A intervenção militar dos Estados Unidos, nas suas diversas formas, é um dos mecanismos do imperialismo, que tem como objetivos a apropriação de recursos estratégicos, o controle territorial, a exploração da força de trabalho, a expansão do modelo económico neoliberal.
Isso verifica‑se em todos os casos de intervenção militar promovidos pelo Pentágono, seja na América Latina, onde os principais focos actualmente são Colômbia, Haiti e Paraguai, ou em outras regiões, como no Médio Oriente.
A estratégia militar do governo estadunidense inclui implementação de bases militares, treinamentos e presença de tropas em território estrangeiro, investimentos em tecnologias de monitoramento, espionagem e projectos de infra-estrutura. Esta estratégia está baseada em diversos pilares, desde a intervenção directa até campanhas de propaganda e difamação, passando por processos das chamadas “guerras de baixa intensidade”, que promovem a opressão e estimulam a violência contra populações de baixa renda, urbanas e rurais.
A militarização serve também para garantir o lucro de grandes transnacionais. Além de beneficiar empresas de armamentos, que tiveram um crescimento de 60% nas suas vendas de 2000 a 2004, a “indústria da guerra” movimenta cerca de 100 mil milhões de dólares por ano em projectos de infra-estrutura, assistência técnica, consultoria, treinamento, planeamento estratégico, análise operacional, logística e serviços de segurança, vigilância e inteligência. O processo de privatização dos serviços militares tem‑se intensificado nas últimas décadas. Desde 1994, o Departamento de Defesa dos EUA firmou mais de 3.000 contratos com empresas de guerra, que ultrapassam o valor de US$ 300 mil milhões.
Os EUA mantêm bases militares (725 bases oficiais e outras secretas) em todos os continentes, com excepção da Antárctica. Esse aparato é fundamental para a indústria naquele país, que fornece desde armamentos até roupas, comida e os mais variados serviços para os soldados. Por exemplo, com o início da guerra no Iraque foram encomendados 273 mil frascos de protector solar de uma empresa na Flórida chamada Sun Fun Products (Produtos Solares Divertidos).
Existem cerca de 500 mil soldados, espiões, técnicos, professores e assessores a serviço do Pentágono e da CIA trabalhando para os Estados Unidos em outros países. Em Abril de 2006, o governo estadunidense reforçou a actuação das tropas de elite do Comando de Operações Especiais (cuja sigla em inglês é Socom) para cerca de 20 países no Médio Oriente, África e América Latina. O número de funcionários deste departamento subiu de 40 mil para 53 mil. Desde 2003, o orçamento para o Socom aumentou 60% e deve chegar a US$ 8 mil milhões em 2007. Segundo o jornal The Washington Post, estas missões incluem recolher informações para o planeamento de eventuais acções militares em países onde não há guerra ou conflito directo.
Na América Latina, um dos principais focos destas tropas é a Tríplice Fronteira, entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina. A estratégia nesta região combina campanhas de propaganda sobre suposta “ameaça terrorista”, com a presença de militares estadunidenses, favorecida pelo acordo militar bilateral dos Estados Unidos com o Paraguai. Na tentativa de envolver o Brasil e a Argentina na sua estratégia, em Julho de 2006, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma resolução pedindo que o presidente Bush formasse uma força-tarefa para actuar contra o «terrorismo no Hemisfério Ocidental, especialmente na Tríplice Fronteira».
O Congresso propõe ainda que os Estados Unidos pressionem os países membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) para que classifiquem o Hezbollah e o Hamas como organizações terroristas. A resolução visa principalmente fazer com que o governo brasileiro mude a sua política externa, que tradicionalmente não aceita o conceito de “organizações terroristas”, mas somente de “actos terroristas”.
