Surpreende a actualidade deste texto de 1841. List foi um dos economistas mais importantes do século XIX. Depois de Marx, foi um dos mais traduzidos. Depois ficou quase esquecido, pois a escola anglo-saxónica veio a predominar na chamada ciência económica. List opôs-se a Smith, o "papa" do liberalismo. Ele mostra, muito lucidamente, que o famoso exemplo do comércio do vinho do porto português pelos têxteis ingleses, apresentado em A riqueza das nações, constituía antes um programa do que a teoria de uma divisão internacional do trabalho que constituiria a situação óptima para todas as partes. Um programa, claro está, muito favorável à burguesia da Revolução Industrial britânica, ansiosa por escoar suas exportações. O tipo de análise de List tem raízes históricas, com os pés bem assentes no chão da realidade. Tal análise opõe-se às (interessadas) abstracções dedutivas dos economistas britânicos de então. Ele chega a cometer a heresia (para os economistas neoliberais de hoje) de defender o proteccionismo. Também merece menção a justíssima homenagem de List ao Conde da Ericeira, um dos representantes lúcidos da classe dominante portuguesa daquela época. Vale a pena, portanto, reler este texto antigo, em boa hora publicado pela Fundação Calouste Gulbenkian. Ele analisa (e bem) a obra-prima da diplomacia comercial britânica: o Tratado de Methuen, ruinoso para o desenvolvimento de Portugal (o que também, contemporaneamente, foi demonstrado por Sandro Sideri em Comércio e poder [Cosmos, Lisboa, 1970] ).
JF
Enquanto os ingleses se esforçavam, durante séculos, por erguer o edifício do seu bem-estar nacional sobre bases sólidas, os espanhóis e os portugueses, através das suas descobertas, conseguiram uma sorte rápida, atingindo grande riqueza em pouco tempo. Mas era a riqueza de um esbanjador que ganhou a sorte grande, enquanto a dos ingleses se parece com a de um pai de família trabalhador e poupado. O primeiro pode, por uns tempos, parecer mais invejável pelo seu esplendor e luxo do que o segundo; mas a riqueza, para ele, é apenas um meio para o gasto e o prazer imediato, enquanto o segundo a considera principalmente um meio de constituir o bem-estar mental e material da sua posteridade mais tardia. Os espanhóis possuíram refinados rebanhos tão cedo que, nos séculos X e XI, conseguiam satisfazer a maior parte das necessidades das fábricas de lã italianas e Henrique I de Inglaterra (1172) se viu obrigado a proibir a importação da lã espanhola. Duzentos anos antes, os habitantes do Golfo da Biscaia tinham-se distinguido na fabricação em ferro, na navegação e na pesca; foram os primeiros a praticar a caça à baleia, e ainda no ano de 1615 eram nisso tão superiores aos ingleses, que tinham de lhes enviar pescadores para os ensinar neste ramo da pesca [1] . No século X, sob o governo de Abdulrahman III (de 912 a 950), os mouros tinham, nas zonas férteis de Valência, grandes plantações de algodão, açúcar e arroz e cultivavam o bicho-da-seda. Córdova, Sevilha e Granada mantinham, no tempo dos mouros, importantes manufacturas de algodão e seda [2] . Herencia, Segóvia, Toledo e muitas outras cidades castelhanas distinguiam-se na manufactura de lã. Só Sevilha contava, nos primeiros tempos, com 16 000 teares, e as manufacturas de lã de Segóvia empregavam, ainda no ano 1552, 13 000 trabalhadores. Na mesma proporção se desenvolveram todos os outros ramos industriais, nomeadamente o fabrico de armas e de papel. Ainda no tempo de Colbert, os franceses abasteciam-se com finos panos espanhóis [3] . Nos portos marítimos de Espanha, praticava-se abundante comércio e significativa pesca marítima, e até aos tempos de Filipe II o reino possuía a marinha mais poderosa. Numa palavra: a Espanha estava na posse de todos os elementos de grandeza e riqueza, quando o fanatismo, em conjunto com o despotismo, começou a asfixiar o elevado espírito da nação. Esta obra das trevas foi iniciada com a expulsão dos judeus e concluída com a expulsão dos mouros, com o que foram banidos de Espanha dois milhões dos mais empreendedores e ricos habitantes com os respectivos capitais. Enquanto a Inquisição se aplicava, deste modo, a exilar a indústria interna, impedia simultaneamente, com muita eficácia, o estabelecimento no país de manufactores estrangeiros. O descobrimento da América e da Rota do Cabo só aparente e temporariamente aumentava a riqueza de ambos os países, A partir daí, a sua indústria nacional e o seu poder receberam o golpe mortal. Porque, em vez de, como mais tarde os holandeses e os ingleses, trocar os seus próprios produtos manufacturados por produtos das Índias Orientais e Ocidentais, compravam as mercadorias às nações estrangeiras com o ouro e a prata que tinham extorquido nas colónias [4] ; transformavam os seus úteis e empreendedores cidadãos em exploradores de escravos e opressores das colónias; alimentavam a indústria, o comércio e o poder marítimo dos holandeses e ingleses, educavam-nos como rivais, que cedo se tornariam suficientemente fortes para destruir as suas frotas e para saquear as fontes de riqueza do seu reino. Em vão os reis de Espanha publicavam leis contra a exportação de dinheiro e importação de manufacturas estrangeiras; espírito empreendedor, zelo profissional e comércio só germinam em solo de liberdade política e religiosa; ouro e prata só ficam onde a indústria os sabe