segunda-feira, janeiro 01, 2007

Oaxaca: as estratégias do terror

A exortação formulada pela Amnistia Internacional (AI) ao governo mexicano para que garanta a segurança física e psicológica dos defensores de direitos humanos em Oaxaca obriga a constatar quão longe chegaram as autoridades federais e estatais nas violações a tais garantias no decurso da repressão contra o movimento de descontentamento social estruturado na Assembleia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO). O assinalamento está muito longe de ser injustificado: vários observadores e activistas humanitários - Alberto Tlacael Cilia Ocampo, do Centro de Direitos Humanos Yaxkin; Yésica Sánchez, que preside à secção de Oaxaca da Liga Mexicana de Defesa dos Direitos Humanos (Limeddh); Aline Castellanos, do Consórcio para o Diálogo Parlamentar e a Equidade, entre outros - sofreram na própria carne os embates de um sistema judicial usado como instrumento de repressão, perseguição política e amedrontamento.

Com efeito, os mecanismos tradicionais de prevenção policial, segurança pública, procura e repartição de justiça, foram postos ao serviço de uma estratégia orientada a desarticular o movimento social que exige a saída de Ulisses Ruiz do governo estatal e a semear terror entre os aderentes e simpatizantes da APPO e entre a população em geral, operação na qual as autoridades federais tomaram parte activa.

Não se pode explicar de outro modo a detenção de centenas de cidadãos que foram capturados - embora o termo de “sequestro” fosse mais apropriado que o de “captura” para mencionar tais casos - nos dias 24 e 25 de Novembro, selvaticamente golpeados e muitos deles lesionados, vexados, agredidos, humilhados, e transladados para pontos do território nacional muito distantes de Oaxaca com o pretexto da “perigosidade” dos cativos, e que no final de contas foram sendo libertados ou transladados para prisões oaxaquenhas ao tornar-se manifesta a sua inocência ou ao perder consistência a qualificação penal que lhes foi inicialmente imputada.

Certamente, os corpos policiais, ministérios públicos e juízes locais caracterizaram-se mais por servir os interesses do governador do que por procurar e repartir justiça, e essa é precisamente uma das razões que alenta o movimento opositor cidadão em Oaxaca. Dos organismos federais teria cabimento esperar, em vez disso, que actuassem com um mínimo de independência e sentido legal; ao invés, a Polícia Federal Preventiva (PFP) tem vindo a participar, de acordo com os depoimentos disponíveis, nas perseguições políticas contra os integrantes da APPO e no maltrato de centenas de pessoas, muitas das quais nem sequer tinham um vínculo específico com o movimento civil oaxaquenho. Requerer-se-ia um esforço desmesurado de credulidade para supor que as seis dezenas de presos que foram libertados até agora constituem outros tantos enganos do poder público; dá a impressão, ao invés, que as capturas procuravam gerar um efeito escarmentador e um impacto dissuasório, mediante terror e atropelos aos direitos humanos, contra a cidadania oaxaquenha em geral.

Mas esta mascarada perversa e turva - deter dezenas de pessoas, torturá-las, transladá-las a milhares de quilómetros, atribuir-lhes acusações múltiplas e depois libertá-las mediante desistência e pagamento de fianças - é, no entanto, insustentável; em vez de propiciar o desaparecimento da dissidência, conseguiu semear novos elementos de rancor social contra os governos local e federal. A reconciliação em Oaxaca, se é que esse é o objectivo das autoridades nacionais e locais, deve começar pela libertação de todos os detidos, a retirada de ordens de apreensão e a investigação e sanção dos excessos e atropelos perpetrados a partir do poder público.
Editorial
La Jornada
http://www.infoalternativa.org/amlatina/mexico014.htm

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