sábado, outubro 02, 2010

Normalizando o crime do século

Tentei contactar outro dia Mark Higson, só para saber que tinha morrido há nove anos atrás. Tinha apenas 40 anos, um homem honrado. Encontrámo-nos pouco depois de ele se ter demitido do Foreign Office, em 1991, e eu perguntei-lhe se o governo sabia que caças-bombardeiros Hawk vendidos à Indonésia estavam a ser utilizados contra civis em Timor-Leste.

«Toda a gente sabe», disse ele, «excepto o parlamento e o público».

«E os media?»

«Os media – os grandes nomes – foram convidados à King Charles Street (o Foreign Office), bajulados e informados com mentiras. Eles não constituem problema».

Como responsável pelo Iraque no Foreign Office, ele tinha minutado cartas para ministros a reafirmar a deputados e ao público que o Governo Britânico não estava a armar Saddam Hussein. «Isto era uma rotunda mentira», disse ele. «Eu não podia aguentar isso».

Ao testemunhar no inquérito armas-para-o-Iraque, Higson foi o único responsável britânico elogiado pelo Lord Justice Scott por contar a verdade. O preço que pagou foi a perda da sua saúde, do casamento e a vigilância constante por espiões. Acabou por viver de ajudas numa pensão em Birmingham onde sofreu um ataque, bateu com a cabeça e morreu sozinho. Os denunciantes são muitas vezes heróis; ele foi um deles.

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