas utilizadas. Evidencia, em suma, a realidade sociológica e histórica de que somente o trabalho é gerador de valor e factor de progresso.

Porém, muitas vezes essa criatividade não é devidamente aproveitada por incómodo do patronato, incapaz de aceitar que os assalariados possam ser mais reflectidos do que o patrão, porque as ideias são retidas pelas chefias intermédias, temerosas de ser colocadas em causa, ou ainda por práticas inerentes a situações de domínio do mercado. Por outro lado, a extensão da precariedade não incentiva o trabalhador a reflectir, não lhe dá o tempo adequado a essa reflexão, ou a motivar-se na melhoria dos processos, como se tornou habitual no desenvolvimento industrial japonês do passado recente.
Por seu turno, o volume de referências a clientes e concorrentes revela que as empresas têm uma actuação tendencialmente passiva no que respeita à inovação e que esta é mais induzida do exterior, de entidades que possam ameaçar o mercado da empresa.

Os departamentos internos de I&D parecem ter um papel secundário na inovação. Em tempos de contenção de custos, de gestão virada para o curto prazo, para a remuneração abundante e imediata a accionistas voláteis, os grandes executivos não privilegiam os investimentos em inovação, elevados e com um retorno dilatado no tempo. Preferem, pois, aguardar os sinais exteriores para colaborarem na já referida atitude reactiva ou esperar que o investimento público nesse domínio produza efeitos.

Na maioria dos países, o I&D assenta essencialmente em instituições públicas ou financiadas por fundos públicos baseado em investigadores precários e mal pagos e no princípio capitalista da imputação de custos ao Estado e dos proveitos aos capitalistas privados. Em Portugal, concretamente, o I&D privado é ridiculamente irrelevante e mesmo o capital de risco só existe tendo por detrás fundos públicos; o risco dos negócios é sempre mais fácil de suportar se o dinheiro é alheio... Sabe-se também que é volumosa a emigração de investigadores para os países capitalistas avançados.

Finalmente, um outro mito, o da ligação entre as empresas e a universidade no capítulo da I&D que, como se vê pelo estudo, não é uma fonte particularmente importante de inovação. Aliás, historicamente, a universidade foi sempre mais uma fonte de reprodução de conservadorismo do que inovação; Newton, o evolucionismo, o caminho de ferro, entre outros grandes contributos para o conhecimento, passaram muito ao lado dos catedráticos. Até os admiradores do Bill Gates gostam de referir a sua falta de títulos académicos e o nascimento do MS-DOS na garagem do seu (abastado) pai ... com um pecúlio de um milhão de dólares oferecido pelo avô, diga-se em abono da verdade.

Em Portugal, a grande maioria dos docentes não passam de biscateiros que utilizam as aulas para arredondar rendimentos – permitindo baixos custos para as instituições –, que pouco tempo dedicam aos alunos, à preparação das aulas ou à actualização dos próprios conhecimentos, mas que lhes permite acrescentar ao curriculum o epíteto de “professor universitário”. Como poderá a inovação nascer de instituições onde pontificam indivíduos que se dedicam mais a negócios, cargos empresariais ou políticos, a croniquetas regulares na imprensa?

Em suma, embora não seja esse o objectivo do estudo patrocinado pela IBM, o mesmo revela, en passage, algumas características actuais das origens da inovação e do papel do trabalho como fonte de inovação nas empresas, ditas de referência.

Fica evidenciada a escassa dedicação dada pelos grandes executivos e pelo mandarinato à inovação, apesar das declarações sonoras sobre a tecnologia e o progresso. Os chamados gestores de topo mostram­‑se mais vocacionados para as grandes jogadas financeiras e especulativas; para as negociações com os poderes públicos para a obtenção de incentivos, subsídios e favores diversos, para as relações com o mandarinato; para os downsizings e despedimentos em massa; para a auto-concessão de participações em lucros, indemnizações fabulosas e mordomias avulsas; isto é, para os factores estranhos ao funcionamento do mercado.

Qualquer que seja o ângulo que se utilize para encarar o capitalismo, sobressai a má gestão, um progresso insuficiente, a exploração, as desigualdades e o roubo, um roubo imenso.

FAIT-DIVERS – Coisas de “empresários”

Nos últimos tempos, um tal “empresário” Patrick Monteiro de Barros tem-se desdobrado em projectos falhados. Primeiro, foi a American Cup que só serviu para satisfazer a gula de promotores imobiliários na zona de Pedrouços, em Lisboa, à custa dos interesses da pesca. A seguir, pensou ressuscitar o nuclear, tentando aliciar os autarcas de Mogadouro para o projecto, convencido o ricaço cosmopolita que as gentes dali, sendo do interior do país, seriam também estúpidas. Esquerda Desalinhada acreditará na inocuidade da energia nuclear quando os seus promotores se comprometerem (e aos seus descendentes), durante 10.000 anos, a colocar os resíduos radioactivos debaixo da cama.

Finalmente, o prolixo “empresário” lembrou-se de Sines para instalar uma refinaria de petróleo desde que 1200 milhões de euros de dinheiros públicos arcassem com as contrapartidas para as emissões poluentes, ao abrigo do protocolo de Quioto, e cobrissem o benemérito com subsídios e incentivos fiscais. O tonto do Manuel Pinho inicialmente até se entusiasmou com os mundos e fundos prometidos pelo Barros...

Algo em que a capacidade investidora do arguto “empresário” se mostrou particularmente efectiva foi no seu enorme iate cujo preço de estadia em marina é uma pequena fortuna...
V. Lima
http://infoalternativa.org/portugal/port092.htm

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