atrair e empregar. Portugal, todavia, com um ministro sábio e forte, fazia uma tentativa de estabelecer uma indústria de manufactura, cujo sucesso inicial nos espanta. Tal como a Espanha, este país possuía, desde tempos imemoriais, requintados rebanhos. Já Estrabão relata que aí se teriam importado da Ásia finas ovelhas, cada uma ao preço de um talento. Quando o conde da Ericeira chegou ao governo, em 1681, elaborou um plano de instalação no país de manufacturas têxteis, trabalhando assim a sua própria matéria-prima, para servir a terra-mãe e as colónias com fabricantes próprios. Com este fim, mandou vir fabricantes de tecidos de Inglaterra e, rapidamente, em consequência de apoios proporcionados, floresceram as manufacturas têxteis no país, de tal modo que logo três anos mais tarde (1684) era possível proibir a importação de tecidos estrangeiros. A partir desta época, Portugal abastecia-se a si e às suas colónias com produtos próprios de matérias-primas internas, sendo com isto, segundo o testemunho dos escritores ingleses, bem sucedidos durante dezanove anos [5] . É verdade que os ingleses já na altura deram provas da habilidade que mais tarde souberam levar a tão grande perfeição. Para contornar as restrições comerciais portuguesas, fabricavam tecidos de lã que eram algo diferente do pano, mas que prestavam o mesmo serviço, e importavam estes em Portugal sob o nome de woollenserges [6] , woollendroguets. Estes tecidos foram proibidos quando a manha foi descoberta, tornando-a assim inofensiva [7] . O sucesso destas medidas é tanto mais estranho, quanto o país, pouco antes, tinha perdido uma grande quantidade de capital para o estrangeiro através da expulsão dos judeus e, em geral, sofria de todos os malefícios do fanatismo, de um mau governo e de uma aristocracia feudal que oprimia a liberdade do povo e da agricultura [8] . Mas no ano de 1703, depois da morte do conde da Ericeira, o famoso ministro inglês Methuen conseguiu convencer o governo português de que Portugal ganharia incomensuravelmente se a Inglaterra permitisse a importação de vinhos portugueses mediante um imposto, que seria por um terço inferior ao imposto para os vinhos de outras nações, e que, em contrapartida, Portugal permitiria a importação de tecidos ingleses mediante um imposto de importação, como o que tinha existido antes de 1684 (23 por cento). Parece que a esperança, por parte do rei, de aumento dos seus rendimentos alfandegários e, por parte da aristocracia, de aumento das rendas das suas propriedades foi o motivo fundamental para concluir o contrato comercial, na sequência do qual o rei de Inglaterra chama o rei de Portugal o seu mais velho "amigo e aliado", muito no mesmo sentido com que antigamente o senado romano costumava atribuir estes atributos aos soberanos que tinham a infelicidade de entrar em contacto mais próximo com ele. Imediatamente após a consumação deste contrato comercial, Portugal foi inundado de manufacturas inglesas. E a primeira consequência desta inundação foi a repentina e completa ruína das fábricas portuguesas — um sucesso muito do género do mais tardio chamado acordo Eden com França e parecido com o levantamento do sistema continental na Alemanha. Segundo o testemunho de Anderson, os ingleses já nessa altura tinham experiência na arte de declarar os seus artigos abaixo do respectivo valor, que efectivamente pagavam não mais do que a metade do imposto estabelecido pela tarifa [9] . "Depois de ter sido levantada a proibição", diz o British Merchant, "retirámos tanto da sua prata, que lhes sobrava muito pouco para seu próprio uso (very little for their necessary occasions). Em seguida vamos atacar-lhes o ouro." [10] Levaram este negócio por diante até tempos mais recentes; exportavam de Portugal todos os metais preciosos que os portugueses obtinham nas suas colónias, reencaminhando uma grande parte deles para as Índias Orientais e a China, onde, como mostrámos ao tratar da Inglaterra, eram trocados por artigos que vendiam no continente europeu contra matéria-prima. As importações anuais de Inglaterra em Portugal ultrapassavam as exportações de Portugal em um milhão de libras esterlinas. Este conveniente saldo comercial baixava o câmbio a desfavor de Portugal em 15 por cento. "Nós ganhamos um saldo comercial mais considerável de Portugal do que de qualquer outro país", diz o autor de British Merchant na sua dedicatória a Sir Paul Methuen, filho do célebre ministro, "nós aumentámos a nossa saída de divisas de lá para um milhão e meio de libras esterlinas, enquanto antes só montavam a 300 000 libras" [11] . Este contrato tem sido sempre louvado por todos os comerciantes, economistas e estadistas de Inglaterra, como a obra-prima da política comercial inglesa. Anderson, que vê com bastante clareza o que diz respeito aos assuntos da política comercial inglesa e que, no seu género, fala com grande sinceridade, chama-lhe "contrato altamente barato e vantajoso" e não consegue evitar a ingénua exclamação: "que se mantenha para todo o sempre!" [12] Só a Adam Smith estava reservado contradizer esta visão geral ao afirmar: o Tratado de Methuen não foi de todo particularmente favorável para o comércio inglês. De facto, se alguma coisa prova a veneração cega com que a opinião pública tem aceitado os pontos de vista, em parte muito paradoxais, deste homem célebre, então é o facto de esta ter ficado até hoje por desmentir. No sexto livro do seu quarto capítulo, Smith diz: o Tratado de Methuen, ao permitir a importação dos vinhos portugueses a um imposto um terço menor do que dos vinhos de outras nações, concedeu aos portugueses um privilégio, enquanto os ingleses estavam obrigados a pagar os seus tecidos em Portugal com direito aduaneiros tão altos como qualquer outra nação; consequentemente, os ingleses não beneficiaram de nenhum privilégio em troca do que tinham concedido aos portugueses. Mas os portugueses, antes, não iam buscar grande parte das mercadorias estrangeiras de que necessitavam à França, Holanda, Alemanha e Bélgica? E os ingleses não adquiriam doravante mercado exclusivo para um produto manufacturado, cuja matéria-prima eles próprios detinham? Não inventaram eles um modo de reduzir o imposto português à metade? O câmbio não favorecia o consumo de vinhos portugueses em Inglaterra em 15 por cento? Não acabava quase totalmente o consumo de vinhos franceses e alemães na Inglaterra? O ouro e a prata portugueses não asseguravam o meio de retirar das Índias Orientais quantidades de produtos para com eles inundar o continente europeu? Não foram as fábricas têxteis portuguesas totalmente arruinadas em proveito das inglesas? Não se tornaram assim todas as colónias portuguesas, especialmente o rico Brasil, efectivas colónias inglesas? Aliás, este acordo garantia aos portugueses um privilégio, mas só em palavras; aos ingleses, em contrapartida, dava um privilégio na prática. A mesma tendência está na base de todos os posteriores acordos comerciais dos ingleses. Nas suas palavras, eram sempre cosmopolitas e filantropos, nas suas ambições sempre monopolistas. Conforme o segundo argumento de Adam Smith, o acordo não dava uma particular vantagem aos ingleses, porque tinham sido obrigados a reenviar grande parte do dinheiro, que teriam recebido dos portugueses pelo seu tecido, para outros países, de modo a com ele comprar artigos, quando teria sido muito mais vantajoso que tivessem trocado os seus tecidos directamente pelos produtos que necessitavam, pois, desse modo, teriam conseguido numa única troca aquilo que, através do comércio dos portugueses, só alcançavam em duas transacções. Na realidade, não fosse a grande consideração que conservamos do carácter e da perspicácia deste famoso escritor, teríamos, perante este argumento, de duvidar ou da sua sinceridade ou do seu conhecimento. Como salvação, não nos resta mais do que denunciar a fraqueza da natureza humana, à qual também Adam Smith, entre outros, paga abundante tributo, com estes argumentos paradoxais e quase ridículos — aparentemente ofuscado com o esforço, em si nobre, de justificar a liberdade absoluta do comércio. Neste raciocínio, não há mais lógica e saudável senso comum do que na argumentação que afirmasse que um padeiro, por vender o pão aos seus clientes a troco de dinheiro e com esse dinheiro adquirir farinha ao moleiro, não faz um negócio vantajoso porque, se recebesse pelo pão directamente a farinha, o seu objectivo seria atingido por meio de uma troca e não de duas. Não é necessária grande sagacidade para contrapor a um tal argumento que talvez o moleiro não precisasse de tanto pão quanto o padeiro lhe poderia fornecer, que o moleiro talvez soubesse cozer o pão e o fizesse ele próprio e que, consequentemente, o negócio do padeiro nem sequer conseguisse subsistir sem essas duas transacções. Assim estavam, na realidade, as relações comerciais entre Portugal e Inglaterra na época do Tratado. Portugal recebia ouro e prata da América do Sul por artigos manufacturados que para lá enviava, mas demasiado preguiçoso ou insensato para fabricar esses produtos ele próprio, comprava-os de Inglaterra a troco de metais preciosos. Os ingleses usavam os metais preciosos, desde que não precisassem deles na sua própria circulação, para exportação para as Índias Orientais ou para a China, onde adquiriam artigos que voltavam a vender no continente europeu, dos quais importava produtos agrícolas, matérias-primas ou outra vez metais preciosos. Perguntamos, então, em nome do senso comum: quem teria comprado aos ingleses todos os seus tecidos, que mandavam para Portugal, caso os portugueses tivessem preferido fabricá-los eles próprios ou comprá-los a outros países? Em Portugal não os teriam vendido e para outras nações já vendiam tudo o que podiam. Os ingleses teriam, portanto, fabricado tanto menos tecido quanto o que vendiam para Portugal; teriam exportado tanto menos metais preciosos para as Índias Orientais quanto os que recebiam de Portugal; teriam trazido para a Europa e vendido no continente tanto menos artigos das Índias Orientais e consequentemente receberiam daí muito menos matéria-prima. Não é mais plausível o terceiro argumento de Adam Smith, de que os ingleses, caso o dinheiro dos portugueses não tivesse fluído ao seu encontro, teriam satisfeito as suas necessidades por outras vias: de qualquer modo, Portugal teria de enviar o excesso de metais preciosos para o estrangeiro e, então, teria fluído para Inglaterra por outro caminho. Supondo agora a hipótese de que os portugueses fabricariam o seu próprio tecido, exportariam eles próprios o excesso de metais preciosos para a China e Índias Orientais e venderiam eles próprios os carregamentos de retorno para outros países, permitimo-nos a pergunta: os ingleses, neste caso, teriam visto algum do dinheiro dos portugueses? Seria o mesmo se Portugal tivesse firmado um Tratado de Methuen com a Holanda ou a França: com certeza que algum dinheiro teria ido parar à Inglaterra, mas apenas quanto poderia ter recebido pela venda da sua lã crua. Resumindo, as manufacturas, o comércio e a navegação dos ingleses nunca poderiam, sem o Tratado de Methuen, ter tido o desenvolvimento que tiveram. Como quer que se analise o efeito do Tratado de Methuen em relação à Inglaterra, uma coisa parece certa: em relação a Portugal, as negociações não foram de modo a que outras nações se vissem tentadas, em proveito da exportação dos seus produtos agrícolas, a renunciar ao seu mercado de manufacturas interno em prol da concorrência inglesa. A agricultura e a indústria, o comércio e a navegação em Portugal, em vez de aumentarem com o intercâmbio com Inglaterra, afundavam-se mais e mais. Em vão Pombal tentava desenvolvê-las, porque a concorrência inglesa aniquilava todos os seus esforços. É verdade que não se pode esquecer que, num país como Portugal, em que toda a situação social apresenta um obstáculo à evolução da agricultura, da indústria e do comércio, a política mercantil por si só de pouco serve. Mas o pouco que Pombal conseguiu prova o quanto um governo, preocupado com indústria, pode fazer por ela, uma vez afastados os impedimentos encontrados na sociedade. A mesma experiência fez-se em Espanha, sob o governo de Filipe V e dos seus dois sucessores. Por muito insuficiente que fosse a defesa que, sob o poder dos Bourbons, se dispensou à indústria interna, e por mais que faltasse em energia para pôr em prática as leis alfandegárias, foi evidente, em todos os ramos da indústria e em todas as regiões do país, um significativo desenvolvimento [13] em virtude da política comercial de Colbert transplantada de França para Espanha. Quando se lê Uztariz e Ulloa [14] , estes sucessos surpreendem, tendo em conta as condições dominantes. Por todo o lado caminhos miseráveis apenas transitáveis por cavalos, em lado nenhum estalagens decentes, nem pontes nem canais, navegação fluvial, cada província separada do resto da Espanha por linhas alfandegárias, perante cada porta de cidade um imposto real, roubo nas estradas e mendicidade como ofício, contrabando em grande florescimento, o mais opressivo sistema de impostos: é tudo isto e causas semelhantes o que estes escritores apresentam como origem da decadência da indústria e da agricultura. Mas não se atrevem a denunciar as razões destes males, o fanatismo, a avareza e os vícios do clero, os privilégios da aristocracia, o despotismo do governo, a falta de informação e liberdade do povo. Num considerável paralelismo com o Tratado de Methuen português, o acordo de Assiento espanhol (1713) concedeu aos ingleses autorização para introduzirem anualmente na América espanhola um determinado número de negros africanos e para que, uma vez por ano, um navio seu pudesse visitar o porto de Portobello, através do qual tinham oportunidade de fazer entrar ilegalmente grande número de produtos manufacturados nesses países. Apercebemo-nos, assim, em todos os contratos comerciais dos ingleses, da tendência para alargar a sua indústria de manufactura nos países com que negoceiam, oferecendo-lhes aparentes vantagens no que respeita aos seus produtos agrícolas e matérias-primas. Por toda a parte, o seu objectivo é arruinar a força de manufactura interna desses países através de artigos baratos e concessão de créditos. No caso de não conseguirem tarifas alfandegárias baixas ou a organizar magistralmente o contrabando. O primeiro, como vimos, conseguiram em Portugal, o segundo, em Espanha. O cobrar dos impostos de importação segundo o valor dos artigos foi-lhes, para isso, muito útil, razão pela qual também mais recentemente se esforçam tanto por apresentar como contraproducente o imposto consoante o peso, como foi implantado pela Prússia.
Notas [1] Anderson, voI. 1, p. 127; voI. 2, p. 350. [2] M. G. Simon, Recueil d'observations sur Mémoires et considérations sur le commerce et d'Espagne, Ustariz, Théorie et pratique du commerce. [3] De l'industrie française. VoI. II, p. 245. [4] A principal exportação dos portugueses da América Central e do Sul consistia em metais preciosos. De 1748 até 1753 eram exportados anualmente 18 milhões de piaster. Ver Humboldt: Essai politique sur le royaume de la nouvelle Espagne, VoI. 2, p. 652. O comércio de mercadorias só se tornou significativo, tanto com estas zonas como com as Índias Ocidentais, com a entrada das plantações de açúcar, café e algodão. [5] British Merchant, Vol. III, p. 69. [6] Tecido durável, tipo sarja (nota do tradutor). [7] Ibid., p. 71. [8] Ibid., p. 76. [9] Anderson, Vol. III, p. 67. [10] British Merchant. Vol. III, p. 267. [11] British Merchant. VoI. III, p. 15, 20, 33, 38,110,253,254. [12] Anderson, 1703. [13] Macpherson, Annals of Commerce, no ano de 1771 e 1774. O agravamento da importação de produtos estrangeiros teve um efeito especialmente vantajoso para o desenvolvimento das fábricas espanholas. Antes, Espanha recebia 19, 20% do seu consumo em produtos de Inglaterra. Brougham, Inquiry into the colonial policy of the European powers. T. L S. 421. [14] Ustariz, Théorie du commerce. Ulloa, Rétablissement des manufactures d'Espagne.
Friedrich List
http://resistir.info/
JF
Enquanto os ingleses se esforçavam, durante séculos, por erguer o edifício do seu bem-estar nacional sobre bases sólidas, os espanhóis e os portugueses, através das suas descobertas, conseguiram uma sorte rápida, atingindo grande riqueza em pouco tempo. Mas era a riqueza de um esbanjador que ganhou a sorte grande, enquanto a dos ingleses se parece com a de um pai de família trabalhador e poupado. O primeiro pode, por uns tempos, parecer mais invejável pelo seu esplendor e luxo do que o segundo; mas a riqueza, para ele, é apenas um meio para o gasto e o prazer imediato, enquanto o segundo a considera principalmente um meio de constituir o bem-estar mental e material da sua posteridade mais tardia. Os espanhóis possuíram refinados rebanhos tão cedo que, nos séculos X e XI, conseguiam satisfazer a maior parte das necessidades das fábricas de lã italianas e Henrique I de Inglaterra (1172) se viu obrigado a proibir a importação da lã espanhola. Duzentos anos antes, os habitantes do Golfo da Biscaia tinham-se distinguido na fabricação em ferro, na navegação e na pesca; foram os primeiros a praticar a caça à baleia, e ainda no ano de 1615 eram nisso tão superiores aos ingleses, que tinham de lhes enviar pescadores para os ensinar neste ramo da pesca [1] . No século X, sob o governo de Abdulrahman III (de 912 a 950), os mouros tinham, nas zonas férteis de Valência, grandes plantações de algodão, açúcar e arroz e cultivavam o bicho-da-seda. Córdova, Sevilha e Granada mantinham, no tempo dos mouros, importantes manufacturas de algodão e seda [2] . Herencia, Segóvia, Toledo e muitas outras cidades castelhanas distinguiam-se na manufactura de lã. Só Sevilha contava, nos primeiros tempos, com 16 000 teares, e as manufacturas de lã de Segóvia empregavam, ainda no ano 1552, 13 000 trabalhadores. Na mesma proporção se desenvolveram todos os outros ramos industriais, nomeadamente o fabrico de armas e de papel. Ainda no tempo de Colbert, os franceses abasteciam-se com finos panos espanhóis [3] . Nos portos marítimos de Espanha, praticava-se abundante comércio e significativa pesca marítima, e até aos tempos de Filipe II o reino possuía a marinha mais poderosa. Numa palavra: a Espanha estava na posse de todos os elementos de grandeza e riqueza, quando o fanatismo, em conjunto com o despotismo, começou a asfixiar o elevado espírito da nação. Esta obra das trevas foi iniciada com a expulsão dos judeus e concluída com a expulsão dos mouros, com o que foram banidos de Espanha dois milhões dos mais empreendedores e ricos habitantes com os respectivos capitais. Enquanto a Inquisição se aplicava, deste modo, a exilar a indústria interna, impedia simultaneamente, com muita eficácia, o estabelecimento no país de manufactores estrangeiros. O descobrimento da América e da Rota do Cabo só aparente e temporariamente aumentava a riqueza de ambos os países, A partir daí, a sua indústria nacional e o seu poder receberam o golpe mortal. Porque, em vez de, como mais tarde os holandeses e os ingleses, trocar os seus próprios produtos manufacturados por produtos das Índias Orientais e Ocidentais, compravam as mercadorias às nações estrangeiras com o ouro e a prata que tinham extorquido nas colónias [4] ; transformavam os seus úteis e empreendedores cidadãos em exploradores de escravos e opressores das colónias; alimentavam a indústria, o comércio e o poder marítimo dos holandeses e ingleses, educavam-nos como rivais, que cedo se tornariam suficientemente fortes para destruir as suas frotas e para saquear as fontes de riqueza do seu reino. Em vão os reis de Espanha publicavam leis contra a exportação de dinheiro e importação de manufacturas estrangeiras; espírito empreendedor, zelo profissional e comércio só germinam em solo de liberdade política e religiosa; ouro e prata só ficam onde a indústria os sabe atrair e empregar. Portugal, todavia, com um ministro sábio e forte, fazia uma tentativa de estabelecer uma indústria de manufactura, cujo sucesso inicial nos espanta. Tal como a Espanha, este país possuía, desde tempos imemoriais, requintados rebanhos. Já Estrabão relata que aí se teriam importado da Ásia finas ovelhas, cada uma ao preço de um talento. Quando o conde da Ericeira chegou ao governo, em 1681, elaborou um plano de instalação no país de manufacturas têxteis, trabalhando assim a sua própria matéria-prima, para servir a terra-mãe e as colónias com fabricantes próprios. Com este fim, mandou vir fabricantes de tecidos de Inglaterra e, rapidamente, em consequência de apoios proporcionados, floresceram as manufacturas têxteis no país, de tal modo que logo três anos mais tarde (1684) era possível proibir a importação de tecidos estrangeiros. A partir desta época, Portugal abastecia-se a si e às suas colónias com produtos próprios de matérias-primas internas, sendo com isto, segundo o testemunho dos escritores ingleses, bem sucedidos durante dezanove anos [5] . É verdade que os ingleses já na altura deram provas da habilidade que mais tarde souberam levar a tão grande perfeição. Para contornar as restrições comerciais portuguesas, fabricavam tecidos de lã que eram algo diferente do pano, mas que prestavam o mesmo serviço, e importavam estes em Portugal sob o nome de woollenserges [6] , woollendroguets. Estes tecidos foram proibidos quando a manha foi descoberta, tornando-a assim inofensiva [7] . O sucesso destas medidas é tanto mais estranho, quanto o país, pouco antes, tinha perdido uma grande quantidade de capital para o estrangeiro através da expulsão dos judeus e, em geral, sofria de todos os malefícios do fanatismo, de um mau governo e de uma aristocracia feudal que oprimia a liberdade do povo e da agricultura [8] . Mas no ano de 1703, depois da morte do conde da Ericeira, o famoso ministro inglês Methuen conseguiu convencer o governo português de que Portugal ganharia incomensuravelmente se a Inglaterra permitisse a importação de vinhos portugueses mediante um imposto, que seria por um terço inferior ao imposto para os vinhos de outras nações, e que, em contrapartida, Portugal permitiria a importação de tecidos ingleses mediante um imposto de importação, como o que tinha existido antes de 1684 (23 por cento). Parece que a esperança, por parte do rei, de aumento dos seus rendimentos alfandegários e, por parte da aristocracia, de aumento das rendas das suas propriedades foi o motivo fundamental para concluir o contrato comercial, na sequência do qual o rei de Inglaterra chama o rei de Portugal o seu mais velho "amigo e aliado", muito no mesmo sentido com que antigamente o senado romano costumava atribuir estes atributos aos soberanos que tinham a infelicidade de entrar em contacto mais próximo com ele. Imediatamente após a consumação deste contrato comercial, Portugal foi inundado de manufacturas inglesas. E a primeira consequência desta inundação foi a repentina e completa ruína das fábricas portuguesas — um sucesso muito do género do mais tardio chamado acordo Eden com França e parecido com o levantamento do sistema continental na Alemanha. Segundo o testemunho de Anderson, os ingleses já nessa altura tinham experiência na arte de declarar os seus artigos abaixo do respectivo valor, que efectivamente pagavam não mais do que a metade do imposto estabelecido pela tarifa [9] . "Depois de ter sido levantada a proibição", diz o British Merchant, "retirámos tanto da sua prata, que lhes sobrava muito pouco para seu próprio uso (very little for their necessary occasions). Em seguida vamos atacar-lhes o ouro." [10] Levaram este negócio por diante até tempos mais recentes; exportavam de Portugal todos os metais preciosos que os portugueses obtinham nas suas colónias, reencaminhando uma grande parte deles para as Índias Orientais e a China, onde, como mostrámos ao tratar da Inglaterra, eram trocados por artigos que vendiam no continente europeu contra matéria-prima. As importações anuais de Inglaterra em Portugal ultrapassavam as exportações de Portugal em um milhão de libras esterlinas. Este conveniente saldo comercial baixava o câmbio a desfavor de Portugal em 15 por cento. "Nós ganhamos um saldo comercial mais considerável de Portugal do que de qualquer outro país", diz o autor de British Merchant na sua dedicatória a Sir Paul Methuen, filho do célebre ministro, "nós aumentámos a nossa saída de divisas de lá para um milhão e meio de libras esterlinas, enquanto antes só montavam a 300 000 libras" [11] . Este contrato tem sido sempre louvado por todos os comerciantes, economistas e estadistas de Inglaterra, como a obra-prima da política comercial inglesa. Anderson, que vê com bastante clareza o que diz respeito aos assuntos da política comercial inglesa e que, no seu género, fala com grande sinceridade, chama-lhe "contrato altamente barato e vantajoso" e não consegue evitar a ingénua exclamação: "que se mantenha para todo o sempre!" [12] Só a Adam Smith estava reservado contradizer esta visão geral ao afirmar: o Tratado de Methuen não foi de todo particularmente favorável para o comércio inglês. De facto, se alguma coisa prova a veneração cega com que a opinião pública tem aceitado os pontos de vista, em parte muito paradoxais, deste homem célebre, então é o facto de esta ter ficado até hoje por desmentir. No sexto livro do seu quarto capítulo, Smith diz: o Tratado de Methuen, ao permitir a importação dos vinhos portugueses a um imposto um terço menor do que dos vinhos de outras nações, concedeu aos portugueses um privilégio, enquanto os ingleses estavam obrigados a pagar os seus tecidos em Portugal com direito aduaneiros tão altos como qualquer outra nação; consequentemente, os ingleses não beneficiaram de nenhum privilégio em troca do que tinham concedido aos portugueses. Mas os portugueses, antes, não iam buscar grande parte das mercadorias estrangeiras de que necessitavam à França, Holanda, Alemanha e Bélgica? E os ingleses não adquiriam doravante mercado exclusivo para um produto manufacturado, cuja matéria-prima