O embaixador do Brasil nos EUA, Roberto Abdenur, manifestou «profundo desconforto» com a resolução e declarou que mesmo a «Casa Branca reconhece não haver actividades de terrorismo operativo na região». O prefeito da cidade fronteiriça de Foz do Iguaçu, Paulo Ghisi, afirmou «não aceitar mais essa discriminação». O presidente do Centro Cultural Islâmico em Foz do Iguaçu, Zaki Moussa, conclui: «Eles querem a região, não os árabes. Todo mundo sabe a importância geopolítica da Tríplice Fronteira, inclusive pela concentração de água doce».
O exemplo da Tríplice Fronteira mostra a relação de uma estratégia militar com o controle de recursos estratégicos. No Paraguai, as elites locais apoiam acções militares e paramilitares, principalmente em áreas onde as organizações camponesas estão mais organizadas. O objectivo é expulsar os camponeses das suas terras para abrir espaço para o latifúndio, principalmente para a produção de soja. Portanto, a região combina interesses estratégicos dos estados Unidos na América do Sul, com a manutenção do poder das oligarquias rurais.
O imperialismo norte-americano serve tanto aos interesses das elites estrangeiras, quanto das elites locais. Por isso, depende da subserviência dos governos de países periféricos e também da cumplicidade de países centrais, como os da União Europeia. Por sua vez, as principais lutas de resistência contra o imperialismo também combinam estratégias de acção locais e articulação internacional.
Em oposição ao processo de militarização no Continente, foi criada a Campanha pela Desmilitarização das Américas (CADA). Além de monitorar a presença militar dos Estados Unidos na América Latina, a CADA tem contribuído na articulação de lutas populares contra o imperialismo.
As principais propostas da CADA são:
– Denunciar a dominação militar dos EUA na América Latina e suas consequências, como as violações de direitos humanos, a destruição ambiental e a perda da soberania e da autodeterminação dos povos.
– Coordenar acções solidárias e simultâneas, realizar mobilizações, investigações e acções jurídicas contra o aparato militar dos EUA e em defesa dos direitos humanos.
– Apoiar os movimentos sociais em cada país, que lutam por sua terra, sua cultura, seu trabalho e sua dignidade.
– A construção de um modelo económico baseado na justiça social e na solidariedade entre os povos.
– A construção de uma alternativa igualitária e sustentável para a integração latino-americana.
Intensas lutas de resistência, combinando mobilização local com solidariedade internacional, lograram interromper operações militares em Vieques, Porto Rico. Um plebiscito popular obteve mais de 10 milhões de votos no Brasil, impedindo o controle da base de Alcântara pelos Estados Unidos. Na Costa Rica, um forte movimento popular impediu a presença da Academia para o Cumprimento da Lei (uma versão da Escola das Américas para policiais latino-americanos). Um forte movimento de oposição na Argentina impediu a realização de uma operação de treinamento liderada por militares estadunidenses para países latino‑americanos, chamada Águilas III.
Em todo o Continente, desde o México, com as lutas populares em Chiapas e Oaxaca, até à mobilização de povos indígenas no Brasil, que ocuparam recentemente a Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores mineradoras do mundo, reflectem o repúdio pelas políticas de dominação económica e militar. Em 2007, movimentos sociais brasileiros organizarão um plebiscito popular pela estatização da Companhia Vale do Rio Doce, privatizada em 1997 através de um leilão fraudulento.
A recuperação de fontes de recursos estratégicos é fundamental. Na Bolívia, a forte oposição à política de privatização da água e do gás natural causou a renúncia de dois presidentes e culminou na eleição de Evo Morales, que garantiu também maior participação do Estado sobre a actuação de empresas petroleiras no país. Na Venezuela, a retomada do controle da PDVSA pelo presidente Hugo Chávez foi essencial para a continuidade da revolução bolivariana.
