segunda-feira, outubro 09, 2006

Um novo estado do mundo

Sintomas: a política conduzida por Washington e pelos seus aliados através da “guerra ao terrorismo” exacerba de tal modo os conflitos que a Organização das Nações Unidas, que deveria regular as relações internacionais, tem dificuldades em pôr de pé a força de interposição no Líbano; por seu lado, o Irão lança um desafio ao Conselho de Segurança, convidando-o para “negociações sérias” sobre o nuclear. O mundo torna-se cada dia mais incerto. Emergem novos actores, nomeadamente na Ásia, e várias questões tornam-se mais prementes: injustiça social, pobreza, fluxos migratórios, comércio, ambiente. Parece operar-se uma viragem naquilo a que se chama globalização.

Cinco anos depois dos atentados de 11 de Setembro, as recentes hostilidades em Gaza e no Líbano – trágicas chamas estivais no mais velho conflito do planeta – testemunham, ao seu modo, várias características do novo estado do mundo.

Deduzidos deste contexto, e em jeito de esboço cartográfico para ajudar a guiar-nos pelos labirintos da actualidade, eis aqui, em quatro observações gerais e dez breves considerações, alguns modestos elementos que poderão servir de orientação.

PRIMEIRA OBSERVAÇÃO GERAL

O fenómeno central da nossa época – a globalização económica – não parece ter pesado, directamente, nestes confrontos médio-orientais. Nem para os atiçar, nem para os apaziguar.

Isto confirmaria dois postulados: o carácter arcaico desta guerra em que se misturam, como no século XIX, disputas territoriais, crispações nacionalistas e paixões religiosas; e o erro da ideologia liberal ao acreditar que o simples crescimento das trocas é gerador de paz.

SEGUNDA OBSERVAÇÃO GERAL

O facto de, mais uma vez, o Médio Oriente ser o alvo das atenções da comunicação social não deve fazer minimamente esquecer a importância estratégica da Ásia, onde em grande parte se joga o destino do século XXI. Isto devido ao crescente peso dos dois gigantes – a Índia e a China –, e ainda pelo facto de não serem ali negligenciáveis os perigos de confronto entre a China e Taiwan, entre a Coreia do Norte e o Japão, entre a Índia e o Paquistão…

Não é também de negligenciar a África Subsariana, onde, como numa panela de pressão, se acumulam problemas de todos os tipos – entre os quais o da miséria extrema e o dos migrantes clandestinos –, que acabarão por explodir em cima dos países ricos.

TERCEIRA OBSERVAÇÃO GERAL

A guerra nuclear volta a ser uma das duas maiores ameaças que pesam sobre o mundo (sendo a outra a catástrofe ecológica). Israel, que durante os recentes combates teve dificuldade em impor-se claramente através de meios militares convencionais, possui a arma suprema. Mas não aderiu ao Tratado de Não Proliferação Nuclear, à semelhança de dois outros Estados nucleares rivais: o Paquistão e a Índia. Não longe deste teatro, três potências atómicas estão militarmente mobilizadas e sofrem vários dissabores. São elas os Estados Unidos, o Reino Unido e a Rússia (as duas primeiras no Iraque e no Afeganistão, a terceira na Tchetchénia). Além disso, a mais importante aliança militar, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – à qual pertence a França, ela própria uma potência atómica – combate também no Afeganistão.

É certo que existem noutros lugares perigos de choques nucleares – na península coreana e no estreito de Taiwan [1] –, mas a zona que vai das fronteiras ocidentais da Índia até ao canal de Suez concentra o arsenal mais devastador de todos os tempos. Com excepção da China, todas as grandes potências estão militarmente activas nessa zona. Uma simples faúlha pode causar a deflagração… É por isso que a gestão das crises que ali se sucedem requer competências de que só a Organização das Nações Unidas (ONU) detém a chave. No entanto, tal como acaba de ser demonstrado no Líbano, na sua configuração actual a ONU permanece simultaneamente indispensável e desesperadamente impotente face aos grandes contenciosos contemporâneos. Quanto à União Europeia, fortalecida pela sua longa história de desastres guerreiros, ela constituiria o melhor dos mediadores… se não continuasse a ser um anão político.

