Ao vigésimo quinto dia de guerra, as televisões portuguesas passaram a abrir os seus serviços noticiosos com os incêndios domésticos. O Líbano passou para segundo lugar. A guerra cansa. Até na Televisão. Ao vigésimo quinto dia de guerra, Estados Unidos e França receberam o “veto” libanês ao seu draft para uma resolução do conflito em três tempos – cessação incompleta de hostilidades; acordo político; e colocação de uma Força Multinacional no terreno com retirada israelita para as suas fronteiras. No dia seguinte, a Liga Árabe solidarizou‑se com Beirute e o embaixador francês, para desgosto de G. W. Bush, admite ser necessário levar em conta «as diferentes opiniões».
Ao vigésimo quinto dia de guerra, o número de mortos ultrapassa o milhar no Líbano, e aproxima-se da centena em Israel. Os feridos triplicam e quadriplicam os mortos. No Líbano, Israel declara ter atingido 4 mil e seiscentos alvos por via aérea, a que se somam os edifícios arrasados por artilharia e bulldozers nas aldeias e vilas de fronteira. No Líbano, o tempo recuou mesmo vinte ou trinta anos.
Ao vigésimo quinto dia de guerra, e para surpresa geral, o mais poderoso exército da região continua sem atingir um só dos objectivos que, sucessivamente, se propôs. O que declara ter “limpo” num dia, “ressuscita” no seguinte como plataforma de resistência. Cem a duzentos rockets continuam, diariamente, a castigar aldeias e cidades israelitas. Na sua errância, alguns atingem bairros residenciais da minoria árabe.
Ao vigésimo quinto dia de guerra, o slogan “we will win”, que o sionismo armado proclama em Telavive, é patético. Em Beirute, o preço da resistência é trágico. «Esperando a vitória, não sobrará uma só casa», diz‑me pessoa amiga, de Tiro, uma das que fugiu, com a família, ao sexto dia de confrontos. Ela não acha que o Hezzbollah deva desistir. Mas porque coordena em Beirute brigadas de apoio móvel, sabe que o drama humanitário se faz de nomes e rostos e sofrimento. Ela está doente de guerra. O seu povo também.
Finalmente, ao vigésimo quinto dia de guerra, outra ocupa apenas as notas de rodapé dos jornais e televisões. Decorre em Gaza e na Cisjordânia, onde tudo começou e onde tudo terá de acabar... se algum dia a Paz puder regressar ao Próximo e Médio Oriente.
É, aliás, por aqui que deve começar a análise do projecto de Resolução que se discute em Nova Iorque. Sobre o conflito israelo-palestiniano, nem uma linha. Não envolve Gaza nem a Cisjordânia onde, há mês e meio, decorre uma ofensiva israelita sem precedentes nos últimos anos.
Admitamos, contudo, que o óptimo é inimigo do bom. Sucede que o projecto de resolução é “esquisito”. Reflecte as distintas prioridades da França e dos Estados Unidos, mas não a urgência libanesa.
França e Estados Unidos concordaram em desentender-se – nem fim imediato da guerra, nem Força Multinacional que se substitua ao Tsahal. E concordaram em remeter a política e o Líbano para mais tarde. Eis o que para Beirute e a Liga Árabe não é aceitável.
Não é preciso ser-se “pró-árabe” para se perceber que o “cessar das hostilidades” ou é para os dois, ou é para nenhum. Quando a Israel apenas se interditam «as operações militares ofensivas de grande amplitude», isso deixa, evidentemente, toda a “amplitude” para a continuação da guerra.
E também não é preciso ser-se “pró-Hezzbollah” para se perceber que não há modo de cessar as hostilidades sem que Israel regresse às suas fronteiras. Só nessas circunstâncias se pode pedir aos capacetes azuis, como o projecto paradoxalmente recomenda, que apoiem a ajuda humanitária e criem as condições para o retorno dos desalojados. Isto enquanto se negoceia uma segunda resolução.