E, mais recentemente, o povo equatoriano elegeu o presidente Rafael Correa, que declarou o seu compromisso de não renovar o acordo que permite que os EUA utilizem a base de Manta. Esta iniciativa foi saudada por uma rede de organizações equatorianas que tem realizado diversas acções de mobilização contra a base. «Está comprovado que as principais actividades dos militares estadunidenses são o controle migratório, o trabalho de vigilância e o apoio logístico ao exército colombiano. Por outro lado, a militarização do porto de Manta tem provocado a expulsão de camponeses e pescadores, os quais estão impedidos de trabalhar», afirma a nota divulgada pela Coalizão No Bases, do Equador.
Em Março de 2007, o Equador será a sede da Conferência Mundial pela Abolição de Bases Militares Estrangeiras, o que torna a decisão de Rafael Correia ainda mais significativa. O presidente eleito teve também o apoio dos movimentos sociais equatorianos pelo seu compromisso de não firmar o Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos.
Na luta contra o imperialismo é importante unir estratégias de acção contra agentes que promovem uma política económica articulada com a militar. Um deles é o Banco Mundial, que funciona como uma espécie de “cérebro”, elaborando conceitos incorporados por outras instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Comércio (OMC). A liderança do Banco Mundial torna ainda mais evidente a relação entre estratégias económicas e militares. O seu actual presidente, Paul Wolfowitz, foi vice-secretário de Defesa dos EUA. O presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (braço do Banco Mundial para a América Latina) é Luiz Alberto Moreno, ex-embaixador da Colômbia em Washington e idealizador do Plano Colômbia.
No livro Confissões de um sicário económico [1], John Perkins, revela que «desde a II Guerra Mundial, os sicários económicos construíram o primeiro império verdadeiramente global. Isso foi feito principalmente por meios económicos, não militares», explica. Os sicários económicos são especialistas em identificar países onde existam recursos estratégicos, adquirir empréstimos do Banco Mundial ou do FMI e, a partir do endividamento destes países, fazer chantagem para conseguir contratos destes governos com empresas estadunidenses para mega‑projectos como usinas de energia, estradas, portos, etc. Algumas das empresas citadas no livro são Bechtel, Halliburton, Stone and Webster, Brown and Root, Nike, Monsanto, General Electric, e Chas T. Main, onde Perkins trabalhou.
Perkins cita ainda a actuação desses agentes em organizar oposição social a governos contrários aos interesses dos EUA. No caso dos sabotadores falharem, agentes chamados de “chacais” são utilizados para derrubar ou assassinar governantes. Ele revela que os chacais foram enviados à Venezuela em 2002 para articular o golpe contra o presidente Chávez.
Há também uma relação estreita entre a política externa dos Estados Unidos e os interesses de empresas de comunicação. Corporações de outra natureza (bancos, empresas bélicas, etc.) têm controle accionário de grandes meios de comunicação. Por exemplo, a General Electric (que produz desde lâmpadas até material bélico e nuclear) controla a RCA e a rede de TV NBC.
O governo dos Estados Unidos investe pesadamente nos sectores de comunicação do Pentágono, da Casa Branca e do Departamento de Estado, que possuem milhares de funcionários. Desde a I Guerra Mundial, os Estados Unidos desenvolveram um sistema de comunicação intimamente ligado aos seus interesses militares. Aliás, uma das principais funções das rádios, na sua origem, foi orientar e entreter soldados nos campos de batalha. Desde então, foram desenvolvidos mecanismos cada vez mais sofisticados de dominação ideológica através da mídia comercial.
A mídia não influencia somente a opinião pública, mas actua principalmente estabelecendo uma agenda política. Isso significa estabelecer “o que” o público deve pensar, mas também “sobre o que” devemos pensar. A repetição de ideias e o contexto dado a determinados factos têm efeitos poderosos. As guerras promovidas pelos EUA não seriam possíveis sem o apoio da mídia.
