segunda-feira, outubro 09, 2006

O livro de Saladino

Livro de Tariq Ali, segundo da série Quinteto Islâmico [1], conta a vida do chefe militar de origem curda, Saladino, a par dos acontecimentos históricos que culminaram na tomada de Jerusalém em 1187, após a longa ocupação cristã.

«Estou a dizer apenas que somos criaturas que têm um destino e as nossas vidas dependem da época em que vivemos. As nossas biografias são escritas pelos factos.» (Tariq Ali)

Um livro repleto de personagens históricos. A vida do chefe militar de origem curda, Salah al Din ibn Ayub, conhecido no ocidente como Saladino, é contada a par dos acontecimentos históricos que culminaram na tomada de Jerusalém em 2 de Outubro de 1187, após uma longa ocupação pelos cristãos.

A sua habilidade diplomática conjugada com o uso estratégico da força imortalizou o génio militar na história do islamismo e consagrou­‑o como o herói de um ciclo de lendas que percorreram todo o Médio Oriente e o Ocidente.

A sua devoção à causa da jihad era inabalável e alicerçou o objectivo de reconquistar a cidade dominada pelos cristãos. A percepção das divisões entre os muçulmanos e das traições fez com que Saladino, antes de libertar Jerusalém, unificasse a Grande Síria e o Egipto, eliminando o sectarismo sunita/xiita e a rivalidade que tanto ajudou os europeus.

«O meu pai tinha­‑me ensinado que dois exércitos, com dois comandos diferentes, jamais poderiam coexistir por muito tempo. Mais cedo ou mais tarde, por Alá, um deles vencerá.»

Nos depoimentos de Saladino ao escriba, encontramos ensinamentos profundos que desnudam o homem, as políticas e as religiões.

«Tudo isso me ensina que os homens só lutam por uma causa maior do que os seus próprios interesses quando estão convencidos de que ela trará benefícios para todos.»

O personagem judeu, o grande médico-filósofo Maimónides (Ibn Maimum), retratado enquanto conselheiro e médico do vizir al-Fadil e como autor do Guia dos Perplexos, é fundamental para a compreensão do período das cruzadas, da valorização dos filósofos e escribas, do valor de uma biblioteca e da convivência entre judeus e muçulmanos no período, principalmente depois da cruel chacina dos habitantes muçulmanos e judeus, perpetrada pelos cristãos, «adoradores de estátuas», em 1099, na conquista de Jerusalém.

Ao contrário das barbáries cometidas pelos cavaleiros fanatizados pela Igreja Medieval, Saladino marcou a vitória muçulmana com um comportamento civilizado e cortês. Com rara sensibilidade, soube angariar o respeito e a afeição do seu povo com hábitos simples, sem a ostentação característica de muitos sultões.

«Para merecer o respeito do povo, e em particular dos nossos soldados, aprendi que devemos acostumar­‑nos a comer e a vestir­‑nos como eles. Nós fazemos as leis, Farruk Xá. Devemos segui-las e dar o exemplo... Nunca esqueça que um homem é aquilo que faz.»

Tariq Ali presenteia-nos com a história enredada numa ficção envolvente, marcada com fortes personagens, como o narrador judeu Ibn Yakub, responsável por escrever as memórias de Saladino, o ancião Xadi, as mulheres do Sultão, Hamila e Jamila, os eunucos, enfim, todos os preciosos tipos criados pelo escritor que contextualizam a história do grande líder curdo Saladino, o conhecimento do filósofo Maimónides, e trazem à tona a cultura islâmica, o seu desenvolvimento e as suas fragmentações, com uma perspectiva fiel aos acontecimentos relevantes.

Saladino fundou a dinastia aiúbida, que governou até 1260. Contudo, após a sua morte em 1193, a unidade acabou, os seus sucessores aiúbidas discutiam entre si e a Síria partiu-se em pequenas dinastias. Ainda assim, o período aiúbida consagrou-se pelas actividades culturais que transformaram o Egipto e a Síria em grandes centros de erudição e literatura árabe.

[1] Sobre o primeiro da séria Quinteto Islâmico, ler Helena Sut, As sombras da romãzeira, carta Maior, 15/09/2006.
Helena Sut


http://www.infoalternativa.org/cultura/livro016.htm

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