Na passada terça-feira, activistas de várias ONGs denunciaram em frente às portas do Congresso o fracasso que pressupõe o projecto de lei sobre o comércio de armas, actualmente em tramite parlamentar. Para a Amnistia Internacional, a Intermón Oxfam e a Greenpeace, o projecto é insuficiente e deveria incorporar mecanismos que permitissem ao Parlamento controlar a acção do governo nestes temas.
Em concreto, a nova lei deveria exigir ao executivo informações claras e detalhadas sobre as exportações de armas que se efectuem e, também, sobre as pendentes de se realizar para poder intervir, no caso disso ser necessário, e conseguir paralisá las.
Neste sentido, o ministro da Indústria, Turismo e Comércio, Joan Clos, defendeu-se ao afirmar que o sistema espanhol de controle do comércio de armas é «sumamente exigente e rigoroso» e que o novo projecto incrementará esse controle, facilitando a informação sobre o uso final do produto e a identidade do usuário.
Destacou que, antes de autorizar uma venda, o governo verificará se o comprador é um país em conflito, se viola os direitos humanos ou se está sumido na pobreza, casos em que não se dará aprovação.
No entanto, e para corroborar as intenções do executivo de Zapatero, nesta mesma semana foi divulgada a venda a Marrocos de um importante lote de equipamento militar a um regime acusado de graves violações em matéria de direitos humanos e que virá a incrementar a tensão na zona e a ameaça de novos confrontos contra o povo saarauí.
ESFORÇOS BÉLICOS COM MARROCOS, REVÉS PARA A PAZ
Em concreto, o governo dotará o exército marroquino de 1.200 novos blindados com equipamento sofisticado (metralhadoras, mísseis anti veículo, lança granadas) e mais de 800 veículos militares que poderão ser usados como apoio logístico em caso de guerra.
Isso pressupõe um sério obstáculo aos esforços do novo secretário geral de Nações Unidas, Ban Ki-moon, e do seu recém nomeado enviado especial para o Saara, o britânico Julian Harston, porquanto este armamento dificultará a busca de uma paz justa e duradoura no Norte de África, ao potenciar a maquinaria bélica de um dos implicados.
Estes blindados, além do mais, poderiam encontrar finalmente o seu destino no território do Saara Ocidental, ocupado por Marrocos desde 1975 e a tão só 80 milhas das Ilhas Canárias.
Esta nova contribuição espanhola para a “paz” no Magreb foi pactuada em segredo em Novembro do ano passado, segundo assegurou Ignacio Cembrero do diário El País. Os contratos assinados nessa data com a Administração da Defesa Nacional de Marrocos (equivalente ao Ministério da Defesa) constituem a mais importante operação deste tipo com o país vizinho nos últimos anos, segundo fontes do sector citados pelo jornal.
Juntamente com os veículos militares – cujo custo, segundo os especialistas, pode superar os 160 milhões de euros –, também se acordou a venda de 10 barcos patrulha a Marrocos para a vigilância da sua costa. Neste caso, o encaixe poderia atingir os 35 milhões.
Para ter uma ideia do que implicam estes contratos, basta recordar que o total das exportações espanholas de material bélico em 2005 (último ano de que há estatísticas oficiais) atingiram os 419,45 milhões de euros.
Esta injustificada decisão é tomada justamente no momento em que as Nações Unidas se encontram imersas na aprovação de um texto para a regulação da venda de armas com sérias restrições a países em conflitos armados e/ou nos quais não se respeitam os direitos humanos, como é o caso do regime marroquino, que foi novamente condenado na semana passada no último relatório da Amnistia Internacional.
Para Bahia M. H. Awah, jornalista e escritor saarauí, esta venda de armamento também é um gesto hostil para com o estado argelino – defensor do direito do povo saarauí –, país chave política e economicamente no continente africano. Este mal-estar poderia conduzir a uma revisão dos acordos com o Estado espanhol, e o presidente argelino, Abdelaziz Buteflika, já advertiu o seu homólogo espanhol na recente reunião mantida entre ambos.
OUTROS “INVESTIMENTOS HUMANITÁRIOS”
Sem contar ainda com os dados de 2006, os últimos dados oficiais indicam que as vendas espanholas de armas e material bélico atingiram os 420 milhões de euros (544 milhões de dólares) e tiveram como destino 48 países, entre eles muitos em conflito ou nos quais se violam os direitos básicos. Foi um resultado recorde, pois em 2004 as vendas ascenderam a 405 milhões, 383 milhões em 2003, 274 milhões em 2002, 231 milhões em 2001 e 138 milhões de euros em 2000.
Entre os principais clientes encontram-se Colômbia, Israel, Marrocos, China, Arábia Saudita, Índia, Sri Lanka, Indonésia, Filipinas e Sudão, entre outros. Aos quatro primeiros, por exemplo, foram vendidas bombas, torpedos, foguetes e mísseis.
Mas o negócio discorda da ética pacifista e actualmente as 180 empresas espanholas dedicadas à indústria militar (segundo um relatório da Escola de Cultura de Paz) centram a sua atenção no aumento das vendas e, obviamente, dos lucros.
Tampouco se põe fim ao fabrico e venda das chamadas “bombas de fragmentação”. No final de Dezembro, a Greenpeace emitiu um comunicado no qual informava que «Espanha é um dos países que possui e fabrica bombas de fragmentação», as quais disparam centenas de pequenos explosivos sem qualquer precisão e, por conseguinte, o seu uso deveria estar proibido em áreas povoadas por civis.
«Várias empresas do nosso país fabricam-nas, ainda que a falta de transparência torne impossível saber onde as vendem», acrescentava o texto.
Este tipo de armas preocupam especialmente aqueles que têm alguma sensibilidade sobre os desastres da guerra, pois são mais perigosas que as minas anti pessoais, já que uma boa parte delas não explodem e mantêm se latentes durante muito tempo. Um caso paradigmático é o do Laos, onde as pessoas continuam a morrer actualmente como consequência das bombas de fragmentação utilizadas numa guerra que terminou há 30 anos.
José Daniel Fierro
Rebelión
http://www.infoalternativa.org/europa/e068.htm
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