Um conceito amplamente difundido, que garantiu apoio da sociedade estadunidense a uma série de invasões militares foi a ideia de “intervenções humanitárias” ou “guerras preventivas”, como ocorreu no Panamá, Somália, Haiti, Bósnia, Colômbia, Afeganistão e até mesmo nas duas guerras contra o Iraque, onde soldados norte‑americanos pensavam que a sua missão era “libertar” aquele país. Essas intervenções serviram para garantir controle territorial, recursos naturais, políticas económicas neoliberais e de “livre mercado”, mas tinham como pretexto assegurar a “estabilidade”, a “democracia” e a “segurança” naqueles países.
Esse discurso esconde as atrocidades cometidas pelo exército e por forças paramilitares financiadas pelos EUA em todo o mundo. Sob o discurso dos governantes estadunidenses, que pregam a “democracia” e a “justiça”, uma parte da sociedade alimenta um sentimento de superioridade. Outra parte sofre directamente com leis que, especialmente depois dos ataques de 11 de Setembro, restringem direitos civis e políticos, principalmente dos imigrantes. Portanto, a manutenção do império americano depende da ignorância e da opressão da sua própria população.
Na década de 80, quando a América Central vivia um duro processo de enfrentamento contra o imperialismo e muitas organizações estadunidenses buscavam prestar solidariedade às lutas revolucionárias na região, já havia um entendimento de que a melhor forma de se solidarizar com uma revolução é estimular essas lutas no seu próprio país.
O nosso Continente tem sido palco de muita luta e não nos faltam exemplos a seguir. Em toda a América Latina estão a ocorrer mobilizações que reflectem o repúdio popular às políticas de dominação económica e militar dos Estados Unidos e dos seus aliados. Hoje mesmo, cada um/uma de nós está em processo de luta e sabemos o que fazer. A cada dia surgem novas formas de resistência, a partir da sabedoria popular. Como diz o povo de Oaxaca, «La Victoria no es de los poderosos sino de los mejor organizados».
[1] Sobre este livro, ler Pedro Campos, Confissões sinistras (I), Avante!, 07/12/2005 (n. IA).
Maria Luisa Mendonça
ALAI
http://www.infoalternativa.org/amlatina/amlatina028.htm
Isso verifica‑se em todos os casos de intervenção militar promovidos pelo Pentágono, seja na América Latina, onde os principais focos actualmente são Colômbia, Haiti e Paraguai, ou em outras regiões, como no Médio Oriente.
A estratégia militar do governo estadunidense inclui implementação de bases militares, treinamentos e presença de tropas em território estrangeiro, investimentos em tecnologias de monitoramento, espionagem e projectos de infra-estrutura. Esta estratégia está baseada em diversos pilares, desde a intervenção directa até campanhas de propaganda e difamação, passando por processos das chamadas “guerras de baixa intensidade”, que promovem a opressão e estimulam a violência contra populações de baixa renda, urbanas e rurais.
A militarização serve também para garantir o lucro de grandes transnacionais. Além de beneficiar empresas de armamentos, que tiveram um crescimento de 60% nas suas vendas de 2000 a 2004, a “indústria da guerra” movimenta cerca de 100 mil milhões de dólares por ano em projectos de infra-estrutura, assistência técnica, consultoria, treinamento, planeamento estratégico, análise operacional, logística e serviços de segurança, vigilância e inteligência. O processo de privatização dos serviços militares tem‑se intensificado nas últimas décadas. Desde 1994, o Departamento de Defesa dos EUA firmou mais de 3.000 contratos com empresas de guerra, que ultrapassam o valor de US$ 300 mil milhões.
Os EUA mantêm bases militares (725 bases oficiais e outras secretas) em todos os continentes, com excepção da Antárctica. Esse aparato é fundamental para a indústria naquele país, que fornece desde armamentos até roupas, comida e os mais variados serviços para os soldados. Por exemplo, com o início da guerra no Iraque foram encomendados 273 mil frascos de protector solar de uma empresa na Flórida chamada Sun Fun Products (Produtos Solares Divertidos).
