terça-feira, junho 27, 2006

Haverá alternativas à globalização?

A Globalização é um fenómeno complexo. Resulta de um processo de desregularização que se intensificou nos anos 80-90, com base em progressos fantásticos na informática e na comunicação. Mas resulta também de uma ideologia que, em nome da liberdade, desfaz barreiras que protegem países e economias, transforma toda a actividade humana num extenso mercado, gerando situações graves: desemprego, pobreza, pesadelo alimentar decorrente do desrespeito pelas regras da natureza e da precaução.
Contra esta «globalização», temo-nos habituado a ver afrontamentos de manifestantes contra polícias sofisticadamente armados: Seattle, Washington, Millau, Praga, Davos, Quebeque, Gotemburgo são locais em que reuniões do FMI ou da OMC, do G7 ou do G14, foram perturbados por grandiosas manifestações.
Sob a pressão mediática dos acontecimentos, há um ano, em Berlim, dirigentes sociais-democratas (incluindo Bill Clinton e António Guterres) declararam não ser possível continuar na linha do neoliberalismo, elevado à categoria de pensamento único, proclamando o primado da política sobre a economia, a necessidade de «governar a globalização».
Desde os anos 70, muita gente, incomodada pelo conformismo reinante, lançou-se a criar ONG de âmbito mundial como a Amnistia Internacional, a Médicos Sem Fronteiras, ou o Greenpeace, contra os modelos de desenvolvimento impostos aos países do Sul pelas grandes agências internacionais.
Posteriormente, foram surgindo organizações de cidadãos para resistir ao «pensamento único»: Cientistas Preocupados, Public Citizen (de Ralph Nader), Movimentos de Mulheres, de Consumidores e de Ambientalistas, Aliança para um Mundo Responsável e Solidário, ATTAC, etc. Utilizando a internet, articulam-se em redes a nível mundial, comunicam-se estudos, discutem estratégias, organizam encontros.
Por outro lado, vai-se descobrindo que, por todo o mundo, muita gente resiste ao sistema, criando bancos éticos, espaços sem moeda, comércio equitativo, estabelecendo padrões de conformidade com normas sociais e ambientais, ou tomando outras iniciativas (boicotes da Nike e da Ikea por utilização de trabalho infantil).
Em 1994, surge o Fórum Internacional sobre a Globalização (IFG), a rede das redes da contestação, com sede em S. Francisco. Cada manifestação leva meses a preparar e exige muito dinheiro, que é preciso angariar junto de intelectuais, mas também de Igrejas, fundações, empresas, sindicatos e ministérios.
É possível outra globalização? Na anti globalização encontram-se organizações, redes e movimentos, que declaram trabalhar com vista a uma alternativa:
— Reconquistar o espaço perdido pelas democracias, face à esfera financeira, para a associação ATTAC;
— Criar uma outra globalização, fundada na cultura da cooperação e na ética da solidariedade, na participação activa de todos, no controlo e na gestão dos meios para o seu desenvolvimento pessoal e colectivo (Rede da América Latina de Socio-económica Solidária);
— A gravidade das ameaças, ou a complexidade dos desafios, que somos obrigados a defrontar, devem-nos incitar a resistir e construir novos caminhos, em vez de renunciar e entregar-se ao «sistema» (Aliança para um Mundo Responsável, Plural e Solidário);
A confluência de todos estes movimentos, no meio de grandes contradições, tem hoje expressão pública no Fórum Social Mundial de Porto Alegre e na Assembleia Mundial de Cidadãos a realizar em Lille, em Dezembro próximo. Acabam de ser realizadas Assembleias Continentais da Europa, África, Ásia e América, envolvendo centenas de participantes, numa dinâmica colectiva que se deu como desafio contribuir para a construção de um futuro sustentável e desejável para a Humanidade. Aí serão debatidos os fundamentos éticos comuns para a gestão do nosso planeta e as estratégias de mudança necessárias para, ao longo das próximas décadas, fazer frente aos impasses actuais dos nossos modos de vida, de desenvolvimento e de governação.
A violência não faz parte dos programas anti globalização. Mas é preciso dizer que, não fora ela e continuaria na obscuridade todo o movimento de contestação. Agora, a opinião pública mundial já sabe que existe uma luta anti globalização.

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