sexta-feira, setembro 22, 2006

Jihad não significa Guerra

A propósito das declarações de Benedito XVI

Quando o Papa Benedicto XVI afirmou que «A violência da Jihad no Islão contrasta com a natureza de Deus e da alma», muito provavelmente tinha caído no tema sem saber que Jihad, esse conceito fundamental do Islão, não significa nem Guerra, nem Santa, mas o esforço ou combate, e o seu sentido é “esforço na senda de Deus”. O termo que a religião maometana utiliza para a guerra é Harb. Fiel à ideia da “religião” que provém de religare – “atar duas vezes” o crente, individual e socialmente –, o Islão determina dois tipos de Jihad: a “grande Jihad” que faz referência à luta espiritual diária dos fiéis, ao treinarem a alma para controlar os instintos básicos e para o aperfeiçoamento interno, e a “Jihad menor” que não é outra que a defesa dos territórios do Islão, dos seus habitantes e do próprio Islão perante os perigos externos. Neste sentido, a Jihad legitima todo o tipo de acções e contendas. Há outras acepções de Jihad mais mundanas, como aquela que se empreendeu no Irão da era de Khomeini, ao formar­em‑se várias brigadas chamadas Jihad sazandegui, “a batalha pela reconstrução”, cuja missão era levar água, luz e serviços básicos a milhares de aldeias desatendidas, ou a Jihad contra o analfabetismo.
Para além da necessidade de cuidar da precisão no uso da linguagem, sobretudo a tão alto nível, como o do líder da Igreja católica, além de cuidar do tacto, há que ser justo no momento de valorizar os factos históricos. Pois, não há que esquecer que embora seja verdadeiro que a religião maometana é utilizada por parte de alguns para empreender acções violentas, não é menos verdadeiro que a religião cristã foi utilizada por parte de, por exemplo, George Bush para empreender as duas últimas guerras – a do Afeganistão e a do Iraque –, que deixaram dezenas de milhares de mortos inocentes pelo caminho. Se não fosse pelo facto de o presidente norte-americano ter identificado a “guerra contra o terrorismo” com uma “cruzada”, e um choque entre o cristianismo e o Islão, não teria podido contar com o voto e o apoio de milhões de cristãos evangélicos, montar campos de concentração e extermínio como Guantánamo.
Poucas vezes como nas últimas três décadas os deuses foram invocados para justificar interesses político­‑económicos. “Terra prometida”, “Povo eleito”, “Destino manifesto” ou “O bem contra o mal” serviram para manipular as convicções mais íntimas dos crentes.
Segundo todas as perspectivas, parece que enquanto lá se precisa de um Erasmo de Roterdão para separar a religião do poder político, aqui estamos a ser testemunhas de como a sua herança está a ser deitada a perder de forma subtil e progressiva.
Cui bono? “A quem beneficia”, pergunta do direito romano, que se apresenta como a ferramenta imprescindível para compreender como a nova Cruzada ou Guerra Santa só tornaram felizes as multinacionais de armas.
Que os líderes religiosos de lá e de cá em vez de se entreterem e nos entreterem em guerras religiosas, se preocupem com os graves problemas da humanidade, como a pobreza “terrorista” e obscena que inunda milhares de milhões de pessoas cristãs, muçulmanas ou budistas!
E que de uma vez por todas deixem em paz os deuses!
Nazanín Amirian
http://www.infoalternativa.org/cultura/cultura024.htm

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