Existem cerca de 500 mil soldados, espiões, técnicos, professores e assessores a serviço do Pentágono e da CIA trabalhando para os Estados Unidos em outros países. Em Abril de 2006, o governo estadunidense reforçou a actuação das tropas de elite do Comando de Operações Especiais (cuja sigla em inglês é Socom) para cerca de 20 países no Médio Oriente, África e América Latina. O número de funcionários deste departamento subiu de 40 mil para 53 mil. Desde 2003, o orçamento para o Socom aumentou 60% e deve chegar a US$ 8 mil milhões em 2007. Segundo o jornal The Washington Post, estas missões incluem recolher informações para o planeamento de eventuais acções militares em países onde não há guerra ou conflito directo.
Na América Latina, um dos principais focos destas tropas é a Tríplice Fronteira, entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina. A estratégia nesta região combina campanhas de propaganda sobre suposta “ameaça terrorista”, com a presença de militares estadunidenses, favorecida pelo acordo militar bilateral dos Estados Unidos com o Paraguai. Na tentativa de envolver o Brasil e a Argentina na sua estratégia, em Julho de 2006, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma resolução pedindo que o presidente Bush formasse uma força-tarefa para actuar contra o «terrorismo no Hemisfério Ocidental, especialmente na Tríplice Fronteira».
O Congresso propõe ainda que os Estados Unidos pressionem os países membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) para que classifiquem o Hezbollah e o Hamas como organizações terroristas. A resolução visa principalmente fazer com que o governo brasileiro mude a sua política externa, que tradicionalmente não aceita o conceito de “organizações terroristas”, mas somente de “actos terroristas”.
O embaixador do Brasil nos EUA, Roberto Abdenur, manifestou «profundo desconforto» com a resolução e declarou que mesmo a «Casa Branca reconhece não haver actividades de terrorismo operativo na região». O prefeito da cidade fronteiriça de Foz do Iguaçu, Paulo Ghisi, afirmou «não aceitar mais essa discriminação». O presidente do Centro Cultural Islâmico em Foz do Iguaçu, Zaki Moussa, conclui: «Eles querem a região, não os árabes. Todo mundo sabe a importância geopolítica da Tríplice Fronteira, inclusive pela concentração de água doce».
O exemplo da Tríplice Fronteira mostra a relação de uma estratégia militar com o controle de recursos estratégicos. No Paraguai, as elites locais apoiam acções militares e paramilitares, principalmente em áreas onde as organizações camponesas estão mais organizadas. O objectivo é expulsar os camponeses das suas terras para abrir espaço para o latifúndio, principalmente para a produção de soja. Portanto, a região combina interesses estratégicos dos estados Unidos na América do Sul, com a manutenção do poder das oligarquias rurais.
O imperialismo norte-americano serve tanto aos interesses das elites estrangeiras, quanto das elites locais. Por isso, depende da subserviência dos governos de países periféricos e também da cumplicidade de países centrais, como os da União Europeia. Por sua vez, as principais lutas de resistência contra o imperialismo também combinam estratégias de acção locais e articulação internacional.
Em oposição ao processo de militarização no Continente, foi criada a Campanha pela Desmilitarização das Américas (CADA). Além de monitorar a presença militar dos Estados Unidos na América Latina, a CADA tem contribuído na articulação de lutas populares contra o imperialismo.
As principais propostas da CADA são:
– Denunciar a dominação militar dos EUA na América Latina e suas consequências, como as violações de direitos humanos, a destruição ambiental e a perda da soberania e da autodeterminação dos povos.
– Coordenar acções solidárias e simultâneas, realizar mobilizações, investigações e acções jurídicas contra o aparato militar dos EUA e em defesa dos direitos humanos.
– Apoiar os movimentos sociais em cada país, que lutam por sua terra, sua cultura, seu trabalho e sua dignidade.
– A construção de um modelo económico baseado na justiça social e na solidariedade entre os povos.