QUARTA OBSERVAÇÃO GERAL

Para compreender as estratégias que estão hoje em acção, convém distinguir correctamente os três tabuleiros em que se joga o nosso futuro: – o militar, no qual dominam os Estados-nações, condicionados pelo factor territorial e por ciclos eleitorais curtos (o que os torna poucos aptos à abordagem dos problemas de longo prazo e planetários); os Estados Unidos têm neste campo uma completa supremacia, bem como uma completa vontade de impor um mundo unipolar; – o económico e comercial, no qual funcionam as lógicas da globalização definidas pelo Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio (OMC)…; neste campo reinam as sociedades privadas e os interesses financeiros, numa multiplicação das trocas que deixa entrever a perspectiva de um mundo multipolar; – o ecológico e social, no qual se acumulam três níveis de problemas – o do ambiente (alterações climáticas, efeito de estufa, poluição, desflorestação, água potável, biodiversidade); o da necessidade de novas regras internacionais (para lutar contra a injustiça da ordem mundial, para gerir as migrações, a utilização de organismos geneticamente modificados, a propriedade intelectual, a investigação genética, a evasão fiscal, as delinquências modernas); e o do destino das populações da Terra (África, pandemias, miséria, fractura digital, megapolis, fome, educação, trabalho, catástrofes naturais) –; neste campo predominam os pobres, as desordens, as desgraças e o caos.

As articulações entre estes três tabuleiros são aleatórias. Muitas vezes são evidentes, por vezes são inexistentes, em certos casos são enigmáticas.

Para além destas observações gerais, podem ser retiradas algumas considerações prudentes do recente choque no Médio Oriente.

PRIMEIRA CONSIDERAÇÃO

Este novo incêndio traz consigo uma confirmação de tipo geopolítico: esta região ocupa efectivamente, desde a Guerra do Golfo de 1991, o epicentro do actual “foco perturbador” mundial. Desde 1914 e até ao fim da Guerra Fria, este foco situava-se na Europa, mas doravante engloba uma área geográfica onde o islão é a religião dominante e onde estão localizados, do Paquistão ao Egipto, a maioria dos grandes confrontos: Caxemira, Afeganistão, Tchetchénia, Cáucaso, Curdistão, Iraque, Líbano, Palestina, Somália, Darfur…

Esta zona acumula também fortes tensões internacionais: diferendo entre o Paquistão e a Índia a propósito da Caxemira, ameaças ao Irão (suspeito de querer ter armas nucleares), pressões da Rússia na Transcaucásia, receios da Turquia a propósito do Curdistão iraquiano, numerosos litígios pelo controlo da água doce, cobiças suscitadas pela existência – no centro de um vasto triângulo formado pelo Golfo, pelo Irão e pelo mar Negro – das principais reservas de hidrocarbonetos.

SEGUNDA CONSIDERAÇÃO

É indiscutível que Israel tem o direito de se defender, mas a desmesura das punições infligidas aos civis palestinianos e libaneses apenas traduz, paradoxalmente, uma espécie de impotência louca. E isto por um simples motivo, que começa a ser compreendido pelos próprios americanos e que o antigo presidente Bill Clinton exprime da seguinte forma: «Nós não podemos matar todos os nossos inimigos [2]»… E Israel tem uma legião deles na região.

Numa guerra assimétrica, uma esmagadora superioridade militar não garante de modo algum a vitória. Os Estados Unidos voltam a passar por essa amarga experiência: «Temo bem que o Iraque venha a tornar­‑se o nosso pior desastre desde o Vietname», afirma apreensiva a antiga secretária de Estado Madeleine Albright [3].

Enquanto a paz – única garantia da segurança de Israel – não for alcançada, recorrer a um militarismo excessivo não torna mais próxima uma solução política. E a paz passa sempre por negociações com o inimigo.

