segunda-feira, março 10, 2008

Houve os que gritaram e houve os que resistiram calados

Há uma acusação contra os professores que recentemente se tem avolumado: que nunca protestaram nem se insurgiram em nome dos alunos e do ensino, mas que protestam e se insurgem em nome dos seus estreitos interesses corporativos.

Encontro alguma justiça e muita injustiça nesta crítica: há professores que andam há décadas a lutar pelo ensino e pelos alunos contra a tecnoburocracia do Ministério, mas nunca conseguiram que a sua voz chegasse à praça pública. Não admira que esta os acuse de nunca terem falado - mas falaram, e falam.

Durante décadas o poder político descentrou do ensino a «educação», sobrecarregou as escolas e os professores de tarefas que não lhes competem, afogou o sistema numa burocracia monstruosa, baixou os níveis de exigência, fomentou a indisciplina e o incivismo.

Como reagiram a isto os professores? Uns aderiram às modas; outros, muitos, fizeram das tripas coração e, já que não podiam ensinar com as políticas educativas vigentes, ensinaram, e bem, apesar dessas políticas. Foram décadas de heroísmo silencioso e resistência discreta, praticada dia após dia enquanto na rua outros professores se manifestavam ruidosamente - com toda a legitimidade, de resto - pelos seus salários, pelas suas carreiras e pelas suas prerrogativas.

Hoje aqueles professores vêem-se, em vez de louvados pela sua resistência e dedicação, censurados pelo seu silêncio. Talvez seja esta, no fim, a maior das injustiças - maior ainda que o cerco montado pelo novo Estatuto da Carreira Docente, pela nova lei da gestão escolar, pelo novo modelo de avaliação e pelo novo estatuto do aluno, cerco este que lhes fecha a escassa margem de manobra que lhes permitia ainda resistir e ensinar.
http://legoergosum.blogspot.com/

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