– A construção de uma alternativa igualitária e sustentável para a integração latino-americana.
Intensas lutas de resistência, combinando mobilização local com solidariedade internacional, lograram interromper operações militares em Vieques, Porto Rico. Um plebiscito popular obteve mais de 10 milhões de votos no Brasil, impedindo o controle da base de Alcântara pelos Estados Unidos. Na Costa Rica, um forte movimento popular impediu a presença da Academia para o Cumprimento da Lei (uma versão da Escola das Américas para policiais latino-americanos). Um forte movimento de oposição na Argentina impediu a realização de uma operação de treinamento liderada por militares estadunidenses para países latino‑americanos, chamada Águilas III.
Em todo o Continente, desde o México, com as lutas populares em Chiapas e Oaxaca, até à mobilização de povos indígenas no Brasil, que ocuparam recentemente a Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores mineradoras do mundo, reflectem o repúdio pelas políticas de dominação económica e militar. Em 2007, movimentos sociais brasileiros organizarão um plebiscito popular pela estatização da Companhia Vale do Rio Doce, privatizada em 1997 através de um leilão fraudulento.
A recuperação de fontes de recursos estratégicos é fundamental. Na Bolívia, a forte oposição à política de privatização da água e do gás natural causou a renúncia de dois presidentes e culminou na eleição de Evo Morales, que garantiu também maior participação do Estado sobre a actuação de empresas petroleiras no país. Na Venezuela, a retomada do controle da PDVSA pelo presidente Hugo Chávez foi essencial para a continuidade da revolução bolivariana.
E, mais recentemente, o povo equatoriano elegeu o presidente Rafael Correa, que declarou o seu compromisso de não renovar o acordo que permite que os EUA utilizem a base de Manta. Esta iniciativa foi saudada por uma rede de organizações equatorianas que tem realizado diversas acções de mobilização contra a base. «Está comprovado que as principais actividades dos militares estadunidenses são o controle migratório, o trabalho de vigilância e o apoio logístico ao exército colombiano. Por outro lado, a militarização do porto de Manta tem provocado a expulsão de camponeses e pescadores, os quais estão impedidos de trabalhar», afirma a nota divulgada pela Coalizão No Bases, do Equador.
Em Março de 2007, o Equador será a sede da Conferência Mundial pela Abolição de Bases Militares Estrangeiras, o que torna a decisão de Rafael Correia ainda mais significativa. O presidente eleito teve também o apoio dos movimentos sociais equatorianos pelo seu compromisso de não firmar o Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos.
Na luta contra o imperialismo é importante unir estratégias de acção contra agentes que promovem uma política económica articulada com a militar. Um deles é o Banco Mundial, que funciona como uma espécie de “cérebro”, elaborando conceitos incorporados por outras instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Comércio (OMC). A liderança do Banco Mundial torna ainda mais evidente a relação entre estratégias económicas e militares. O seu actual presidente, Paul Wolfowitz, foi vice-secretário de Defesa dos EUA. O presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (braço do Banco Mundial para a América Latina) é Luiz Alberto Moreno, ex-embaixador da Colômbia em Washington e idealizador do Plano Colômbia.
No livro Confissões de um sicário económico [1], John Perkins, revela que «desde a II Guerra Mundial, os sicários económicos construíram o primeiro império verdadeiramente global. Isso foi feito principalmente por meios económicos, não militares», explica. Os sicários económicos são especialistas em identificar países onde existam recursos estratégicos, adquirir empréstimos do Banco Mundial ou do FMI e, a partir do endividamento destes países, fazer chantagem para conseguir contratos destes governos com empresas estadunidenses para mega‑projectos como usinas de energia, estradas, portos, etc. Algumas das empresas citadas no livro são Bechtel, Halliburton, Stone and Webster, Brown and Root, Nike, Monsanto, General Electric, e Chas T. Main, onde Perkins trabalhou.