eles próprios detinham? Não inventaram eles um modo de reduzir o imposto português à metade? O câmbio não favorecia o consumo de vinhos portugueses em Inglaterra em 15 por cento? Não acabava quase totalmente o consumo de vinhos franceses e alemães na Inglaterra? O ouro e a prata portugueses não asseguravam o meio de retirar das Índias Orientais quantidades de produtos para com eles inundar o continente europeu? Não foram as fábricas têxteis portuguesas totalmente arruinadas em proveito das inglesas? Não se tornaram assim todas as colónias portuguesas, especialmente o rico Brasil, efectivas colónias inglesas? Aliás, este acordo garantia aos portugueses um privilégio, mas só em palavras; aos ingleses, em contrapartida, dava um privilégio na prática. A mesma tendência está na base de todos os posteriores acordos comerciais dos ingleses. Nas suas palavras, eram sempre cosmopolitas e filantropos, nas suas ambições sempre monopolistas. Conforme o segundo argumento de Adam Smith, o acordo não dava uma particular vantagem aos ingleses, porque tinham sido obrigados a reenviar grande parte do dinheiro, que teriam recebido dos portugueses pelo seu tecido, para outros países, de modo a com ele comprar artigos, quando teria sido muito mais vantajoso que tivessem trocado os seus tecidos directamente pelos produtos que necessitavam, pois, desse modo, teriam conseguido numa única troca aquilo que, através do comércio dos portugueses, só alcançavam em duas transacções. Na realidade, não fosse a grande consideração que conservamos do carácter e da perspicácia deste famoso escritor, teríamos, perante este argumento, de duvidar ou da sua sinceridade ou do seu conhecimento. Como salvação, não nos resta mais do que denunciar a fraqueza da natureza humana, à qual também Adam Smith, entre outros, paga abundante tributo, com estes argumentos paradoxais e quase ridículos — aparentemente ofuscado com o esforço, em si nobre, de justificar a liberdade absoluta do comércio. Neste raciocínio, não há mais lógica e saudável senso comum do que na argumentação que afirmasse que um padeiro, por vender o pão aos seus clientes a troco de dinheiro e com esse dinheiro adquirir farinha ao moleiro, não faz um negócio vantajoso porque, se recebesse pelo pão directamente a farinha, o seu objectivo seria atingido por meio de uma troca e não de duas. Não é necessária grande sagacidade para contrapor a um tal argumento que talvez o moleiro não precisasse de tanto pão quanto o padeiro lhe poderia fornecer, que o moleiro talvez soubesse cozer o pão e o fizesse ele próprio e que, consequentemente, o negócio do padeiro nem sequer conseguisse subsistir sem essas duas transacções. Assim estavam, na realidade, as relações comerciais entre Portugal e Inglaterra na época do Tratado. Portugal recebia ouro e prata da América do Sul por artigos manufacturados que para lá enviava, mas demasiado preguiçoso ou insensato para fabricar esses produtos ele próprio, comprava-os de Inglaterra a troco de metais preciosos. Os ingleses usavam os metais preciosos, desde que não precisassem deles na sua própria circulação, para exportação para as Índias Orientais ou para a China, onde adquiriam artigos que voltavam a vender no continente europeu, dos quais importava produtos agrícolas, matérias-primas ou outra vez metais preciosos. Perguntamos, então, em nome do senso comum: quem teria comprado aos ingleses todos os seus tecidos, que mandavam para Portugal, caso os portugueses tivessem preferido fabricá-los eles próprios ou comprá-los a outros países? Em Portugal não os teriam vendido e para outras nações já vendiam tudo o que podiam. Os ingleses teriam, portanto, fabricado tanto menos tecido quanto o que vendiam para Portugal; teriam exportado tanto menos metais preciosos para as Índias Orientais quanto os que recebiam de Portugal; teriam trazido para a Europa e vendido no continente tanto menos artigos das Índias Orientais e consequentemente receberiam daí muito menos matéria-prima. Não é mais plausível o terceiro argumento de Adam Smith, de que os ingleses, caso o dinheiro dos portugueses não tivesse fluído ao seu encontro, teriam satisfeito as suas necessidades por outras vias: de qualquer modo, Portugal teria de enviar o excesso de metais preciosos para o estrangeiro e, então, teria fluído para Inglaterra por outro caminho. Supondo agora a hipótese de que os portugueses fabricariam o seu próprio tecido, exportariam eles próprios o excesso de metais preciosos para a China e Índias Orientais e venderiam eles próprios os carregamentos de retorno para outros países, permitimo-nos a pergunta: os ingleses, neste caso, teriam visto algum do dinheiro dos portugueses? Seria o mesmo se Portugal tivesse firmado um Tratado de Methuen com a Holanda ou a França: com certeza que algum dinheiro teria ido parar à Inglaterra, mas apenas quanto poderia ter recebido pela venda da sua lã crua. Resumindo, as manufacturas, o comércio e a navegação dos ingleses nunca poderiam, sem o Tratado de Methuen, ter