quarta-feira, janeiro 17, 2007

Quem tem medo de um regime integrado de colocações?

Primeiro, o esclarecimento sobre detalhes profissionais, para enquadramento da minha eventual (in)capacidade para opinar sobre o assunto: dentro de 2 meses passam 20 anos sobre a minha primeira colocação, quando ainda era finalista do Curso de História. Nos anos seguintes dei intermitentemente aulas; a partir de 1991/92 exerci ininterruptamente a função, em acumulação ou não com outras actividades profissionais. Concorri, no mínimo, a uma dúzia de mini-concursos até 1998. A partir daí fui QZP e só em 2005 passei a Quadro de Escola, quando já me encontrava no 7º escalão da carreira. Penso que, talvez, conheça medianamente como os concursos se foram processando ao longo deste tempo.
Agora o essencial: se algo David Justino fez bem enquanto foi Ministro, para além de reformular a legislação sobre matéria disciplinar, foi o ter tentado acabar com os meandros menos claros que enredavam certas fases do processo de colocação de professores e ter tentado erguer um sistema unificado e transparente de colocações. Não me interessa aqui as rasteiras técnicas que lhe passaram, a resistência passiva e activa que muitos lhe moveram dentro do sistema, ou o carácter persistente, apesar de tudo, de certos “esquemas”. Sei que não tenho uma opinião consensual entre muitos colegas e não só, mas não posso deixar de assumir com clareza aquilo que penso.
A minha classificação para efeitos de concurso é atípica, com vários anos incompletos (um com 21 horas do princípio ao fim que me fez perder dezenas de dias de serviço), o que me coloca numa situação sem vizinhança próxima. Os retoques na forma de calcular as médias deixaram-me mais ou menos no mesmo sítio. Por aí, não tive nada a ganhar ou a perder em termos pessoais com o dito modelo de colocações.
Mas aplaudi a medida porque conheci ao longo dos anos múltiplos e desvairados truques para conseguir que certos horários fossem cair exactamente em certas pessoas, através de habilidades que torneavam a legislação formal dos concursos. Talvez fosse um conceito de autonomia ou de contratação directa bastante precoce por parte dos envolvidos. Houve quem ficasse anos a fio em certos estabelecimentos de ensino, graças a amiguismos e compadrios vários que, com alguns atropelos pelo meio, desrespeitaram claramente a equidade de tratamento que um sistema nacional (ou regional) de colocações exigiria.
Em todo esse processo de reformulação do concurso houve porém uma falha grave, apenas em parte corrigida com o tempo, que foi a não existência de um período transitório suficiente para que aquelas pessoas que estavam colocadas muito longe de casa, por serem obrigadas antes a concorrer pelo menos a uma das quatro zonas do país (eu que moro na península de Setúbal era obrigado a concorrer a quase todo o país a sul do Tejo), conseguissem ter tempo para se aproximarem um pouco mais das suas famílias e deixarem a sua itinerância ou ficarem dependentes de destacamentos de critérios muito, digamos, “flutuantes”.
Tirando isso, considero que num país como o nosso e com os meios informáticos actualmente disponíveis, um sistema unificado de ordenação dos candidatos e de colocações é a melhor solução contra a tradicional tendência nacional para cumprir a lei na medida em que dá jeito, desde que exista forma de a tornear dando mais ou menos nas vistas.
Pensava eu que para trás iriam ficar situações como horários esquecidos na gaveta e só disponibilizados para substituições nos chamados mini-concursos, horários de 10 horas que se multiplicavam em 22 à chegada do(a) candidato(a) certo(a), vagas de quadros abertas em calendários oportunos após análise detalhada da lista ordenada, mapas e dossiers de horários duplicados que as inspecções nunca detectavam, etc, etc, etc. Se isso significa que existia desonestidade em todos estes processos por parte dos professores envolvidos, dos órgãos de gestão aos beneficiários? Claro que existia, mesmo se em muitos casos com justificações mais ou menos estimáveis e compreensíveis. Mas o problema era a extrema opacidade de certas situações que muitos de nós conhecemos e com a qual fomos obrigados a viver, porque não foi raro que muitas denúncias ficassem por atender e outras acabassem por ser insuficientemente investigadas. Ainda recentemente tenho as chamadas paletes de exemplos de decisões arbitrárias em matéria de colocações, de erros crassos e de remendos a posteriori e a pedido. E já com este Governo. Ainda o ano lectivo passado andei pela DREL a ajudar a resolver um desses problemas e eram muitas as dezenas de pessoas que lá andavam. A imprensa estava distraída, claro.
Agora parece que muito disso vai poder voltar a acontecer. Em nome da “autonomia”, é óbvio. E da “agilização”. E de muita outra desculpa com palavras modernas.
E eu volto a afirmar o que já repetidamente aqui escrevi: nada na legislação vigente até ao momento impede que uma Escola ou Agrupamento peça a requisição de determinado docente dos quadros para um projecto que pretenda desenvolver. No caso dos cursos profissionais (CEF’s por exemplo), acompanhei a forma como era possível contratar e pagar a técnicos exteriores ao sistema de ensino para leccionarem determinadas matérias (dinheiros do PRODEP, claro, sempre libertados tarde pela tutela).
Por isso, há algo mais nesta tentativa de desmontar um sistema unificado de colocações. A ingenuidade acerca destas matérias esgotou-se-me há muito tempo.
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