A diplomacia norte-americana tem-se empenhado por todos os meios em contrariar as pressões para que Israel interrompa a agressão ao Líbano. Depois de atirar a pedra, procura esconder a mão, destinando verbas para assistir às populações deslocadas. Com a mão direita, faz o possível para manter activas as causas da catástrofe humanitária, ou seja, a agressão israelita. Com a mão esquerda, distribui umas migalhas caritativas às vítimas que todos os dias se tornam mais numerosas.
Neste contexto, nada mais hipócrita do que a expressão “corredor humanitário”. Ele deve, supostamente, servir para que as populações civis libanesas possam pôr-se a salvo dos bombardeamentos israelitas. Na verdade, é um “corredor” que serve para essas populações deixarem as suas casas e terras.
Assim começou também, em 1948, a “Naqba”, palavra árabe para “catástrofe”: populações horrorizadas com a sorte dos aldeões degolados na aldeia de Deir Yassin fugiram para se salvarem. Desse movimento resultaram na altura uns 700.000 refugiados e um cortejo de problemas que, até hoje, nunca mais se resolveram. Convém atentar agora nos números que estimativas prudentes indicam para a população deslocada por estas duas semanas de combates no Líbano: entre 500 e 700.000 pessoas – uma catástrofe portanto de envergadura comparável à de 1948.
Irá essa “deslocação” tornar-se permanente como a limpeza étnica de 1948? Poderá objectar-se que a comparação só vale para os números e que é, em tudo o mais, abusiva. Poderá dizer-se que na Palestina as forças sionistas tinham um projecto de colonização e que no Líbano não o têm. Quando a guerra se resolver, de uma forma ou de outra, dir-se-á ainda, os refugiados libaneses poderão voltar às suas casas ou ao que delas restar. E talvez um outro “corredor humanitário” seja destinado a facilitar o regresso como agora está feito para facilitar a fuga.
É possível que todas ou algumas destas especulações venham a ser validadas pelos factos. Mas, para já, o que existe é a realidade da limpeza étnica. O Tsahal (Forças Armadas israelitas) fomentam-na com a mesma combinação de três medidas terroristas que os seus antecessores usaram em 1948:
– destruição de famílias inteiras, para mostrar o que está disposto a fazer;
– destruição de fábricas, centrais eléctricas e outras infra‑estruturas, para tornar a vida inviável;
– advertências radiodifundidas para que os civis abandonem a região, sob pena de serem alvejados.
Face a esta realidade, o desenvolvimento mais provável não é aquele que as almas piedosas querem antecipar. Bem pelo contrário: a impotência dos bombardeamentos aéreos para silenciarem os “katiuschas” do Hezzbolah cria um poderoso factor de pressão a favor da invasão. Esta, uma vez realizada, será utilizada para argumentar a favor da criação de uma distância de segurança que coloque as cidades israelitas fora do alcance dos “katiuschas”. Mas uma terra-de-ninguém é sempre um convite à colonização e esta é o golpe de misericórdia sobre as expectativas de regresso dos desalojados.
Dir-se-á que outras invasões israelitas tiveram desenvolvimentos diferentes e que não é forçoso tudo se encadear desta forma. Mas a diferença, quando houve diferença, resultou sempre de contrariedades militares sofridas pelo sionismo. A guerra de Yom Kippur, em 1973, fez fracassar os planos de colonização do Sinai – mas eles existiram, embora o Sinai fosse território egípcio e portanto não pertencente à Palestina histórica. A guerrilha do Hezzbolah obrigou à retirada israelita do Sul do Líbano em 2000, mas a colonização ficou onde pôde – nas quintas de Sheba, que são território sírio, também exterior à Palestina.
Onde a situação se encontra militarmente controlada pelas forças israelitas, a dinâmica expansionista tem sido sempre a que descrevemos. Hoje, a expansão dos colonatos na Cisjordânia não resulta geralmente da criação de novas unidades e sim do alargamento das antigas: são demolidas casas da população palestiniana na vizinhança de um colonato, para não servirem de base a “ataques terroristas”. Uma vez demolidas as casas, o colonato expande-se para onde elas estavam. Desse modo, avança para a proximidade de novas construções árabes e passa a ser vizinho delas. E torna-se necessária mais uma demolição, torna-se possível mais uma expansão.
A única forma de impedir no Sul do Líbano uma limpeza étnica que dure seis décadas, tantas como já têm durado a “Naqba” de 1948 e as suas consequências, é derrotar militarmente as tropas israelitas. Uma campanha internacional de solidariedade com os combatentes e com as populações libanesas, para obrigar a um imediato cessar-fogo, sem quaisquer condições, será uma contribuição para a derrota do expansionismo sionista.
