quinta-feira, novembro 02, 2006

Venezuela e China – Rumo a um mundo multipolar

A Venezuela actualmente está a tentar romper as cadeias de ferro dos Estados Unidos e das corporações multinacionais que continuam a desempenhar um papel dominante na sua economia. O objectivo a longo prazo é criar um sistema internacional alternativo que promova o desenvolvimento social além do lucro, promova a soberania produtiva e a cooperação bilateral além das exigências de vistas curtas das finanças internacional. A fim de mudar o equilíbrio global de poder e alimentar o desenvolvimento económico da Venezuela no interesse do seu próprio povo, Chavez procura forjar fortes ligações internacionais com outros países em desenvolvimento para assegurar o capital, tecnologia e perícia tradicionalmente fornecidos pelas corporações multinacionais e instituições que ele procura neutralizar. O crescente relacionamento estratégico da Venezuela com a China é apenas um exemplo desta tendência emergente. Movendo-se nesta direcção, a China e a Venezuela anunciaram recentemente a assinatura de pelo menos oito grandes acordos destinados a desenvolver laços mais fortes na energia e na economia. Num valor de aproximadamente US$ 11 mil milhões, cobrem um certo número de questões estratégicas incluindo o acesso ao petróleo, à banca e ao transporte. Em termos de energia, a China investirá cerca de US$ 2 mil milhões na indústria petrolífera da Venezuela através da criação de uma joint venture chinesa-venezuelana, segundo a Bloomberg News. Esta nova entidade explorará as reservas de petróleo não aproveitadas da região de Zumano e da cintura petrolífera do Orinoco. Zumano tem reservas da ordem dos 400 milhões de barris de petróleo light e 4 milhões de milhões (trillion) de pés cúbico de gás natural. A PDVSA, companhia petrolífera estatal da Venezuela, possuirá a maioria do capital nesta joint venture. Os dois países também formarão uma joint venture para explorar e certificar uma porção das reservas de petróleo pesado não aproveitadas da Venezuela, as quais Chavez diz que podem conter um 235 mil milhões de barris adicionais. O objectivo explícito deste empreendimento é elevar as importações chinesas de petróleo venezuelano para 500 mil barris/dia em cinco anos, uma subida em relação aos actuais 150 mil barris/dia importados pela China. Este relacionamento é benéfico para a China, que procura uma fonte estável e abundante de petróleo para atender ao disparo das suas necessidades internas. O trato também está de acordo com os melhores interesses da Venezuela pois esta procura diversificar suas exportações de petróleo, afastando-se da sua dependência em relação ao mercado dos EUA, os quais actualmente compram aproximadamente 3/4 das suas exportações diárias de 2 milhões de barris. Ainda mais importante, este novo empreendimento conjunto permitirá à Venezuela fazer investimentos dolorosamente necessários na sua indústria petrolífera. Este investimentos necessários mas extremamente caros em tecnologica, na infraestrutura e na exploração de novos, não aproveitados, campos de petróleo pesado serão conduzidos sem recurso à perícia e ao apoio financeiro de companhias de petróleo privadas, as quais estão cada vez mais avessas a fazer investimentos a longo prazo no contexto da crescente intervenção estatal. Além disso, os chineses estão numa posição perfeita para ajudar a Venezuela a explorar as suas difíceis reservas não aproveitadas devido à sua experiência na 'recuperação de petróleo aprimorada de campos mais antigos, já com uma longa vida, segundo Gavin Thompson, consultor de energia da firma Wood Mackenzie. Os acordos bilaterais assinados pelos governos chinês e venezuelano têm implicações de grande alcance que vão além da indústria petrolífera. Além dos US$ 2 mil milhões reservados para investimento em energia o governo chinês comprometeu uns US$ 9 mil milhões na construção do sistema ferroviário da Venezuela, um plano de infraestrutura ligado intrinsecamente aos ambiciosos objectivos do governo venezuelano de substituir importações e promover o rápido desenvolvimento industrial interno. Os carris com aço de alto teor necessários à execução deste plano serão produzidos estrategicamente numa instalação industrial de propriedade do estado chamada Cidade do Aço . Localizada no estado de Bolivar, a capital do ferro e do aço da Venezuela, a Cidade do Aço conterá um certo número de instalações industriais estratégicas que um dia compreenderão o "núcleo" do "sector transformativo" da economia, segundo o governo. Incluída na Cidade do Aço haverá uma fábrica moderna de concentração de minério de ferro, a qual processará o minério para utilizar na produção de aço. Cerca de US$ 350 milhões foram reservados para esta fábrica, cuja concepção e construção estão actualmente a ser supervisionadas por firmas da Espanha e do Canadá. Toda a fábrica será pronta no fim de 2007, mas primeira fase está em vias de ser acabada em 1 de Novembro de 2006 – antes das próxima eleição presidencial. Além da fábrica de concentração do minério de ferro, o governo planeia construir uma siderurgia, uma fábrica de tubos sem costura e a fábrica de carris. A siderurgia será destinada a substituir importações e não competirá com produtores internos. A fábrica de tubos sem costura abastecerá a indústria de gás natural e petróleo com os materiais necessários aos seus planos de expansão, os quais estão intrinsecamente ligados ao empreendimento conjunto venezuelano-chinês acima mencionado. A fabrica de carris estará voltada para as necessidades do planeado sistema ferroviário nacional, o qual, como foi mencionado, está a ser financiado em parte com os US$ 9 mil milhões de investimento directo do governo chinês. Além de financiarem o projecto, os chineses estão numa posição forte para contribuírem com a sua própria perícia técnica e experiência prática no desenvolvimento de redes ferroviárias extensas. Organizados como Empresas de Produção Social, cada um destes negócios estará sujeito à co-administração operária e modos menos hierárquicos de organização interna. O governo estima que a Cidade do Aço gerara uns 2770 empregos directos e outros 8310 empregos indirectos e acabará por custar mais de US$ 2 mil milhões. Estas empresas estatais na Cidade do Aço constituirão uma parte essencial da política do governo venezuelano de "desenvolvimento endógeno", a qual procura alcançar "soberania produtiva" através da promoção da substituição de importações e do desenvolvimento da indústria interna. Segundo Victor Alvarez, antigo ministro venezuelano das Indústrias Básicas e Minas, "o objectivo é que não importemos nem um grama de alumínio ou um quilograma de madeira", acrescentando: "Em 2012... deveríamos estar a processar 100 por cento dos nossos materiais primários, dos nossos produtos básicos neste país". Em acréscimo aos acordos já analisados, a China e a Venezuela estão em conversações para criar um mecanismo permanente para outra assistência bilateral ao desenvolvimento na forma de um "fundo estratégico de cooperação bilateral". Este fundo seria concebido para contornar a influência de instituições financeiras americanas e europeias e seria semelhante ao fundo conjunto de US$ 2 mil milhões de dólares criado recentemente pelo Irão e a Venezuela. Ao contrário das afirmações dos seus críticos, a visão de Chavez do "desenvolvimento endógeno" não é de anti-globalização ou de isolamento internacional. Ao invés disso, como demonstrado pelo desenvolvimento das suas relações coma China e outros países, o modelo venezuelano rejeita o papel tradicional do capital financeiro ocidental e do poder das corporações multinacionais a fim de promover uma nova ordem internacional fundada sobre os princípios da cooperação bilateral, da assistência mútua, da soberania produtiva e do desenvolvimento social.
Michael Locker e Dave Hancock
http://resistir.info/

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