quarta-feira, novembro 23, 2005

O BANCO DO POVO OU UMA RESPOSTA SOLIDÁRIA

Tudo começou quando, terminado o doutoramento nos Estados Unidos, Yunus professor de Economia regressou ao Bangladesh, em 1972, após terminada a guerra que levou à independência face ao Paquistão. Em 1974, grande parte do povo morria de fome, que deve ser uma das formas mais cruel de morrer. Com muita vontade de fazer alguma coisa pelo seu povo, este professor após ter feito o retrato da máxima pobreza que ainda hoje subsiste no seu país, pas­sou a explicar como surgiu a ideia de criar uma instituição financeira que apenas concede crédito a quem se encontra abaixo dos limites mínimos da pobreza.
Confrontado com um contexto de miséria extrema e generalizada, este doutor depressa se deu conta que a sua ampla bagagem teórica e académica jamais poderia dar resposta ao problema. E o problema, era o de milhões de pessoas sem quaisquer hipóteses de, independentemente da sua vontade e esforço, obterem os meios para ultrapassar uma pobreza endémica, apenas porque ninguém empresta dinheiro a quem não o tem, como é óbvio. Um problema agravado pela intensa activida­de dos agiotas que, a troco de pequenos empréstimos, empurram as pessoas para uma vida de total dependência mesmo de escravatura.
Quando voltou para leccionar na Universidade local situada bem no coração dessa miséria, viu-se forçado a todos os dias fazer um pequeno gesto para apaziguar a consciência. E o primeiro grande gesto foi procurar identificar as pessoas que, na aldeia contígua ao campus universitário, se encontravam reféns de dívidas.
Num primeiro levantamento, Yunus identificou 42 devedores. Somou os empréstimos contraídos e chegou a um total de 27 dólares. Decidiu emprestar-lhes dinheiro do seu bolso, sem condições ou prazos. Para sua surpresa, foi todo devolvido.
Pensou que acabava ali, mas a felicidade estampada naquelas caras passou a persegui-lo como uma assombração, segundo palavras suas.
O passo seguinte pareceu-lhe óbvio. Dirigiu-se ao gerente do banco e tentou persuadi-lo a conceder pequenos empréstimos às pessoas da aldeia. A resposta, como facilmente se adivinha, foi a de que não se empresta dinheiro a quem não tem garantias para o devolver.
Após três meses de insistentes tentativas, Yunus decidiu oferecer-se como garantia para todos aqueles créditos. Estabeleceram-lhe um tecto máximo de 300 dólares. Contraiu a divida, distribuiu o dinheiro, recolheu os pagamentos e devolveu ao banco.
Com a ajuda dos seus alunos, repetiu o processo, uma e outra vez, sem que por uma só o dinheiro não regressas­se à procedência. Mas provar que o crédito pode ser concedido sem quaisquer garantias que não a confiança mútua mostrou-se insuficiente para levar a banca a assumir o compromisso. O princípio está subvertido, podemos dizer: A partir da palavra crédito, que significa confiança, construiu-se um sistema baseado na desconfiança.
Eis o texto que podemos encontrar no site http://www.grameen-info.org/agrameen/profile.php3?profile=1