TERCEIRA CONSIDERAÇÃO

A frente mediática parece hoje mais decisiva do que nunca, mas o contexto da informação metamorfoseou­‑se. O bombardeamento intensivo por parte de Israel de centrais eléctricas, de ligações telefónicas e de estações de televisão (a Al-Manar, em particular [4]), destinado a tornar cego, surdo e mudo o sistema de comunicação do adversário, revelou-se ineficaz.

Os telemóveis, as câmaras miniaturizadas e os blogues de combatentes ou de testemunhas oculares permitem doravante uma difusão global quase instantânea de imagens denunciadoras. Por muito intensos que sejam, os bombardeamentos não podem destruir as malhas da Internet, concebidas para resistirem ao fogo nuclear. Mais uma vez, os israelitas parecem não ter tirado a lição das desventuras americanas no Iraque depois da difusão das cenas de Abu Ghraib e de outros testemunhos aterradores. Nem do colapso da imagem dos Estados Unidos aos olhos da opinião pública mundial [5].

QUARTA CONSIDERAÇÃO

A democracia, que Washington parece querer instaurar por todo o lado [6], não constitui nesta região, de forma alguma, um escudo contra os ataques de Israel (ele próprio um Estado democrático…). Instada pelos palestinianos – únicos cidadãos árabes do Médio Oriente, a par dos libaneses, que votaram democraticamente (em Janeiro de 2006, elegendo o Hamas) – a cumprir a sua palavra, a administração Bush fechou os olhos, deixou massacrar (maus) democratas e deixou prender os seus eleitos em Gaza. «Uma operação que mata cinco insurrectos é contraproducente se os seus efeitos colaterais levarem ao recrutamento de cinquenta novos rebeldes», recorda William Pfaff [7]. Os excessos acabam por criar aquilo a que Mao Zedong chamava «o mar em que nadam os combatentes da guerrilha».

Tal como acontece na Palestina ou no Líbano, o islamismo radical está em expansão em todo o chamado “foco perturbador”. Nas suas diversas componentes, e apesar de todas as reservas que pode inspirar, ele constitui a principal força política que se opõe pelas armas ao domínio dos Estados Unidos. Enquanto ideologia messiânica por cujo sucesso futuro os militantes são dispostos a sacrificar a vida, o islamismo radical ocupa, em parte, o lugar que foi, por exemplo nos séculos XIX e XX, do anarquismo ou do comunismo. Ainda que esta comparação possa chocar…

Numa altura em que a violência política está em recuo noutras paragens [8], a corrente salafita vai de vento em popa no Afeganistão – onde os talibãs regressam e as forças da OTAN estão na defensiva –, na Somália, no Iraque, na Palestina e no Líbano.

QUINTA CONSIDERAÇÃO

O poder das organizações não estatais não cessa de aumentar, e em particular o das organizações não governamentais de carácter humanitário, ecológico, social ou jurídico. Estas organizações são muitas vezes instrumentalizadas e nem sempre são desinteressadas. Contudo, no centro do “foco perturbador” pululam especialmente as organizações não estatais armadas, que desempenham um papel determinante nos múltiplos antagonismos. É disso testemunha o audacioso ataque de surpresa do braço armado do Hamas em Gaza, a 25 de Junho, e o das milícias do Hezbollah no Líbano, a 12 de Julho, que provocaram a resposta de Israel.

Note-se que algures nesta zona se situa o quartel general do “inimigo público n.º 1” dos Estados Unidos, a organização islamita armada Al-Qaeda, dirigida por Osama Bin Laden, que reivindicou os atentados de 11 de Setembro de 2001 e contra a qual Washington desencadeou a actual “guerra infinita contra o terrorismo internacional”.

