A actual ministra da educação, Maria de Lurdes Rodrigues, é socióloga por formação, tendo-se especializado na área da Sociologia das Organizações. Também é do conhecimento geral que Maria de Lurdes Rodrigues frequentou ao longo dos anos os meios e os ( poucos) espaços anarquistas da cidade de Lisboa, e inclusivamente, o seu nome pode ser encontrado no corpo redactorial da revista anarquista «A Ideia», publicada ao longo de décadas após o 25 de Abril, muito embora não se lhe conheça qualquer produtividade teórica digna de realce, a que não é certamente estranho os critérios anarquistas de João Freire, responsável daquela revista e um reputado investigador da história do anarquismo em Portugal, e também figura de proa na área dos estudos da Sociologia do Trabalho e das Organizações da Universidade Nova de Lisboa.
Estes dados são preciosos e úteis para aquilatarmos do alcance das decisões governamentais e das leis da contra-reforma educativa que estão a ser promovidas pela actual ministra da educação, algumas delas em vias de execução, e que têm merecido uma rejeição generalizada por parte dos professores e educadores.
A contra-reforma em curso plasma-se num conjunto fragmentário de medidas e de diplomas legais que enforma, apesar disso, de um mesmo princípio orientador e institucional e que se concretiza numa transmutação implícita dos tradicionais estabelecimentos de ensino em organizações tutelares das crianças e jovens, não obstante manterem o pomposo nome de escolas.
Na verdade, os objectivos gerais da política educativa nos últimos anos foram sofrendo uma profunda evolução por força do fenómeno da massificação das escolas ( nivelamento por baixo), travestida ( e deliberadamente confundida) com a democratização do ensino ( ou seja, o acesso da população em geral ao conhecimento mais elaborado existente á data, bem como aos mais valiosos bens culturais). Esta conversão perversa, e raramente assumida pelos responsáveis políticos, tem gerado não poucos equívocos e as mais variadas ilusões, para não dizer mistificações, junto de todos os interessados na educação que, sem os esclarecimentos e a clarividência analítica, ficam irremediavelmente desarmados face a uma realidade que escapa à sua inteligibilidade.
Ora esta transformação nos objectivos e nas funções das organizações escolares requer, para o bem ou para o mal, uma mudança a nível organizacional, capaz de oferecer as respostas necessárias aos desafios da massificação escolar. Mas o que se assiste hoje é, paradoxalmente, por via das recentes medidas legislativas sobre a gestão das escolas e da avaliação dos professores, a um regresso aos modelos organizacionais que fizeram escola nos idos tempos da «escola meritocrática», e que se mostram completamente desapropriados face às novas realidades contemporâneas da massificação nos actuais estabelecimentos tutelares em que se converteram as escolas oficiais.
Com efeito, nem a repescada figura central do Director-Reitor, nem a estrutura centralizada e linearmente hierárquica do estabelecimento, nem muito menos as propostas de hetero-avaliação por objectivos dos professores que agora são impostas, têm algo a ver com a nova fisionomia social das organizações «escolares» nas sociedades contemporâneas.
A massificação tutelar, o multiculturalismo, a socialização secundária, a inclusão social são realidades que exigem todo um outro modelo organizativo assente em equipas polivalentes e grupos de trabalho e nunca por nunca um regresso e uma repescagem dos esquemas organizativos de má memória e que são próprios de um modelo escolar ultrapassado que pretendia seleccionar os melhores e formas as elites sociais.
Ao optar por esquemas organizacionais verticais, e por avaliações de professores desfasadas das realidades presentes, por razões que relevam de pura ideologia passadista, a actual ministra da educação, Maria de Lurdes Rodrigues, não só mostra a sua inépcia para perceber a complexidade das transformações sociais, nomeadamente dentro daquilo que, por força dos hábitos, se designa por «escola», como dá mostras de um extraordinário «no sense» só comparável com a radical contradição de ser uma zelosa ministra de um governo, e ter protagonizado uma inconfessada história pessoal de anarco-academismo.
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