tido o desenvolvimento que tiveram. Como quer que se analise o efeito do Tratado de Methuen em relação à Inglaterra, uma coisa parece certa: em relação a Portugal, as negociações não foram de modo a que outras nações se vissem tentadas, em proveito da exportação dos seus produtos agrícolas, a renunciar ao seu mercado de manufacturas interno em prol da concorrência inglesa. A agricultura e a indústria, o comércio e a navegação em Portugal, em vez de aumentarem com o intercâmbio com Inglaterra, afundavam-se mais e mais. Em vão Pombal tentava desenvolvê-las, porque a concorrência inglesa aniquilava todos os seus esforços. É verdade que não se pode esquecer que, num país como Portugal, em que toda a situação social apresenta um obstáculo à evolução da agricultura, da indústria e do comércio, a política mercantil por si só de pouco serve. Mas o pouco que Pombal conseguiu prova o quanto um governo, preocupado com indústria, pode fazer por ela, uma vez afastados os impedimentos encontrados na sociedade. A mesma experiência fez-se em Espanha, sob o governo de Filipe V e dos seus dois sucessores. Por muito insuficiente que fosse a defesa que, sob o poder dos Bourbons, se dispensou à indústria interna, e por mais que faltasse em energia para pôr em prática as leis alfandegárias, foi evidente, em todos os ramos da indústria e em todas as regiões do país, um significativo desenvolvimento [13] em virtude da política comercial de Colbert transplantada de França para Espanha. Quando se lê Uztariz e Ulloa [14] , estes sucessos surpreendem, tendo em conta as condições dominantes. Por todo o lado caminhos miseráveis apenas transitáveis por cavalos, em lado nenhum estalagens decentes, nem pontes nem canais, navegação fluvial, cada província separada do resto da Espanha por linhas alfandegárias, perante cada porta de cidade um imposto real, roubo nas estradas e mendicidade como ofício, contrabando em grande florescimento, o mais opressivo sistema de impostos: é tudo isto e causas semelhantes o que estes escritores apresentam como origem da decadência da indústria e da agricultura. Mas não se atrevem a denunciar as razões destes males, o fanatismo, a avareza e os vícios do clero, os privilégios da aristocracia, o despotismo do governo, a falta de informação e liberdade do povo. Num considerável paralelismo com o Tratado de Methuen português, o acordo de Assiento espanhol (1713) concedeu aos ingleses autorização para introduzirem anualmente na América espanhola um determinado número de negros africanos e para que, uma vez por ano, um navio seu pudesse visitar o porto de Portobello, através do qual tinham oportunidade de fazer entrar ilegalmente grande número de produtos manufacturados nesses países. Apercebemo-nos, assim, em todos os contratos comerciais dos ingleses, da tendência para alargar a sua indústria de manufactura nos países com que negoceiam, oferecendo-lhes aparentes vantagens no que respeita aos seus produtos agrícolas e matérias-primas. Por toda a parte, o seu objectivo é arruinar a força de manufactura interna desses países através de artigos baratos e concessão de créditos. No caso de não conseguirem tarifas alfandegárias baixas ou a organizar magistralmente o contrabando. O primeiro, como vimos, conseguiram em Portugal, o segundo, em Espanha. O cobrar dos impostos de importação segundo o valor dos artigos foi-lhes, para isso, muito útil, razão pela qual também mais recentemente se esforçam tanto por apresentar como contraproducente o imposto consoante o peso, como foi implantado pela Prússia.
Notas [1] Anderson, voI. 1, p. 127; voI. 2, p. 350. [2] M. G. Simon, Recueil d'observations sur Mémoires et considérations sur le commerce et d'Espagne, Ustariz, Théorie et pratique du commerce. [3] De l'industrie française. VoI. II, p. 245. [4] A principal exportação dos portugueses da América Central e do Sul consistia em metais preciosos. De 1748 até 1753 eram exportados anualmente 18 milhões de piaster. Ver Humboldt: Essai politique sur le royaume de la nouvelle Espagne, VoI. 2, p. 652. O comércio de mercadorias só se tornou significativo, tanto com estas zonas como com as Índias Ocidentais, com a entrada das plantações de açúcar, café e algodão. [5] British Merchant, Vol. III, p. 69. [6] Tecido durável, tipo sarja (nota do tradutor). [7] Ibid., p. 71. [8] Ibid., p. 76. [9] Anderson, Vol. III, p. 67. [10] British Merchant. Vol. III, p. 267. [11] British Merchant. VoI. III, p. 15, 20, 33, 38,110,253,254. [12] Anderson, 1703. [13] Macpherson, Annals of Commerce, no ano de 1771 e 1774. O agravamento da importação de produtos estrangeiros teve um efeito especialmente vantajoso para o desenvolvimento das fábricas espanholas. Antes, Espanha recebia 19, 20% do seu consumo em produtos de Inglaterra. Brougham, Inquiry into the colonial policy of the European powers. T. L S. 421. [14] Ustariz, Théorie du commerce. Ulloa, Rétablissement des manufactures d'Espagne.
Friedrich List
http://resistir.info/
Sem comentários:
Enviar um comentário