Chegou-me à caixa de correio um artigo assinado por uma Bolseira da Fundação para a Ciência e Tecnologia, que, tendo o estatuto de investigadora, não é propriamente uma leiga em matéria de educação. Encontrando-se num processo de especialização, a sua opinião conta, e a sua opinião a respeito do estudo e da aprendizagem é a seguinte:
"Estudar tem de ter a adesão voluntária das crianças. Deve ser algo que elas percebam e por que se interessem. Perceber que conhecer, aprender e ter a possibilidade de participar no mundo de uma forma informada é algo estimulante, e as crianças gostam deste sentimento. Estudar é perceber mais e melhor... não é repetir o que os adultos impõem (...) As crianças têm múltiplos interesses que são desprezados em função da matéria escolar (...). Desenvolver e treinar a memória é o que as crianças mais fazem no seu dia-a-dia (...) Elas fazem-no à medida que se vão confrontando com a necessidade de saber, ou seja, quando jogam ou quando vêem jogar. Fazem-no sem custo porque é uma actividade que lhes interessa e, portanto, aderem a ela. E, ao aderir, estão a memorizar e a treinar (...) precisamos de compreender que também as propostas de trabalho que exigem estudo e esforço têm de ser sentidas pelas crianças como verdadeiramente importantes e suficientemente interessantes para que a elas adiram com vontade e para que as valorizem, para que as trabalhem com gosto. Caso contrário, mal comecem a ter alguma autonomia, deixam o estudo aprofundado de lado e fazem somente o mínimo necessário para passar de ano (...). Quando se obriga a memorizar e repetir, estamos a impor uma concepção já programada e raramente as crianças aprendem a pensar, a pôr em causa, e isso não as ajuda a perceber e ficar com vontade de continuar."
"Estudar tem de ter a adesão voluntária das crianças. Deve ser algo que elas percebam e por que se interessem. Perceber que conhecer, aprender e ter a possibilidade de participar no mundo de uma forma informada é algo estimulante, e as crianças gostam deste sentimento. Estudar é perceber mais e melhor... não é repetir o que os adultos impõem (...) As crianças têm múltiplos interesses que são desprezados em função da matéria escolar (...). Desenvolver e treinar a memória é o que as crianças mais fazem no seu dia-a-dia (...) Elas fazem-no à medida que se vão confrontando com a necessidade de saber, ou seja, quando jogam ou quando vêem jogar. Fazem-no sem custo porque é uma actividade que lhes interessa e, portanto, aderem a ela. E, ao aderir, estão a memorizar e a treinar (...) precisamos de compreender que também as propostas de trabalho que exigem estudo e esforço têm de ser sentidas pelas crianças como verdadeiramente importantes e suficientemente interessantes para que a elas adiram com vontade e para que as valorizem, para que as trabalhem com gosto. Caso contrário, mal comecem a ter alguma autonomia, deixam o estudo aprofundado de lado e fazem somente o mínimo necessário para passar de ano (...). Quando se obriga a memorizar e repetir, estamos a impor uma concepção já programada e raramente as crianças aprendem a pensar, a pôr em causa, e isso não as ajuda a perceber e ficar com vontade de continuar."
Encontro no livro O valor de educar, do filósofo Fernando Savater, uma passagem que desmistifica esta ideia absurda de que a criança, qualquer criança, aprende autonomamente a partir dos seus interesses, da sua natural criatividade, sendo que qualquer direccionamento ou constrangimento por parte dos adultos pode perturbar esse delicado fluir.
“Uma certa mitologia pedagógica criou a fábula da criança criativa a quem os constrangimentos da pedagogia mutilam e acorrentam. De acordo com esta argumentação falsamente rousseauniana — que não a de Rousseau — deve deixar-se que a criança desenvolva a sua genialidade inata, seguindo discretamente a corrente, sem outra medida educativa… mais ou menos como se estivesse louca. O contrário — dizem — supõe sacrificar a sua criatividade às rotinas opressivas e medíocres da sociedade em que vivemos. Para Claude Lévi-Strauss (…) a criatividade infantil revela-se antes de tudo na sua capacidade para assimilar a educação e essa sim que é inata; não esqueçamos que o mestre, por melhor que seja, só consegue ensinar, mas é criança quem realiza sempre o acto genial de aprender. Com frequência esse talento humanizador, gradual e evolutivo, está em luta com os frutos de precocidade, artificialmente maduros, que tanto agradam àqueles que gostam de exibir as destrezas das crianças como se fossem fenónemos de circo. Por isso, quando há algumas décadas atrás surgiu em França uma menina chamada Minou Drouet, celebrada como um prodígio porque escrevia poemas, Jean Cocteau comentou: «Todas as crianças são poetas… menos Minou Drouet…» (...)
Será então melhor que as crianças, por mais criativas que as consideremos, recebam a preparação adequada (...). E se alguma «criatividade» se perde no processso, é certo que se obterão como compensação resultados socialmente mais aceitáveis e uma configuração pessoal menos caprichosa e portanto mais estimulante. Será necessário recordar que não é possível nenhum processo educativo sem alguma disciplina? (…). A própria etimologia da palavra na língua latina (composto por discis, ensinar e da palavra que nomeia as crianças, pueripuella) vincula directamente a disciplina ao ensino. Esta exigência obriga o neófito a manter-se atento ao saber que lhe é proposto e a cumprir os exercícios que a aprendizagem requerer. O termo serviu também para denominar as diversas destrezas e conhecimentos que se aprendem por este processo, as matemáticas ou a geografia são disciplinas cuja aprendizagem exige, por sua vez, disciplina.”
“Uma certa mitologia pedagógica criou a fábula da criança criativa a quem os constrangimentos da pedagogia mutilam e acorrentam. De acordo com esta argumentação falsamente rousseauniana — que não a de Rousseau — deve deixar-se que a criança desenvolva a sua genialidade inata, seguindo discretamente a corrente, sem outra medida educativa… mais ou menos como se estivesse louca. O contrário — dizem — supõe sacrificar a sua criatividade às rotinas opressivas e medíocres da sociedade em que vivemos. Para Claude Lévi-Strauss (…) a criatividade infantil revela-se antes de tudo na sua capacidade para assimilar a educação e essa sim que é inata; não esqueçamos que o mestre, por melhor que seja, só consegue ensinar, mas é criança quem realiza sempre o acto genial de aprender. Com frequência esse talento humanizador, gradual e evolutivo, está em luta com os frutos de precocidade, artificialmente maduros, que tanto agradam àqueles que gostam de exibir as destrezas das crianças como se fossem fenónemos de circo. Por isso, quando há algumas décadas atrás surgiu em França uma menina chamada Minou Drouet, celebrada como um prodígio porque escrevia poemas, Jean Cocteau comentou: «Todas as crianças são poetas… menos Minou Drouet…» (...)
Será então melhor que as crianças, por mais criativas que as consideremos, recebam a preparação adequada (...). E se alguma «criatividade» se perde no processso, é certo que se obterão como compensação resultados socialmente mais aceitáveis e uma configuração pessoal menos caprichosa e portanto mais estimulante. Será necessário recordar que não é possível nenhum processo educativo sem alguma disciplina? (…). A própria etimologia da palavra na língua latina (composto por discis, ensinar e da palavra que nomeia as crianças, pueripuella) vincula directamente a disciplina ao ensino. Esta exigência obriga o neófito a manter-se atento ao saber que lhe é proposto e a cumprir os exercícios que a aprendizagem requerer. O termo serviu também para denominar as diversas destrezas e conhecimentos que se aprendem por este processo, as matemáticas ou a geografia são disciplinas cuja aprendizagem exige, por sua vez, disciplina.”
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