No momento em que escrevo, não se conhecem ainda as conclusões do Conselho de Segurança. Mas estúpida será uma resolução que nada resolva; como criminosa é uma agressão que, ainda por cima, se faz em nome de um objectivo impossível de impor de fora – o desarmamento do Hezzbollah. Mas, acima de tudo, é inaceitável o preço do sofrimento imposto às populações quando se sabe que nenhuma guerra resolveu fosse que conflito fosse no Médio Oriente dos últimos 60 anos. Apenas semearam vontades para a guerra seguinte.
Miguel Portas
http://infoalternativa.org/moriente/mo062.htm
Ao vigésimo quinto dia de guerra, o número de mortos ultrapassa o milhar no Líbano, e aproxima-se da centena em Israel. Os feridos triplicam e quadriplicam os mortos. No Líbano, Israel declara ter atingido 4 mil e seiscentos alvos por via aérea, a que se somam os edifícios arrasados por artilharia e bulldozers nas aldeias e vilas de fronteira. No Líbano, o tempo recuou mesmo vinte ou trinta anos.
Ao vigésimo quinto dia de guerra, e para surpresa geral, o mais poderoso exército da região continua sem atingir um só dos objectivos que, sucessivamente, se propôs. O que declara ter “limpo” num dia, “ressuscita” no seguinte como plataforma de resistência. Cem a duzentos rockets continuam, diariamente, a castigar aldeias e cidades israelitas. Na sua errância, alguns atingem bairros residenciais da minoria árabe.
Ao vigésimo quinto dia de guerra, o slogan “we will win”, que o sionismo armado proclama em Telavive, é patético. Em Beirute, o preço da resistência é trágico. «Esperando a vitória, não sobrará uma só casa», diz‑me pessoa amiga, de Tiro, uma das que fugiu, com a família, ao sexto dia de confrontos. Ela não acha que o Hezzbollah deva desistir. Mas porque coordena em Beirute brigadas de apoio móvel, sabe que o drama humanitário se faz de nomes e rostos e sofrimento. Ela está doente de guerra. O seu povo também.
Finalmente, ao vigésimo quinto dia de guerra, outra ocupa apenas as notas de rodapé dos jornais e televisões. Decorre em Gaza e na Cisjordânia, onde tudo começou e onde tudo terá de acabar... se algum dia a Paz puder regressar ao Próximo e Médio Oriente.
É, aliás, por aqui que deve começar a análise do projecto de Resolução que se discute em Nova Iorque. Sobre o conflito israelo-palestiniano, nem uma linha. Não envolve Gaza nem a Cisjordânia onde, há mês e meio, decorre uma ofensiva israelita sem precedentes nos últimos anos.
Admitamos, contudo, que o óptimo é inimigo do bom. Sucede que o projecto de resolução é “esquisito”. Reflecte as distintas prioridades da França e dos Estados Unidos, mas não a urgência libanesa.
França e Estados Unidos concordaram em desentender-se – nem fim imediato da guerra, nem Força Multinacional que se substitua ao Tsahal. E concordaram em remeter a política e o Líbano para mais tarde. Eis o que para Beirute e a Liga Árabe não é aceitável.
Não é preciso ser-se “pró-árabe” para se perceber que o “cessar das hostilidades” ou é para os dois, ou é para nenhum. Quando a Israel apenas se interditam «as operações militares ofensivas de grande amplitude», isso deixa, evidentemente, toda a “amplitude” para a continuação da guerra.
E também não é preciso ser-se “pró-Hezzbollah” para se perceber que não há modo de cessar as hostilidades sem que Israel regresse às suas fronteiras. Só nessas circunstâncias se pode pedir aos capacetes azuis, como o projecto paradoxalmente recomenda, que apoiem a ajuda humanitária e criem as condições para o retorno dos desalojados. Isto enquanto se negoceia uma segunda resolução.
No momento em que escrevo, não se conhecem ainda as conclusões do Conselho de Segurança. Mas estúpida será uma resolução que nada resolva; como criminosa é uma agressão que, ainda por cima, se faz em nome de um objectivo impossível de impor de fora – o desarmamento do Hezzbollah. Mas, acima de tudo, é inaceitável o preço do sofrimento imposto às populações quando se sabe que nenhuma guerra resolveu fosse que conflito fosse no Médio Oriente dos últimos 60 anos. Apenas semearam vontades para a guerra seguinte.
Miguel Portas
http://infoalternativa.org/moriente/mo062.htm
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