terça-feira, janeiro 02, 2007

“Comemorações”

Gérard Molina (Paris) contesta, no artigo intitulado Comemorações... (Le Monde diplomatique, Março de 2005), a formulação segundo a qual a Alemanha teria sido “esquecida” em matéria de colónias.

A Alemanha chegou tarde à colonização, mas, após a conferência de Berlim (1884-1885), estabeleceu rapidamente a sua esfera de influência sobre quatro vastos territórios de África (Togo, Camarões, Sudoeste africano e África oriental alemã), o que a tornou a terceira potência neste continente. Foi o tratado Versailles (1919) que a julgou “indigna de colonizar” e lhe retirou todos os territórios. Não se trata aqui de erudição, pois a África serviu de laboratório às políticas de segregação, de espaço vital e de exterminação.

No início do século XX, as colónias alemãs eram as únicas em África a proibir os casamentos entre brancos e pretos, incluindo os mestiços cristãos. Foi na sua colónia do Sudoeste africano (a actual Namíbia) que a Alemanha realizou em 1904-1905 um genocídio contra as tribos hereros, que se rebelavam regularmente. Após o assassinato de mais de três quartos dos 70.000 hereros, os 16.000 sobreviventes só conseguiram a salvação no exílio para outras regiões. Quando foi conhecida na metrópole a ordem de exterminar os hererós, a comoção da opinião pública obrigou o governo de Berlim a desdizê-la, mas era demasiado tarde. Uma mesma política etnocidária foi desencadeada contra os namas, descendentes dos khoikhoi ou “hottentot”.

(...) Sublinhar estes factos não deve levar a relativizar a singularidade da Shoah, mas mostra que esta não emerge como um acontecimento incompreensível face ao qual qualquer ensaio de explicação seria a priori impossível, ou mesmo obsceno. Hannah Arendt, muito ao corrente da história alemão moderna, reconheceu explicitamente esta relação: «Os primeiros a compreender a influência decisiva da experiência sul­‑africana foram os líderes da multidão que, como Carl Peters, decidiram que deviam eles também fazer parte de uma raça de senhores. As possessões coloniais africanas ofereciam o solo mais fértil para o desabrochamento do que se tornaria a elite nazi.»
Le Monde diplomatique
http://www.infoalternativa.org/memoria/memoria007.htm

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