As founder of the Grameen Movement, Professor Muhammad Yunus is a revolutionary. His ideas couple capitalism with social responsibility and have changed the face of rural economic and social development forever. Professor Yunus is responsible for many innovative programs benefiting the rural poor. In 1974, he pioneered the idea of Gram Sarker (village government) as a form of local government based on the participation of rural people. This concept proved successful and was adopted by the Bangladeshi government in 1980. In 1978, he received the President's award for Tebhaga Khamar (a system of cooperative three-share farming, which the Bangladeshi government adopted as the Packaged Input Program in 1977).
A Fulbright Scholar at Vanderbilt University, Professor Yunus received his Ph.D. in Economics in 1969. Later that year, he became an assistant professor of Economics at Middle Tennessee State University, before returning to Bangladesh where he joined the Economics Department at Chittagong University. The UN secretary general appointed Professor Yunus to the International Advisory Group for the Fourth World Conference on Women in Beijing from 1993 to 1995. Professor Yunus has also served on the Global Commission of Women's Health (1993-1995), the Advisory Council for Sustainable Economic Development (1993-present), and the UN Expert Group on Women and Finance. He also serves as the chair of the Policy Advisory Group (PAG) of Consultative Group to Assist the Poorest (CGAP). Yunus has also served on many committees and commissions dealing with education, population, health, disaster prevention, banking, and development programs. He is currently on the boards of many international organizations including Amanah Ikhtiar Malaysia (a Grameen replication project), the International Rice Research Institute in the Philippines, and Credit and Savings for the Poor in Malayasia. Professor Yunus also sits on the board of the Calvert World Values Fund, the Foundation for International Community Assistance, the National Council for Freedom From Hunger, RESULTS and the International Council of Ashoka Foundation, all of which are located in the US. Professor Yunus has received the following International awards: the Ramon Magsaysay Award (1984) from Manila; the Aga Khan Award for Architecture (1989) from Geneva; the Mohamed Shabdeen Award for Science (1993) from Sri Lanka; and the World Food Prize by World Food Prize Foundation (1994) from the US. Within Bangladesh, he has received the President's Award (1978), Central Bank Award (1985), and the Independence Day Award (1987), the nation's highest award.



Em 1976, Yunus empreendeu o passo decisivo e constituiu o Grameen Bank, instituição exclusivamente dedicada à concessão de microcrédito e detida por inteiro pelos seus clientes. Quando lhe pedem que des­creva o modelo de financiamento, diz apenas que estudou os procedimentos dos bancos tradicionais e fez tudo ao contrário. Contas feitas, o Grameen tem hoje emprestados quase 4 mil milhões de euros, abran­gendo 2,4 milhões de famílias. Os empréstimos destinam-se à promoção de uma miríade de micro empresas em vários sectores. Além do impressionante peso dos números, a grande conquista de Yunus é, dentro do sistema e contra a sua lógica, demonstrar que o crédito é a mais eficaz das armas na luta contra a pobreza e que a simples confiança pode ser sua garantia.
Impõe-se neste momento uma reflexão: se este professor de economia conseguiu o que ficou atrás descrito dentro do sistema e contra toda a sua lógica isto prova duas coisas em simultâneo: Primeiro o capitalismo não é a solução para os problemas que a maior parte da humanidade se debate desde o século XIX. Segundo, há outras soluções, algumas das quais bem melhores como o exemplo acima apresentado.
Para concluir: Nada do que foi falado é original. A resposta solidária do Professor Muhammad Yunus é devedora de Proudhon e muito especificamente daquilo que em 1848-1849 ele chamava de Banco do Povo. Alfred Darimon amigo pessoal de Proudhon e seu secretário durante uma parte da sua vida escreveu De la réforme des banques em 1856 onde no capítulo la Banque du Peu­ple se pode ler o seguinte: « La gratuité du crédit est devenue chose si ordinaire, qu'après avoir servi d'étendard aux radicaux elle commence à être un moyen pour les conservateurs de se rendre populaires. » Por sua vez Emile de Girardin que escreveu a introdução dessa mesma obra diz o seguinte: « Puisqu'il y a unanimité sur ce point que, seul, le travail est la source de toute richesse, pourquoi donc le travail, dans ses rapports avec les Banques, compte-t-il pour presque rien, quand il devrait compter pour presque tout ; et pourquoi le numéraire compte-t-il pour presque tout, quand il devrait compter pour presque rien ? Est-ce équitable ? Est-ce profitable ? »
O Banco do Povo de Proudhon prende-se com as suas propostas de gratuitidade do crédito. Mas isso é uma outra história para um outro dia.

Sem comentários: