As migrações humanas são resultado de necessidades básicas de alimento e abrigo, de fuga à miséria, à subvida, à guerra, às perseguições. Nunca haverá meios repressivos suficientes para deter estes grandes movimentos sociais. Como nos diz Timóteo Macedo, da Solidariedade Imigrante, as autoridades do Estado «insistem no problema das quotas, o que para nós é uma política completamente incorrecta. Porque nós sabemos que é impossível regular os fluxos migratórios.»
Quem precisa de emigrar decide em função do mercado do trabalho. Segundo a experiência de Timóteo Macedo, «as pessoas, sabendo que há trabalho, emigram. Não emigram com o espírito… aqui está-se bem, agora vou para outro país. Não tem nada a ver com isso. O trabalho é um factor decisivo para a pessoa que emigra.»
O PATRONATO QUER IMIGRANTES EM CONDIÇÕES PRECÁRIAS
Os imigrantes são uma oferta de braços que se vai equilibrando com a procura de mão-de-obra, como em qualquer mercado. Existe imigração – legal ou ilegal – porque os patrões precisam de mão-de-obra imigrante. É significativo que não se oiçam as organizações patronais falar mal da imigração. E, além de precisarem deles, precisam de os ter indocumentados e fragilizados, para os poderem ter a baixos preços e em condições de trabalho ilegais, precárias e degradadas.
Para José Falcão, do SOS Racismo, «O imigrante serve para tudo: serve para estar aqui sem direitos e ser explorado. Muitas vezes, nos primeiros meses, nem se lhes paga salários, dá-se-lhes 20 euros, 50, para poderem continuar alimentados. Os escravos pelo menos eram alimentados; agora são eles que têm de pagar. Trabalham e quando finalmente conseguem contrato ficam abaixo do salário dos autóctones.»
Um dos exemplos é o da agro-indústria de frutas e legumes da Andaluzia, que assim se tornou nos últimos anos a zona mais rica da Espanha: muitos milhares de trabalhadores (africanos e sul-americanos) escravizados, perseguidos e discriminados, a viverem em contentores e barracas ao lado das estufas onde trabalham, quase sem descanso, por poucos euros. O número dos expulsos ou rechaçados nas fronteiras é uma pequeníssima parte dos que entram; esses casos não impedem a imigração, apenas servem de “exemplo” para manter os imigrantes inseguros e assustados.
UNIDADE DE TODOS OS TRABALHADORES, IMIGRANTES INCLUÍDOS
Tem sido essa a verdadeira “política de imigração” dos governos portugueses. E o que os Estados e os patrões fazem com os imigrantes é apenas uma antevisão ou um laboratório do que querem vir a fazer com todos os trabalhadores. Mão-de-obra barata, insegura, dispersa e sem direitos.
Os trabalhadores portugueses têm uma longa e dura experiência de imigração noutros países. As políticas dos sucessivos governos têm levado milhões de portugueses a procurarem trabalho nos países mais ricos. Agora mesmo, é essa a experiência dos 80 mil portugueses que trabalham nas obras em Espanha, dos pescadores que vão para França, dos que vão fazer limpezas em Inglaterra ou na Alemanha. O desemprego português (e a consequente emigração) é uma chantagem do patronato sobre o preço da mão-de-obra em Portugal, uma arma dos patrões para baixar a cabeça e meter medo aos que ainda têm trabalho. Sempre foi assim; é um jogo de forças indispensável ao capitalismo. A única força dos trabalhadores é a sua unidade reivindicativa nas empresas, nos sectores económicos e na produção em geral.
Unidade que tem de ser estendida aos imigrantes, exigindo que todos tenham os mesmos direitos. A existência de imigrantes sem direitos, os limites policiais e administrativos à livre circulação dos trabalhadores entre os países, dos quais resultam a imigração ilegal e as máfias que a exploram, são maneiras de fragilizar a força de trabalho local, porque através dos imigrantes ilegais o patronato pressiona a baixa dos salários dos restantes trabalhadores. Para que isto não suceda há que exigir a legalização dos imigrantes e os seus plenos direitos laborais.
DUAS IDEIAS FUNDAMENTAIS
Primeira – Os fluxos migratórios definem-se, no essencial, em função do mercado do trabalho e são fenómenos sociais incontroláveis por via administrativa ou policial. A perseguição ou escravização dos imigrantes, além de criar uma rede de máfias que gerem esses fluxos conforme as necessidades do patronato, serve para assegurar às empresas uma mão-de-obra barata e sem direitos.
Segunda – O tratamento dado pelo Estado e pelos patrões aos imigrantes destina-se a precarizar os trabalhadores locais, fazendo-os aceitar perdas de direitos e baixos salários. O interesse dos trabalhadores portugueses é unirem-se aos trabalhadores imigrantes que os patrões sobre exploram, exigindo que todos sejam cidadãos com direitos iguais.
José Mário Branco
http://www.infoalternativa.org/mundo/mundo271.htm
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