SEXTA CONSIDERAÇÃO

Estes acontecimentos de 11 de Setembro fizeram-nos, efectivamente, entrar numa nova era. O presidente americano George W. Bush e o círculo que o rodeia calcularam que o pavor colectivo causado por esta estratégia lhes dava finalmente carta branca para porem em prática velhos delírios geopolíticos.

Recordemos três desses delírios: a reivindicação do papel “imperial” dos Estados Unidos na condução dos assuntos do mundo; a assimilação de qualquer luta de resistência nacional (entre as quais as do Hamas e do Hezbollah) ao “terrorismo”; e a atribuição de prioridade à vigilância generalizada dos cidadãos, em detrimento das liberdades destes.

Em nome deste corpo doutrinal, a Central Intelligence Agency (CIA) e outros serviços de informações foram autorizados a “liquidar” suspeitos ou a raptá-los por toda a parte, a fim de os conduzirem a prisões secretas. A despeito das Convenções de Genebra, e fora de qualquer quadro jurídico, foi criada a prisão de forçados de Guantanamo, destinada a encarcerar e maltratar pessoas suspeitas de ligações com a Al-Qaeda…

O Iraque, que não estava de todo implicado nos atentados de 11 de Setembro e não possuía qualquer “arma de destruição em massa”, foi invadido com base em mentiras (na realidade, para deitar a mão ao petróleo). Num arrebatamento wilsoniano, Washington declarou-se pronto a redesenhar o “Grande Médio Oriente”. Nada menos.

É sabido o que resultou destas absurdas ambições. O mundo está hoje mais perigoso. Não é improvável um novo mega­‑atentado. Quanto à temível máquina militar, ela lá está atolada no Iraque, apanhada numa guerra assimétrica perdida, reduzida a praticar ou a cobrir atrocidades (saques a civis, massacres, torturas sistemáticas [9]) que dizia ter banido desde o descalabro do Vietname [10].

A derrota política é ainda mais siderante. Por graça das intervenções americanas, o Irão, principal inimigo regional dos Estados Unidos, viu-se desembaraçado dos seus rivais fronteiriços: o regime dos talibãs no Afeganistão e o de Saddam Hussein no Iraque [11]. E a partir de agora Teerão arma-se para se defender. Por outro lado, enquanto Washington se fixou nesta região, os seus velhos adversários na América Latina – as suas próprias traseiras – aproveitaram a situação para tomar democraticamente o poder: na Venezuela, no Brasil, na Argentina, no Uruguai, no Chile, no Panamá, na República Dominicana, na Bolívia… Uma inédita maré rosa ou vermelha que, ainda por cima, veio naturalmente fortalecer Cuba.

Ao longo destes anos, Bush acreditou que poderia reduzir os problemas do mundo apenas ao terrorismo e tratar o terrorismo exclusivamente através da repressão militar. Enganou-se. Espezinhou tantos princípios e violou tantos direitos que Noam Chomsky fala mesmo da «administração mais perigosa da história americana», não hesitando em qualificar o seu país como o «principal Estado terrorista [12]» do planeta.

SÉTIMA CONSIDERAÇÃO

A guerra do Iraque é muito cara. Em 2005, as despesas militares dos Estados Unidos atingiram os 500 mil milhões de dólares [13], ou seja, tanto quanto as do resto do mundo. É imenso. Sobretudo quando, em consequência da globalização, o seu sistema económico já não assenta apenas na sua capacidade manufactureira, mas igualmente no consumo. A América actua como uma bomba de finanças, importando capital ao ritmo de 700 a 800 mil milhões de dólares por ano, capital este que financia o consumo de bens importados.

Uma tal bombagem do dinheiro mundial disponível cria uma situação insustentável. O défice comercial americano pesa nas finanças internacionais, podendo conduzir a um abaixamento do dólar, a um aumento das taxas de juro, a uma queda das Bolsas [14] e a uma recessão mundial. É um dos principais problemas (invisível) de hoje.