António Louçã
http://infoalternativa.org/moriente/mo053.htm
Neste contexto, nada mais hipócrita do que a expressão “corredor humanitário”. Ele deve, supostamente, servir para que as populações civis libanesas possam pôr-se a salvo dos bombardeamentos israelitas. Na verdade, é um “corredor” que serve para essas populações deixarem as suas casas e terras.
Assim começou também, em 1948, a “Naqba”, palavra árabe para “catástrofe”: populações horrorizadas com a sorte dos aldeões degolados na aldeia de Deir Yassin fugiram para se salvarem. Desse movimento resultaram na altura uns 700.000 refugiados e um cortejo de problemas que, até hoje, nunca mais se resolveram. Convém atentar agora nos números que estimativas prudentes indicam para a população deslocada por estas duas semanas de combates no Líbano: entre 500 e 700.000 pessoas – uma catástrofe portanto de envergadura comparável à de 1948.
Irá essa “deslocação” tornar-se permanente como a limpeza étnica de 1948? Poderá objectar-se que a comparação só vale para os números e que é, em tudo o mais, abusiva. Poderá dizer-se que na Palestina as forças sionistas tinham um projecto de colonização e que no Líbano não o têm. Quando a guerra se resolver, de uma forma ou de outra, dir-se-á ainda, os refugiados libaneses poderão voltar às suas casas ou ao que delas restar. E talvez um outro “corredor humanitário” seja destinado a facilitar o regresso como agora está feito para facilitar a fuga.
É possível que todas ou algumas destas especulações venham a ser validadas pelos factos. Mas, para já, o que existe é a realidade da limpeza étnica. O Tsahal (Forças Armadas israelitas) fomentam-na com a mesma combinação de três medidas terroristas que os seus antecessores usaram em 1948:
– destruição de famílias inteiras, para mostrar o que está disposto a fazer;
– destruição de fábricas, centrais eléctricas e outras infra‑estruturas, para tornar a vida inviável;
– advertências radiodifundidas para que os civis abandonem a região, sob pena de serem alvejados.
Face a esta realidade, o desenvolvimento mais provável não é aquele que as almas piedosas querem antecipar. Bem pelo contrário: a impotência dos bombardeamentos aéreos para silenciarem os “katiuschas” do Hezzbolah cria um poderoso factor de pressão a favor da invasão. Esta, uma vez realizada, será utilizada para argumentar a favor da criação de uma distância de segurança que coloque as cidades israelitas fora do alcance dos “katiuschas”. Mas uma terra-de-ninguém é sempre um convite à colonização e esta é o golpe de misericórdia sobre as expectativas de regresso dos desalojados.
Dir-se-á que outras invasões israelitas tiveram desenvolvimentos diferentes e que não é forçoso tudo se encadear desta forma. Mas a diferença, quando houve diferença, resultou sempre de contrariedades militares sofridas pelo sionismo. A guerra de Yom Kippur, em 1973, fez fracassar os planos de colonização do Sinai – mas eles existiram, embora o Sinai fosse território egípcio e portanto não pertencente à Palestina histórica. A guerrilha do Hezzbolah obrigou à retirada israelita do Sul do Líbano em 2000, mas a colonização ficou onde pôde – nas quintas de Sheba, que são território sírio, também exterior à Palestina.
Onde a situação se encontra militarmente controlada pelas forças israelitas, a dinâmica expansionista tem sido sempre a que descrevemos. Hoje, a expansão dos colonatos na Cisjordânia não resulta geralmente da criação de novas unidades e sim do alargamento das antigas: são demolidas casas da população palestiniana na vizinhança de um colonato, para não servirem de base a “ataques terroristas”. Uma vez demolidas as casas, o colonato expande-se para onde elas estavam. Desse modo, avança para a proximidade de novas construções árabes e passa a ser vizinho delas. E torna-se necessária mais uma demolição, torna-se possível mais uma expansão.
A única forma de impedir no Sul do Líbano uma limpeza étnica que dure seis décadas, tantas como já têm durado a “Naqba” de 1948 e as suas consequências, é derrotar militarmente as tropas israelitas. Uma campanha internacional de solidariedade com os combatentes e com as populações libanesas, para obrigar a um imediato cessar-fogo, sem quaisquer condições, será uma contribuição para a derrota do expansionismo sionista.
António Louçã
http://infoalternativa.org/moriente/mo053.htm
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