quinta-feira, março 06, 2008

O superior interesse do ensino

O Professor universitário Vital Moreira, hoje no Público, defende a ministra da Educação, a política do Governo para a Educação no Secundário e ataca os professores que os contestam, em nome dos superiores interesses gerais e abstractos.

“A reforma do ensino público é essencial à sustentabilidade do escola pública, à melhoria do seu desempenho e à correcção dos vergonhosos indicadores nacionais no que respeita ao insucesso escolar e ao défice de qualidade do ensino.
Tínhamos escolas e professores a mais e qualidade e produtividade a menos. A escola funcionava a meio tempo para a generalidade dos alunos e nem sequer proporcionava aulas de substituição no caso da falta de professores. Uma insólita carreira profissional plana fazia prevalecer a antiguidade, e não o mérito, na progressão profissional. Faltava tanto uma genuína avaliação do desempenho como mecanismos elementares de selecção qualitativa dos professores. Um sistema de autogestão no governo das escolas gerava “endogenia administrativa”, défice de autoridade e falta de responsabilidade perante o exterior”.
Assim escreve Vital, para dar conta dos grandes males e dos remédios a tomar agora, com as medidas que aplaude, sem reservas e com o entusiasmo de quem proclama que este governo quer corrigir em quatro anos os erros e omissões de trinta. Acólitos destes, há poucos.

E valentes! Nesses trinta anos, inclui, naturalmente aqueles, bem bons, passados nas fileiras daquilo que considera “o radicalismo sindical da Fenprof, instrumento sindical do PCP e que “não deixou margem para nenhum acordo nem nenhuma ponte”.

É esse o requisitório do artigo. Seguido do remédio amargo, bem leninista, para males tamanhos: “no interesse da reforma, a ministra da Educação deve trabalhar para isolar os sectores radicais e conquistar pelo menos a compreensão dos sectores mais moderados.” Tomem lá - que é democrático. E ponham-se a pau que o conselho é mesmo para levar à letra.

Vital Moreira, sempre igual a si próprio, também é professor. De uma Universidade. Do ensino superior.
Neste grau, os problemas elencados não existem de todo, como é público e notório. E se existem, poucos falam neles e muito menos quem neles viceja.

Quanto ao problema das escolas e professores a mais, já se sabe que a questão da Moderna, Independente e com professores públicos em turbo-exercicio privado, ou acumulando prebendas honoríficas e pagamento em géneros e espécie, em cargos de relevo social, em instituições públicas e semi-públicas, não é óbice algum ao cumprimento de um horário laboral, de ensino superior.
Se os professores do secundário, dantes, tinham um limite de 22 horas e daí para baixo até chegar ao zero, os professores de universidade, nunca tiveram problemas desses. 22 horas por semana? Para quem? Para os escravos dos contratos a prazo ou em serviço de recibo verde? Isto para Vital Moreira, não é problema sério. A sério, só mesmo os professores secundários que tinham uma escola a funcionar “ a meio tempo”.

Na faculdade de Direito de Coimbra, onde o professor parece que exerce o ensino, problemas destes não existem. Até se trabalha à Sexta-feira à noite e ao Sábado de manhã, para arredondar contas de associações de direito privado, sem fins lucrativos e que prestam contas a elas mesmas e em protocolo, aos conselhos científicos de que fazem parte alguns associados. Isto, comparado como que se passa no ensino secundário, são amendoins. Peanuts. Ninharias.

Depois, outro problema grave elencado, é o sistema de autogestão no governo das escolas secundárias que gerava “endogenia administrativa”. Melhor dizendo, endogamia administrativa.
A autonomia do secundário, negada por causa das endogenias-endogamias, é sempre reivindicada para o superior interesse universitário.
Aí, sim! A plena autonomia, até financeira, e o autogoverno, em vez de permitirem a “endogenia administrativa”, permitem muito singelamente, a verdadeira endogamia: a dos lugares no ensino, agora mais do que nunca cobiçados como tábua de salvação do desemprego certo. Filhos de pais, sabem sempre ensinar. Sobrinhos idem e até primos e outros familiares e amigalhaços, que podem entrar no sistema, em endogamia, essa sim, genuína e desavergonhada.

A autoridade professoral e a responsabilidade perante o exterior, ficam asseguradas, para o secundário e, segundo Vital, com estas excelentes medidas de novos critérios de gestão. Que servem para o secundário, se funcionarem bem, o que é duvidoso, mas nunca por nunca serviriam para o superior. Os altos interesses são outra coisa.

Assim, a autoridade professoral, advém muito naturalmente da total ausência de controlo externo ou até mesmo interno, no que se refere à essência pedagógica e à qualidade intrínseca do ensino. Breve, os professores universitários, fazem o que bem querem e sobra-lhes o tempo para isso. Ninguém os vai questionar sobre a sua competência, já assegurada previamente, aquando da admissão. Ninguém os vai avaliar novamente, analisando as suas manias e taras. Ninguém os irá incomodar minimamente, através de queixas ao reitor ou ao conselho científico ou pedagógico, enquanto os mesmos não cometerem o crime mais grave que podem cometer e que nem vem no Código Penal: o de lesa-majestade, perante os superiores interesses da Universidade, dirigida pelos pares, uma pouco mais acima.
É sempre assim: quem vê argueiros alheios, está sempre alheado das traves que o cercam.
Para o Secundário, tem uma ministra corajosa, que não cede, em nome do bem público. Para o Superior, basta-lhes um Gago.
http://grandelojadoqueijolimiano.blogspot.com/2008/03/o-superior-interesse-do-ensino.html

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