OITAVA CONSIDERAÇÃO

Avaliado em perto de 700 mil milhões de dólares, o défice americano beneficia os países de mão­‑de­‑obra barata. À frente destes encontra-se a China [15], mas são também beneficiados outros países emergentes (Índia, Coreia do Sul, Taiwan, Brasil e México) cuja expansão económica começa a preocupar as potências dominantes. Tanto mais que as cotações das matérias-primas (entre as quais as do petróleo) estão ao rubro, para grande proveito da Rússia, do Cazaquistão, da Venezuela, do Chile, da Argélia…

A concorrência das empresas destes países torna-se mais ameaçadora. Existem já umas vinte e cinco multinacionais globais nos Estados do Sul, e em breve serão uma centena. Vão multiplicar-se ofertas de compra espectaculares, como a da chinesa National Offshore Oil sobre a petrolífera americana Unocal (que foi rejeitada) ou a da indiana Mittal Steel sobre a siderúrgica europeia Arcelor (esta concretizada) [16].

Pode, em consequência, apostar-se que a globalização se aproxima de um fim de ciclo. Aproveitando o movimento dado pelo impulso inicial, ela poderá ameaçar o domínio das velhas potências de sempre. Não é, portanto, de excluir um novo período de proteccionismo.

NONA CONSIDERAÇÃO

Os combates entre Israel e o Líbano deram lugar à deslocação forçada de cerca de 1,2 milhões de pessoas (900.000 libaneses e 300.000 israelitas). Deslocações desta dimensão por causa da guerra continuam a ser pontuais. Em contrapartida, as migrações internacionais de mão-de-obra são estruturais e atingem 175 milhões de pessoas. Isto porque o crescimento económico, quando existe, pode criar riqueza – por causa dos ganhos de produtividade –, mas já não empregos suficientes. Mesmo a China, que beneficia de taxas de crescimento de mais de 9 por cento, só cria cerca de 10 milhões de empregos por ano, isto é, duas vezes menos do que o número de pessoas que entra no mercado de trabalho [17]…

Os outros têm que se resignar à pobreza, ou então emigrar. Mas clandestinamente, porque «a economia de mercado», constata o historiador Eric Hobsbawm, «favorece a livre circulação de todos os meios de produção, com excepção da mão-de-obra, que em grande medida permanece sob controlo do Estado [18]». Coortes de pessoas, muitas vezes jovens e de boa saúde, tentam penetrar, arriscando as suas próprias vidas – vimo­‑lo em Melilla, vemo-lo nas Canárias –, nos raros ilhéus de prosperidade do planeta. Mais de 20 milhões destas pessoas conseguiram fazê-lo nos Estados Unidos [19], onde, tal como na Europa, a questão dos sem-papéis passou a ser tratada em termos de segurança nacional. No entanto, a bomba da imigração ilegal ainda não rebentou. Este grande drama humano vai pôr à prova, de forma penosa, todas as sociedades desenvolvidas.

DÉCIMA CONSIDERAÇÃO

A 14 de Julho de 2006, a aviação israelita bombardeou os reservatórios de fuel da central eléctrica de Jiyyeh, a sul de Beirute. Foram derramadas no mar perto de 15.000 toneladas de fuelóleo. No início de Agosto, a maré negra chegou a um terço das praias libanesas, atingindo a costa síria e ameaçando o Chipre, a Síria, a Turquia, a Grécia… e Israel [20].

Esta catástrofe ecológica, “efeito colateral” das hostilidades, faz recordar que os problemas ligados ao ambiente vão tornar-se altamente estratégicos. Na Cimeira do G8 em Gleneagles, em Julho de 2005, a luta contra o aquecimento do planeta tinha já sido um dos temas da reunião. Com alguns graus a mais, em média, a Terra não continuará a ser a mesma. A subida do nível dos mares trará consigo catástrofes inéditas. Impõe­‑se fazer correcções drásticas, enquanto se aproxima o momento em que, para responder à procura, já não se poderá extrair suficientes hidrocarbonetos – cujo consumo agrava o efeito de estufa.