Perkins cita ainda a actuação desses agentes em organizar oposição social a governos contrários aos interesses dos EUA. No caso dos sabotadores falharem, agentes chamados de “chacais” são utilizados para derrubar ou assassinar governantes. Ele revela que os chacais foram enviados à Venezuela em 2002 para articular o golpe contra o presidente Chávez.
Há também uma relação estreita entre a política externa dos Estados Unidos e os interesses de empresas de comunicação. Corporações de outra natureza (bancos, empresas bélicas, etc.) têm controle accionário de grandes meios de comunicação. Por exemplo, a General Electric (que produz desde lâmpadas até material bélico e nuclear) controla a RCA e a rede de TV NBC.
O governo dos Estados Unidos investe pesadamente nos sectores de comunicação do Pentágono, da Casa Branca e do Departamento de Estado, que possuem milhares de funcionários. Desde a I Guerra Mundial, os Estados Unidos desenvolveram um sistema de comunicação intimamente ligado aos seus interesses militares. Aliás, uma das principais funções das rádios, na sua origem, foi orientar e entreter soldados nos campos de batalha. Desde então, foram desenvolvidos mecanismos cada vez mais sofisticados de dominação ideológica através da mídia comercial.
A mídia não influencia somente a opinião pública, mas actua principalmente estabelecendo uma agenda política. Isso significa estabelecer “o que” o público deve pensar, mas também “sobre o que” devemos pensar. A repetição de ideias e o contexto dado a determinados factos têm efeitos poderosos. As guerras promovidas pelos EUA não seriam possíveis sem o apoio da mídia.
Um conceito amplamente difundido, que garantiu apoio da sociedade estadunidense a uma série de invasões militares foi a ideia de “intervenções humanitárias” ou “guerras preventivas”, como ocorreu no Panamá, Somália, Haiti, Bósnia, Colômbia, Afeganistão e até mesmo nas duas guerras contra o Iraque, onde soldados norte‑americanos pensavam que a sua missão era “libertar” aquele país. Essas intervenções serviram para garantir controle territorial, recursos naturais, políticas económicas neoliberais e de “livre mercado”, mas tinham como pretexto assegurar a “estabilidade”, a “democracia” e a “segurança” naqueles países.
Esse discurso esconde as atrocidades cometidas pelo exército e por forças paramilitares financiadas pelos EUA em todo o mundo. Sob o discurso dos governantes estadunidenses, que pregam a “democracia” e a “justiça”, uma parte da sociedade alimenta um sentimento de superioridade. Outra parte sofre directamente com leis que, especialmente depois dos ataques de 11 de Setembro, restringem direitos civis e políticos, principalmente dos imigrantes. Portanto, a manutenção do império americano depende da ignorância e da opressão da sua própria população.
Na década de 80, quando a América Central vivia um duro processo de enfrentamento contra o imperialismo e muitas organizações estadunidenses buscavam prestar solidariedade às lutas revolucionárias na região, já havia um entendimento de que a melhor forma de se solidarizar com uma revolução é estimular essas lutas no seu próprio país.
O nosso Continente tem sido palco de muita luta e não nos faltam exemplos a seguir. Em toda a América Latina estão a ocorrer mobilizações que reflectem o repúdio popular às políticas de dominação económica e militar dos Estados Unidos e dos seus aliados. Hoje mesmo, cada um/uma de nós está em processo de luta e sabemos o que fazer. A cada dia surgem novas formas de resistência, a partir da sabedoria popular. Como diz o povo de Oaxaca, «La Victoria no es de los poderosos sino de los mejor organizados».
[1] Sobre este livro, ler Pedro Campos, Confissões sinistras (I), Avante!, 07/12/2005 (n. IA).
Maria Luisa Mendonça
ALAI
http://www.infoalternativa.org/amlatina/amlatina028.htm
Sem comentários:
Enviar um comentário