No quadro deste breve panorama do novo estado do mundo, estas questões – os alertas sobre o clima e o fim da era do petróleo – anunciam-se como dois dos desafios fundamentais que a humanidade pode assumir.

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[1] A 15 de Julho de 2005, o general chinês Zhu Chenghu, responsável pelo Instituto da Defesa Nacional de Pequim, não excluiu que a China pudesse proceder a um ataque nuclear contra os Estados Unidos se os seus interesses em relação a Taiwan estivessem ameaçados. Cf. Martine Bulard, “A China agita a ordem mundial”, Le Monde diplomatique – edição portuguesa, Agosto de 2005.
[2] Le Monde, 10 de Agosto de 2005.
[3] Newsweek, Nova Iorque, 24 de Julho de 2006.
[4] Canal do Hezbollah xiita libanês.
[5] International Herald Tribune, Paris, 14 de Junho de 2006.
[6] Em nome do postulado, caro aos neoconservadores, de que as democracias não se guerreiam entre si. Isso suporia que Israel coexistiria pacificamente com uma Palestina democrática. Contudo, Telavive acaba de demonstrar o contrário. E os factos provam que Washington aceita as piores “autocracias amigas” (Egipto, Arábia Saudita, Jordânia, Azerbaijão, Paquistão), nunca qualificadas como “bastiões avançados da tirania”, mas que lançam nos braços das organizações islamitas radicais as suas populações, empobrecidas, reprimidas e esgotadas pela corrupção.
[7] Le Monde, 19 de Julho de 2006.
[8] O relatório “Guerra e Paz no século XXI”, publicado pelo Human Security Center da Universidade da Colômbia Britânica em Vancouver (Canadá), assinala uma redução do número de conflitos desde o fim da Guerra Fria. Na União Europeia, as duas organizações mais mortíferas – o Exército Republicano Irlandês (IRA) e a Euskadi ta Askatasuna (ETA) basca – decidiram abandonar a luta armada. O IRA ordenou aos seus militantes, a 28 de Julho de 2005, que «depusessem as armas», e a ETA anunciou, a 22 de Março de 2006, um «cessar­‑fogo permanente».
[9] Um relatório da associação Human Rights Watch considera que «a tortura dos prisioneiros no Iraque foi autorizada pelo exército americano» – Le Monde, 25 de Julho de 2006.
[10] O Los Angeles Times revelou, a 6 de Agosto de 2006, que as atrocidades cometidas pelos americanos no Vietname foram mais numerosas do que se pensava.
[11] Cf. Joe Klein, “The Iran Factor”, Time, Nova Iorque, 24 de Julho de 2006.
[12] Le Point, Paris, 20 de Julho de 2006.
[13] Os Estados Unidos só atribuíram à ajuda ao desenvolvimento 18 mil milhões de dólares, ou seja, 0,16 por cento do produto interno bruto (PIB)!
[14] A 21 de Maio de 2006, o simples receio de ver os bancos centrais aumentarem as taxas de juro causou uma queda espectacular das principais Bolsas por todo o mundo.
[15] Em 2005, as exportações dos Estados Unidos para a China atingiram os 47,8 mil milhões de dólares, enquanto as importações deste país ascenderam a 201,6 mil milhões, o que corresponde a uma vantagem de 153,8 mil milhões para Pequim, que além disso detém 320 mil milhões de títulos do Tesouro americano.
[16] Cf. Capital, Paris, de Agosto de 2006.
[17] Le Figaro, Paris, 20 de Junho de 2006.
[18] L’Express, Paris, 8 de Junho de 2006.
[19] International Herald Tribune, Paris, 29 de Junho de 2006.
[20] Cf. Caroline Pailhe, “Israël, Palestine, Liban. Le chemin le plus long vers la paix”, Groupe de recherche et d’information sur la paix et la sécurité (GRIP), Bruxelas, 8 de Agosto de 2006.

Ignacio Ramonet
http://infoalternativa.org/autores/ramonet/ramonet096.htm

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